A toga se declarou hoje “perplexa, chocada” com a decisão da presidente Dilma Rousseff (PT) de não negociar com a categoria, que reivindica reajuste de 14,79% a título de reposição de perdas inflacionárias.
“O governo não pode tratar sua relação com outro Poder, que é independente, como se estivesse negociando com sindicato de motorista de ônibus”, declarou o presidente da Associação dos Juízes Federais, Gabriel Wedy. Para Wedy, “o governo precisa evidentemente fazer essa distinção, não pode desconhecer o poder político dos juízes”.
A declaração do presidente da Ajufe foi recebida com indignação pela categoria dos motoristas. O coordenador do Departamento de Comunicação do Sindicato dos Motoristas de Ônibus de São Paulo, Nailton Francisco de Souza, classificou a afirmação de Wedy de “desrespeitosa e infeliz” e disse que pretende mover ação contra o magistrado. “Vamos unir todos os trabalhadores de transporte do Brasil para mover uma ação contra este cidadão”, afirmou. “No mínimo, é preconceito. Quem é esse juiz para achar que, só porque vive em uma casta, é superior aos outros trabalhadores?”
Argumentos
No mandado de injunção no Supremo Tribunal Federal subscrito pela Ajufe, os magistrados pleiteiam a reposição com o argumento de que a omissão do Congresso lhes subtrai direito constitucional de irredutibilidade de vencimentos.
Em agosto de 2010, o STF enviou projeto de lei ao Legislativo reivindicando os quase 15%, mas não houve resposta até agora dos parlamentares. A pretensão dos magistrados esbarra na disposição do Palácio do Planalto de promover um ajuste nas contas públicas após o corte de R$ 50 bilhões do Orçamento. O governo avisa que não vai se curvar a pressões.
“Ficamos impressionados com essa reação do governo em início de gestão dizendo que vai ficar mais um ano descumprindo a Constituição”, afirma Wedy. “O governo foi muito inábil, com uma declaração duríssima, desconhecendo o poder político do magistrado.” Para ele, “o governo precisa ter a dimensão que está negociando com outro Poder de Estado, que é o STF.”
“Causa espanto o governo nos comparar a outras categorias”, insiste. “Falta tato político ao governo. É importante que a presidente Dilma realize uma interlocução de forma mais qualificada com o STF e com a magistratura do País. Não se está discutindo aumento de salário, mas a funcionalidade do teto constitucional.”
Os magistrados elegeram o ministro Nelson Jobim (Defesa) para o papel de negociador e vão pedir a ele que aceite a missão. Na próxima semana vão solicitar reunião com Jobim, a quem consideram qualificado para levar ao governo os argumentos e as razões da classe.
Jobim foi ministro da Justiça e presidente do STF. “Ele criou o teto constitucional, quando presidiu o Supremo”, destaca Wedy. O vice presidente Michel Temer também poderá ser assediado. “Temer pode auxiliar o governo para a elevação do nível do debate como constitucionalista que é, tornando-o mais técnico, qualificado e menos emotivo.”