O novo presidente da Comissão de Ética Pública da Presidência da República, Luiz Navarro, alerta para a falta de capacidade de fiscalização do órgão que é o único no Poder Executivo responsável por vigiar a conduta moral de ministros, em ano de eleições.
“Estaria mentindo se dissesse que estamos fiscalizando”, afirmou ao jornal O Estado de S. Paulo em sua primeira entrevista no cargo. Leia abaixo os principais trechos.
Em ano eleitoral, preocupa o uso da máquina federal para beneficiar candidatos que sejam da base governo?
É uma preocupação, mas estaria mentindo se dissesse que estamos fiscalizando. Não temos perna para vigiar o que está acontecendo no Amazonas, no Rio Grande do Sul, com uma equipe de 20 pessoas. O Ministério Público Eleitoral tem mais prerrogativa e condição de fazer. Já houve no passado e é bem provável que denúncias surjam, mas temos que tomar cuidado, porque nem sempre a denúncia é verdadeira e nem sempre bem-intencionada. Muitas vezes, quer se utilizar a denúncia com objetivos eleitorais. É o jogo político. A mera notícia, só de o parlamentar subir à tribuna e dizer acionei a Comissão de Ética porque isso está errado já tem um valor político.
Ao tomar posse, o senhor disse que a comissão não pode ser palco de disputa política. Ela
vinha sendo?
Infelizmente, nos últimos anos, em função da Lava Jato e desde uns seis meses antes do impeachment da (presidente) Dilma (Rousseff), a comissão passou a receber bem mais denúncias do que antes, por causa do acirramento da disputa política, do extremo antagonismo entre esquerda e centro-direita que estamos vivendo. As pessoas estão com muito ódio. Se um parlamentar entra com representação, não podemos deixar de fazer nosso trabalho. A comissão tem que ser serena, decidir sem estardalhaço, de acordo com suas regras. Mas não posso escandalizar aquilo, me precipitar, justamente para não entrar no jogo eleitoral.
Ministros e autoridades têm que publicar como se deslocaram e quem custeou a participação em eventos eleitorais e partidários. Como fiscalizar?
Tem que divulgar. É devido, sim, dizer quem bancou a participação. E o Tribunal Superior Eleitoral também fiscaliza. Nesse caso o risco de omissão é bem menor, porque normalmente ninguém faz campanha secreta, geralmente é uma atividade pública, tem imprensa e hoje todo mundo filma ou grava. O que não pode é usar viagem oficial, paga pelos cofres públicos, para fazer campanha. Agora, se foi para casa. e fora do horário de trabalho vai participar de reunião, não fiscalizamos isso.
Uma nova resolução da comissão permite omitir dados de agenda pública se o assunto for sigiloso. Não é uma brecha para ocultação de compromissos?
Não é o espírito da resolução, mas me vem em mente que poderia ser. Temos que vigiar para que não ocorra. A omissão da agenda deve ser a exceção das exceções. E não significa que não fique um registro, mas só que ele não vai ser público. Em alguns casos, recomendamos que seja informado ao assessor de controle interno do ministério, para que haja um juízo se de fato o assunto é sigiloso. Não tem como não ter uma reserva para área de segurança, assuntos que podem afetar o mercado, a ordem econômica e no relacionamento com a imprensa.
O senhor reclamou na posse de falta de estrutura. O governo negligencia a comissão de ética?
Isso aqui somos nós: quatro salas. Não gostaria de dizer que é este governo, porque esse problema existe desde a criação da comissão. A gente até conseguiu a cessão de alguns servidores públicos da CGU, isso ajudou bastante porque não temos servidores próprios. O orçamento nosso é de R$ 522 mil para as atividades do ano todo, fora pessoal. A gente não precisa de mais dinheiro, mas de pessoal, sim. Uma dificuldade enorme que temos é notificar as pessoas. A gente é um negocinho desse tamanho. Temos que notificar pelos Correios. Aí volta. Como faz? Não tenho nem servidor nem dinheiro para mandar notificar.
Qual será a prioridade da comissão de Ética no seu mandato?
Gostaria que a gente atuasse mais nos moldes do escritório de ética norte-americano, que trabalha mais com prevenção ao conflito de interesses, do que como órgão repressivo. Processar denúncia só é relevante quando ocorre tempestivamente, em casos iminentes. Caso de ex-ministro só atola a comissão com algo totalmente inútil.
Como solucionar os casos de uso irregular de aeronaves da Força Aérea Brasileira (FAB)?
Não entendo como as autoridades reincidem nesse tipo de coisa. Essa questão de voos provoca um desgaste tão grande que poderia ser evitado. Deveria haver um esforço maior de publicar e dizer o que pode e o que não pode nesses voos, como também em relação a viagens e presentes. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.