Os bastidores do Supremo Tribunal Federal, os embates entre os ministros e as indicações políticas que os conduziram ao cargo estão entre os temas da 2.ª fase do projeto História Oral do STF, que reúne, em cinco livros, entrevistas dos ex-ministros Nelson Jobim, Célio Borja, Eros Grau, Néri da Silveira e Carlos Velloso. O material, lançado na sexta-feira, 13, é uma parceria entre a Faculdade de Direito da Fundação Getúlio Vargas e o Centro de Pesquisa e Documentação de História Contemporânea do Brasil.

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A ideia é contar a história do tribunal a partir do ponto de vista dos ministros nos 25 anos da Nova República (1988-2013). Em entrevista ao Estadão, o idealizador do História Oral, Joaquim Falcão, diretor da FGV Direito-Rio, analisa as mudanças pelas quais o tribunal vem passando e a exposição dos ministros com a TV Justiça.

O STF está em evidência, as pessoas reconhecem ministros nas ruas. A que atribui a mudança?

A pauta do Supremo está se aproximando da pauta do povo. O Supremo passou a discutir questões concretas: corrupção, união homoafetiva, liberação da maconha. Outro motivo é, sem dúvida, a TV Justiça. Que foi uma decisão isolada do ministro Marco Aurélio e até hoje não é algo pacífico. Carlos Velloso diz que ela tira a “aura de respeitabilidade da Justiça”.

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E qual a sua posição sobre a TV Justiça?

É irreversível. Na Inglaterra, eles não somente transmitem por internet, como mandam o vídeo da sessão, se você paga. Você vê o juiz votando. Nos Estados Unidos, ministros começam a dar votos cada vez mais compreensíveis pela população. Essa interação entre Supremo e opinião pública veio para ficar. A primeira vez que isso foi feito foi pelo ministro Sidney Sanches, no julgamento do (impeachment de Fernando) Collor. Ele mandou televisionar porque diziam que iam cercar o Supremo. A democracia exige participação. Participação exige conhecimento. É isso o que está ocorrendo: o conhecimento mais sedimentado do Supremo.

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O senhor citou a questão do porte da maconha, a aprovação do casamento gay. E isso ocorre no momento em que o Congresso tem uma pauta conservadora. Como analisa essa questão?

No depoimento do ministro (Octávio) Galotti, ele se refere a um político que diz: “O meu partido, de três ou quatro deputados, tem mais acesso ao Supremo do que ao Congresso”. O Supremo passou a ser uma instância onde o acesso do político individual ou do partido é muito mais amplo. A Constituição diz que os Poderes são independentes e harmônicos entre si. Eu prefiro dizer que os Poderes são tensos e interindependentes – eu sou independente, mas você também é. A tensão é o processo natural da democracia. Quando tiver harmonia completa, a gente saiu da democracia.

O que há em comum entre os ministros?

Todos têm indicação política. A grande maioria dos ministros teve alguma atuação política na juventude ou na vida profissional. Todos tiveram canais de acesso ao presidente ou a quem o presidente ouvia.

Isso contaminou o STF?

Não creio. Não existem dados de pesquisa que diga que um ministro vota de acordo com o que o presidente que o indicou. Não existe essa relação de causalidade. A minha tese é que quanto mais tempo um ministro está no Supremo mais independente ele fica. Nos Estados Unidos, o Supremo é dividido entre republicanos e democratas, liberais e conservadores. A riqueza do Supremo no Brasil é que você não tem essa dicotomia. Essa pluralidade dá a riqueza do Supremo nosso, mas o torna muito imprevisível.

Qual a sua opinião sobre a Lei Orgânica da Magistratura (Loman), que vem sendo criticada?

A Loman está entre as leis mais importantes do País. É a lei que vai regular como o País faz justiça. Essa lei terá que ser amplamente discutida pela sociedade. A Loman não pode ser aprovada no Congresso por pressão de ninguém.

As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.