A Polícia Federal suspeita de que o Grupo Gerdau tenha contratado escritórios de advocacia apenas como fachada para dissimular pagamentos a representantes do Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf). A empresa é investigada por, supostamente, ter pago propina para influenciar decisões do órgão – espécie de “tribunal” que avalia recursos de grandes contribuintes contra autuações da Receita Federal.
Em nova fase da Operação Zelotes, os investigadores descobriram que a Gerdau autorizou a subcontratação de escritórios para atuar no Carf, “dissimulando contrato existente com a SGR Consultoria”. A empresa pertence a José Ricardo da Silva, que era conselheiro do órgão e não podia, portanto, atuar em processos que envolvessem interesses de seus clientes privados.
“De fato, foram identificados inúmeros processos administrativos em desfavor de empresas, dentre as quais o Grupo Gerdau, cujas autuações foram posteriormente revertidas ou canceladas em julgamento de recursos que contaram com a participação dos conselheiros investigados, havendo a suspeita de que tenham sido utilizadas outras empresas para ocultar e dissimular transferências de recursos ligados a suposta advocacia administrativa fazendária (patrocinar interesse privado perante a administração pública, valendo-se da condição de agente público)”, escreveu o juiz Vallisney de Souza Oliveira, da 10ª Vara da Justiça Federal em Brasília, ao autorizar a nova etapa da Zelotes.
Na investigação, a PF identificou diversas decisões do Carf favoráveis à Gerdau, em 2012 e 2014. A empresa conseguiu reverter autuações de cerca de R$ 1,5 bilhão. As subcontratações foram observadas em negociações envolvendo ao menos três empresas.
Na decisão, o magistrado destacou haver indícios de que a Gerdau fez desembolsos ilegais. “Existe a possibilidade de que a empresa (Gerdau) tenha efetuado pagamentos com recursos não contabilizados, considerando que a investigação não logrou êxito em identificar os pagamentos às suas contratadas”, escreveu.
A Zelotes detectou mais evidências da participação de mais ex-conselheiros do Carf no suposto esquema, entre eles Valmir Sandri e Valmar Fonseca de Menezes. Ambos já haviam sido exonerados de seus cargos, após seus nomes terem sido citados em etapas anteriores da operação.
Conforme a decisão que embasou as buscas, Valmir teria atuado, por meio de seu escritório de advocacia, em “possíveis irregularidades ligadas aos processos da Gerdau”. Interceptações telefônicas também evidenciaram “possível envolvimento” no “esquema ilícito” de Valmar.
Como revelou o jornal O Estado de S.Paulo em novembro, as investigações da Zelotes mostraram que Valmar foi nomeado por influência do ex-ministro da Fazenda Guido Mantega a pedido de um amigo, o empresário Victor Garcia Sandri, que tinha interesses no Carf. O ex-ministro ainda teria atuado em seguida para que Valmar e José Ricardo fossem alçados à Câmara Superior do órgão.
O juiz da 10ª Vara autorizou a condução coercitiva de 20 pessoas, entre elas o presidente da Gerdau, André Gerdau, e outros executivos ligados ao grupo (Marcos Antônio Biondo, Raul Fernando Schneider e Expedito Luz), fora Valmar, Valmir e outros quatro ex-conselheiros.
A PF também vai colher os depoimentos de José Ricardo da Silva e do lobista Alexandre Paes dos Santos, o APS, nesta quinta-feira, 25. Ambos estão presos desde outubro e respondem a ação penal por suposta “compra” de medidas provisórias no governo federal, caso também investigado na Zelotes.
Houve ainda buscas e apreensões de documentos e mídias em 17 endereços, entre os quais o prédio da Gerdau em Porto Alegre e a casa de seu presidente.
Em nota, a Gerdau destacou que colabora com as investigações e que nunca autorizou ninguém a fazer em seu nome supostas negociações ilegais. A reportagem não conseguiu até o momento contato com os demais citados e suas defesas.