Em pé de guerra com os políticos, índios xavantes conseguiram que o ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, participasse da dança do doente. A performance de Cardozo, que fazia gestos com as mãos no estilo discoteca, aconteceu no final da manhã desta sexta-feira, após uma cerimônia do Dia do Índio, no prédio do Ministério da Justiça, em que lideranças reclamaram da inércia do governo na defesa das aldeias e acusaram a Polícia Federal de matar e desrespeitar índios.

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Assessores do governo divulgaram que o ritual era a “dança dos guerreiros”. O líder Arimatéia Xavante deu uma versão diferente: “Essa é a dança da cura. Quando tem uma pessoa doente na aldeia, a gente bota ela pra dançar. É a dança do doente mesmo”. Em entrevista, o ministro foi questionado se passava por algum problema de saúde ou se o governo estava doente. Cardozo respondeu que tinha recebido a informação que o sentido da dança era outro. “Estamos tratando de todos os males que afligem os povos indígenas. Pelo menos foi esse o sentido da dança que os índios disseram para mim”, afirmou.

As ministras Izabella Teixeira (Meio Ambiente) e Maria do Rosário (Direitos Humanos) evitaram passar pela “dancinha”. Antes, porém, elas não escaparam de ouvir uma série de críticas e cobranças. O cacique Raoni Metuktire, liderança dos txucarramães, reclamou da Polícia Federal e da Força Nacional. “Ministro (Cardozo), tem que falar com a Polícia Federal e com a Força Nacional para não matarem meu pessoal. Isso eu não gosto”, disse Raoni. “Vocês têm que falar para respeitarem nossos parentes.”

Raoni referia-se ao assassinato do índio Adenilson Kirixi Munduruku durante a Operação Eldorado, da Polícia Federal, na aldeia Teles Pires, na divisa do Estados do Pará e de Mato Grosso. A operação foi deflagrada para combater um garimpo ilegal. Os ministros Maria do Rosário e José Eduardo Cardozo responderam que não compactuam com ações de violência contra aldeias. O ministro da Justiça afirmou, sem uma referência direta ao caso de Adenilson, que índios estão sendo usados por organizações criminosas que agem na área da mineração.

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Contra os ruralistas

Cardozo disse que não aceitava a “opinião” de alguns de que os governos de Luiz Inácio Lula da Silva e Dilma Rousseff nunca tiveram compromisso com a causa indígena. Foi uma resposta ao cacique Damião Paridzané, da etnia xavante, que, na solenidade, pediu a manutenção da Fundação Nacional do Índio (Funai) e uma “postura” do governo contra a bancada ruralista no Congresso. “Eu respeito a presidente Dilma, mas ela tem que ter postura contra os ruralistas. Eu não aceito que os ruralistas aprovem o projeto que passa para o Congresso a decisão de demarcar terras indígenas”, disse. “Eu não confio no Congresso, pois os deputados não vão na aldeia saber o que está acontecendo.”

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Durante a solenidade, o ministro disse que o governo defende os índios, não acabará com a Funai e se posicionará contra a Proposta de Emenda Constitucional 215 que transfere do Executivo para o Legislativo a prerrogativa de homologar terras indígenas. Em entrevista, ele admitiu, porém, que o governo estuda “mudanças estruturais” na área. Lideranças indígenas temem que essas mudanças reduzam ainda mais o poder da Funai nas discussões sobre projetos de infraestrutura na Amazônia. Decisões na área seriam tomadas em grupos envolvendo outros setores do governo.