Após uma campanha eletrizante no Rio Grande do Sul, com direito a reviravoltas, o ex-prefeito de Caxias do Sul José Ivo Sartori (PMDB), a grande surpresa da eleição gaúcha, e o governador Tarso Genro (PT) garantiram o passaporte ao segundo turno da eleição para o Palácio Piratini, no dia 26 de outubro.
Com 98,51% dos votos apurados, Sartori tem 40,48% dos válidos, à frente do atual governador, com 32,49%. A senadora Ana Amélia Lemos (PP), que era favorita até a metade de setembro, tem 21,79%.
O resultado deste domingo (5) mantém a chance de que os gaúchos quebrem uma tradição bem peculiar, de nunca terem reelegido um governador.
Ana Amélia despontou na liderança nas pesquisas mesmo antes do início oficial da campanha. Durante semanas, os levantamentos mostravam uma vantagem de quase 10 pontos porcentuais sobre Tarso, e uma diferença ainda maior dele para Sartori – que começou a disputa com cerca de 5% da preferência do eleitorado.
Conhecida dos gaúchos por sua carreira como jornalista de TV, Ana Amélia construiu uma candidatura sólida, baseada na promessa de melhorar a gestão dos gastos públicos. A senadora insistiu no discurso de que a máquina pública estadual está inflada e que o atual governo foi incapaz de solucionar a crise financeira do RS – o Estado tem uma dívida de mais de R$ 50 bilhões com a União, o que compromete de maneira considerável sua capacidade de investimento.
Tarso tratou de exaltar as conquistas do seu governo e apontar uma falta de experiência da adversária em cargos executivos. Mas o rumo da disputa começou a mudar de forma significativa quando Ana Amélia passou a ser atingida por denúncias de ter sido funcionária fantasma do Senado e de não ter declarado em sua relação de bens uma fazenda herdada do falecido marido, o ex-senador biônico Octávio Omar Cardoso.
A campanha petista explorou as acusações e conseguiu desestabilizar a candidatura da rival. A partir daí, Ana Amélia caiu nas pesquisas. Neste momento, Sartori já estava subindo gradativamente, enquanto os dois primeiros colocados se concentravam em sua disputa particular. Sartori se posicionou como um candidato simples e acessível, um “gringo” do interior, mais preocupado em apresentar propostas do que em confrontar os adversários.
A estratégia funcionou, e ele foi angariando votos tanto dos eleitores indecisos como dos simpatizantes de Ana Amélia. Em pouco tempo, Sartori deixou de ser um coadjuvante para se tornar um candidato competitivo.
A campanha de Sartori acertou também ao “usar” o aliado PSB de maneira adequada. Quando Marina Silva substituiu Eduardo Campos como candidata à Presidência e disparou nas pesquisas, os programas no rádio e na TV relacionaram a imagem de Sartori com a de Marina à exaustão. Serviu para que ele ficasse mais conhecido entre o eleitorado gaúcho. Depois, quando a ex-senadora perdeu força, os programas passaram a ter cada vez mais Sartori e menos Marina.
O PMDB mobilizou a base do partido em todo o Estado para trabalhar por Sartori na reta final. O senador Pedro Simon, candidato à reeleição (mas sem chances de vencer), acompanhou praticamente todas as agendas de Sartori e passou a fazer mais campanha para o colega do que para ele mesmo.
Formação
Nascido no município gaúcho de Farroupilha em 1948, Sartori é formado em Filosofia e deu início à carreira política em 1976, como vereador de Caxias do Sul. Nos anos seguintes, foi deputado estadual por cinco mandatos consecutivos e, depois, deputado federal. Chegou à Prefeitura de Caxias do Sul em 2004 e foi reeleito para o cargo em 2008. A coligação O Novo Caminho para o Rio Grande, de Sartori, engloba o PMDB, PSD, PPS, PSB, PHS, PT do B, PSL e PSDC.
Tarso é natural de São Borja e formado em Direito. Iniciou sua trajetória política no extinto MDB (Movimento Democrático Brasileiro) e, em 1988, já no PT, foi vice-prefeito de Porto Alegre. Em 1992 tornou-se prefeito, cargo que voltou a ocupar em 2000. Em 2002, tentou pela segunda vez ser eleito governador, mas perdeu para Germano Rigotto (PMDB). Durante os dois mandatos do presidente Lula, Tarso exerceu em Brasília os cargos de Secretário Especial do Conselho de Desenvolvimento Econômico e Social e Ministro da Educação, das Relações Institucionais e da Justiça. Em 2010, foi escolhido governador do RS no primeiro turno, com 3,416 milhões de votos válidos. A coligação Unidade Popular pelo Rio Grande, de Tarso, reúne o PT, PTB, PC do B, PROS, PPL, PTC e PR.
Embate desconhecido
Como a polarização entre Tarso e Ana Amélia monopolizou boa parte da campanha, inclusive nos debates, não se sabe muito bem o que esperar de um confronto direto – e decisivo – entre Tarso e Sartori. É preciso saber se o petista repetirá a tática do ataque, bem-sucedida com Ana Amélia, e se o peemedebista conseguirá manter a postura mais neutra e pacífica que caracterizou sua participação no primeiro turno.
O problema do endividamento público gaúcho pode continuar no centro das discussões, e ambos os candidatos devem aproveitar as próximas três semanas para convencer os eleitores de que têm condições de desafogar os cofres gaúchos e garantir recursos para investir no RS. Além disso, Tarso tratará de capitalizar o bom desempenho da presidente Dilma Rousseff (PT) no Estado e reforçar a importância do “alinhamento das estrelas”.
Vale lembrar que, no âmbito nacional, tanto o PP de Ana Amélia como o PMDB de Sartori estão coligados com o PT. No Rio Grande do Sul, contudo, os dois partidos costumam fazer oposição aos petistas.
De qualquer forma, sabe-se que o PT preferia um segundo turno com Ana Amélia, pois existe a percepção de que os eleitores de Sartori poderiam votar em Tarso, mas os simpatizantes da senadora são ainda mais alinhados com a direita e, na maior parte dos casos, antipetistas. Em muitas pesquisas de intenção de votos, inclusive, Sartori aparece à frente de Tarso nas simulações de segundo turno.