“O Magistrado não pode se trancar em seu gabinete e ignorar a indignação popular”, foi com este entendimento que a juíza Regina Coeli Formisano, da 6ª Vara Federal no Rio de Janeiro determinou liminarmente a suspensão da nomeação de Moreira Franco, citado nas delações premiadas da Odebrecht como sendo o ‘Angorá’, para o cargo de Secretário-Geral da Presidência. A magistrada fez referência, em sua decisão, às citações de Moreira na delação da empreiteira e também pediu “perdão” ao presidente Michel Temer “por ser fiel aos seus ensinamentos” sobre Direito Constitucional.
“Não se afigura coerente, que suas promessas (de Temer) ao assumir o mais alto posto da República sejam traídas, exatamente por quem as lançou no rol de esperança dos brasileiros, que hoje encontram-se indignados e perplexos ao ver o seu Presidente, adotar a mesma postura da ex-Presidente impedida e
que pretendia também, blindar o ex-presidente Luiz Ignácio Lula da Silva”, assinalou a magistrada.
A decisão da juíza traz uma nova dor de cabeça ao governo Temer, que havia conseguido derrubar nesta manhã no Tribunal Regional Federal da 1ª Região uma liminar semelhante concedida ontem pela Justiça Federal do Distrito Federal. O presidente do TRF1, desembargador Hilton Queiroz, que manteve a nomeação de Moreira, apontou que a decisão da primeira instância interfere ‘de maneira absolutamente sensível na separação de poderes, usurpando competência legitimamente concedida ao Poder Executivo’.
Moreira Franco não está no palácio e não acompanhou o presidente Michel Temer em seminário da Caixa Econômica Federal na manhã de hoje. A AGU vai entrar com novo recurso. Há dois caminhos sendo pensados pelo governo: pedir ao Supremo Tribunal Federal para suspender todas as ações ou ir derrubando uma por uma. No caso de entrar no STF, a ideia é que uma decisão favorável ao governo, vinda da Suprema Corte, prevaleça sobre as demais. Uma equipe jurídica do Planalto e a AGU estão discutindo qual caminho a ser seguido.
‘Foro privilegiado’. Como a Justiça Federal no Rio está submetida ao Tribunal Regional Federal da 2ª Região, na prática a mais recente decisão da juíza Regina impede que Moreira assuma o cargo. Sua decisão acatou uma ação popular, semelhante a outras movidas em todo o País, de autoria de José Agripino da Silva Oliveira. Na decisão a magistrada não apenas levou em conta a repercussão das citações ao peemedebista nas delações da Lava Jato, como ainda o fato de o ministério ter sido recriado pelo presidente Michel Temer (PMDB). Para ela, “tudo leva a crer” que a recriação da pasta buscou dar foro privilegiado a Moreira Franco (PMDB).
“Referida recriação de ministério já extinto, em cumprimento a promessas de redução da estrutura estatal, ter-se dado de forma açodada e através de Medida Provisória, que tem por pré-requisito exige providencias urgentes e inadiáveis. Não se afigura tal situação no caso em tela, justificando o manejo do instrumento emergencial, a não ser a possibilidade de conferir foro privilegiado ao Senhor Moreira Franco, conforme amplamente divulgado na mídia nacional”, assinala Regina.
O governo acredita que conseguirá derrubar as liminares. No caso da primeira, de Brasília, embora o governo já esperasse pela derrubada da liminar que tirou o Moreira do cargo de ministro, o fato de a decisão ter saído logo de manhã foi recebida com alívio pelo Palácio do Planalto. Mas, agora, a “aflição” aumentou de novo e todos estão “correndo contra o tempo”.
Hoje pela manhã, Moreira Franco não esteve em seu gabinete no anexo do Planalto, nem participou do seminário promovido pela Caixa Econômica Federal, onde o presidente Michel Temer e o ministro da Casa Civil, Eliseu Padilha, discursaram, e Moreira era esperado. De acordo com a Caixa, a previsão era de que Moreira comparecesse lá à tarde, mas com a nova liminar, certamente isso não ocorrerá mais.
Com a liminar em vigor, Moreira não pode trabalhar no Planalto, embora possa circular nas dependências do prédio. Mas ele não foi visto nesta manhã no local. Havia uma preocupação porque Moreira ficou até perto das 22 horas no seu gabinete no anexo e o senador Romero Jucá (PMDB), ao sair de uma audiência com ele, disse que ele estava trabalhando normalmente e poderia parecer afronta à Justiça, embora houvesse explicações de que ele não tinha sido notificado pela Justiça, naquele momento.
Como ministro, Moreira pretende se mudar para o prédio principal do Planalto, possivelmente no terceiro andar, o mesmo andar do presidente Michel Temer.
Pelo menos outras quatro ações, em diferentes instâncias judiciais e Estados, estão aguardando posicionamento e a situação pode sofrer novo revés. O ministro da Casa Civil, Eliseu Padilha, questionado sobre se uma eventual “guerra de liminares” não poderia trazer instabilidade e atrapalhar o governo, rebateu: “Vai derrubando as liminares”.
Além destas ações, há dois mandados de segurança perante o Supremo Tribunal Federal, instância máxima do Judiciário, pedindo a suspensão da nomeação de Moreira Franco e comparando o caso com o do ex-presidente Lula, que teve a nomeação para a Casa Civil do governo Dilma vetada em 2015 por uma decisão do ministro Gilmar Mendes, do STF. Os processos que questionam o caso de Moreira estão sob a relatoria do decano da Corte, ministro Celso de Mello.
‘Angorá’. O ex-executivo da Odebrecht Claudio Melo Filho afirma em seu a anexo de delação premiada com a força-tarefa da Operação Lava Jato que tratou com Moreira Franco, de negócios da empreiteira na área de aeroportos.
Elo entre a empresa e políticos em Brasília, o delator relata pedidos da empreiteira e pressão por parte do peemedebista, que é homem de confiança do presidente, Michel Temer, e foi ministro da Secretaria de Aviação Civil (SAC) no governo Dilma Rousseff (PT).
Segundo o delator, Moreira Franco era identificado nas planilhas da propina com o codinome “Angorá”. O ministro teria solicitado a ele “um apoio de contribuição financeira, mas transferiu a responsabilidade pelo recebimento do apoio financeiro para Eliseu Padilha”. Quando vieram à tona os depoimentos de Cláudio Melo Filho, o peemedebista divulgou uma nota classificando as acusações de “mentira”.