“Estamos transformando o governo das leis no governo do homem, do ‘cara'”. Com essa crítica indireta ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva, chamado de “o cara” pelo presidente dos Estados Unidos, Barack Obama, o ex-presidente da República Fernando Henrique Cardoso classificou a crise de valores morais e éticos vivida, segundo ele, pelo Brasil atual. A frase foi dita por FHC durante palestra para industriais e empresários cearenses, num hotel de Fortaleza. A plateia aplaudiu.
Antes, para introduzir o assunto, ele narrou um breve diálogo travado com seu barbeiro, o “Jacaré”, num estabelecimento que, segundo ele, é “uma portinhola lá em São Paulo”. De acordo com FCH, Jacaré teria lhe feito o seguinte comentário: “A pessoa que chega lá em cima tem o direito de roubar”. Ao que o ex-presidente diz ter respondido com espanto: “E você diz isso para mim, que cheguei lá? Ou está me chamando de ladrão ou de bobo”. Seria a acumulação desses “pequenos desvios”, segundo FHC, que nos dá o sentimento da impunidade. Depois de cobrar a retomada dos valores elementares, como a decência, finalizou a palestra conclamando: “Basta! Vamos ter que ter um Brasil melhor. E vamos andar juntos”.
Antes, durante entrevista coletiva, o ex-presidente comentou a crise vivida no Senado e a enxurrada de denúncias que pesam contra o presidente da Casa, senador José Sarney (PMDB-AP). Criticou a interferência do presidente Lula na questão. “A essa altura o presidente Lula já refletiu um pouco melhor”, comentou, referindo-se à afirmação do presidente de que o senador Sarney não poderia ser julgado como uma pessoa comum. “Qualquer que venha a ser o resultado, não nos cabe prejulgar, a Comissão de Ética não pode estar sob suspeição”, observou.
Em seguida, disse ser um “estapafúrdio” o fato de 70% dos integrantes da Comissão de Ética do Senado estarem envolvidos com algum tipo de irregularidade. “Indicar para o Conselho de Ética pessoas que elas próprias são suspeitas de desvios éticos é estapafúrdio”, condenou.
FHC também falou sobre as eleições previstas para o ano que vem. Reafirmou que Lula precipitou o processo ao lançar o nome da ministra-chefe da Casa Civil, Dilma Rousseff, como sua candidata e de tê-lo feito “sem ter consultado sequer o partido dele”. Perguntado quando seria conhecido o nome do candidato tucano que vai disputar as eleições presidenciais, disse apenas: “Isso é um processo político. Não tem data”.
E questionado sobre quem estaria melhor preparado para a missão, se o governador de Minas, Aécio Neves, ou o de São Paulo, José Serra, foi ainda mais reticente: “Os dois estão preparados. Ninguém é bom para tudo e ninguém é bom a qualquer momento”. A escolha, segundo ele, será feita tomando por base quem, em determinado momento, poderá unir mais o partido. Com relação a uma eventual candidatura do deputado federal Ciro Gomes (PSB-CE) ao governo paulista, FHC disse achar “estranho” e “esquisito” Ciro abandonar sua base eleitoral. “Por que não o Ceará?”, questionou.