A presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), ministra Cármen Lúcia, destacou nesta sexta-feira, 17, que a Constituição Federal “não prevê direitos em excesso”, ao falar sobre a interferência das decisões judiciais na economia e a grande demanda da sociedade que chega ao judiciário em tempos de crise. A ministra reconheceu que decisões judiciais podem gerar insegurança jurídica, mas ressaltou que “há um enorme esforço” de magistrados para considerar os dados da economia.
“Essa Constituição Federal que completará 30 anos de vigência foi muito criticada exatamente na parte econômica, e com muita ênfase até mesmo por alguns que, sendo mais especializados em economia, consideravam que a Constituição desde o início tornaria o Brasil inviável nas relações econômicas e financeiras”, comentou a ministra, acentuando e repetindo diversas vezes que “não partilha dessa visão”.
Cármen, que deixa a presidência da Corte em setembro, esteve no Seminário ‘Direito e Desenvolvimento’ da Escola de Direito do Rio de Janeiro da Fundação Getulio Vargas (FGV Rio).
O presidente do Tribunal Regional Federal da 2ª Região (TRF-2), André Fontes, o presidente do Tribunal de Justiça do Estado da Bahia, Gesivaldo Britto, e Sergio Guerra, diretor da FGV Rio também estavam presentes na abertura do evento.
“Nosso problema não é ter leis boas ou más, é saber aplicá-las. Não partilho dessa visão de que a Constituição Federal previu direitos em excesso”, afirmou a ministra. A fala se dá num contexto em que o poder judiciário é amplamente criticado pelo governo e especialistas por decisões que afetam diretamente a economia brasileira. Além das determinações judiciais em instâncias inferiores em torno do leilão de distribuidoras da Eletrobras, por exemplo, o ministro Ricardo Lewandowski, do STF, em junho, decidiu individualmente impedir a privatização de estatais sem aval do Congresso, em decisão liminar.
Na palestra, Cármen citou o julgamento sobre terceirização no STF que começou na tarde desta quinta-feira, 16, e que deve ser retomado na próxima quarta-feira, 22. As ações que discutem se é possível que todos os serviços sejam terceirizados, inclusive atividade-fim. A ministra destacou as sustentações orais dos advogados que mencionaram a necessidade de se garantir um ambiente de desenvolvimento econômico para manter a garantir do trabalho e do emprego.
A presidente da Corte comentou ainda sobre as chamadas ‘escolhas trágicas’ de um juiz, decisões que precisam pesar a escassez de recursos com os direitos básicos à dignidade humana. A teoria foi levantada no plenário da Corte ainda esta semana, quando os ministros decidiram que o Ministério Público pode apresentar ação civil pública para buscar que o Estado seja obrigado a fornecer um medicamento a pessoas necessitadas.
“Não tenho dúvida que o município que recebe uma ordem judicial de que deve fornecer um medicamento que às vezes custa um porcentual elevado do que se tem endereçado a toda população”, ponderou Cármen, afirmando que esse tipo de decisão nunca é fácil de ser tomada. “Não é fácil ser juiz nas condições em que não há recurso público para cobrir as demandas da sociedade. Não é fácil ir dormir depois de uma decisão dessa”, observou a ministra.