O ministro Edson Fachin, do Supremo Tribunal Federal (STF), justificou a inclusão do presidente Michel Temer como investigado em inquérito que apura suspeitas de repasses de propinas da Odebrecht para “evitar dissipação de provas”.
A investigação apura supostos repasses para campanhas eleitorais do MDB em troca de favorecimento à empresa. Já eram investigados no caso os ministros Eliseu Padilha (Casa Civil) e Moreira Franco (Secretaria-Geral da Presidência). O inquérito foi aberto em abril de 2017 com base nas delações de executivos e ex-executivos da Odebrecht.
O ministro, que agiu aceitando o pedido feito pela procuradora-geral da República, Raquel Dodge, citou precedentes de quando outro presidente também foi investigado por fatos anteriores ao exercício do mandato presidencial.
Em 1992, a Corte discutiu sobre a tramitação de uma investigação solicitada contra o então presidente Fernando Collor de Mello por fatos anteriores ao exercício do mandato. Na ocasião, o relator, ministro Celso de Mello, entendeu que a imunidade temporária tem por finalidade impedir que o presidente da República seja responsabilizado, mas não impediria a investigação. A Corte, no entanto, decidiu enviar o caso para o TSE entendendo que não tinha competência para analisar o caso porque se tratava de fato anterior ao mandato.
Fachin cita esse caso na decisão desta sexta-feira, 2. Para o ministro, “é de sustento constitucional a hermenêutica segundo a qual eventual investigação do Presidente da República não afronta a Carta Magna.”
Esta é mais uma investigação aberta contra o presidente, que é alvo de um inquérito em andamento sob a suspeita de ter editado um decreto que modificou regras do setor portuário, sob relatoria do ministro Luís Roberto Barroso. Outros inquéritos contra o presidente que levaram a PGR a denunciá-lo por duas vezes estão suspensos após decisão da Câmara dos Deputados barrar o prosseguimento até que ele deixe o mandato presidencial.
“Defiro o pedido da Procuradora-Geral da República para determinar a inclusão de Michel Miguel Elias Temer Lulia, atual Presidente da República, como investigado nestes autos de inquérito, sem prejuízo algum das investigações até então realizadas e daquelas que se encontram em curso. Defiro também, a pedido da Polícia Federal e da Procuradoria-Geral da República, a prorrogação do prazo para as investigações, determinando, assim, o retorno dos autos à autoridade policial para que, no prazo máximo de 60 (sessenta) dias, proceda à conclusão das diligências pendentes e apresente a peça informativa”, decidiu o ministro Edson Fachin.
Fachin explica que só não são casos para aceitar pedidos da PGR de instauração de inquérito se houver manifesta existência “de causa excludente da ilicitude do fato; a existência manifesta de causa excludente da culpabilidade do agente, salvo inimputabilidade”, se o fato narrado evidentemente não constituísse crime, se fosse extinta a punibilidade do agente, ou se não tivessem indícios mínimos de autoria ou materialidade, “as quais, registro, não se fazem presente no caso”, afirmou.
Quando foi aberta a investigação em abril de 2017, junto com outras 75 baseadas na megadelação da Odebrecht, no que veio a ser conhecido como Lista de Fachin, o então procurador-geral, Rodrigo Janot, não pediu a investigação de Temer, apesar de haver citações a ele. O entendimento de Janot é o de que presidentes da República em exercício não devem ser investigados por supostos crimes que teriam cometido antes de chegarem ao posto. Na visão de Janot, a Constituição prevê uma “imunidade temporária” ao presidente. Dodge discordou.
“A apuração dos fatos em relação ao Presidente da República não afronta o art. 86-? 4º da Constituição. Ao contrário, é medida consentânea com o princípio central da Constituição, de que todos são iguais perante a lei, e não há imunidade penal”, afirmou Dodge no pedido feito nesta terça-feira.
10 milhões
O inquérito procura comprovar se, conforme apontado por delatores da Odebrecht, houve pagamento de vantagens indevidas para irrigar campanhas eleitorais do MDB em troca de atendimento de interesses do grupo empresarial na Secretaria de Aviação Civil da Presidência da República, chefiada pelos dois homens fortes do Planalto entre 2013 e 2015.
Os autos do inquérito em andamento incluem as informações prestadas por delatores da Odebrecht sobre um jantar no Palácio do Jaburu em maio de 2014 em que Marcelo Odebrecht, herdeiro do grupo empresarial, teria acertado com Padilha o pagamento de R$ 10 milhões. Temer estava no jantar, mas não na hora da discussão sobre valores, segundo delatores.
Temer já foi formalmente incluído como investigado no STF em dois outros inquéritos, por supostos crimes que teriam sido cometidos já durante o mandato. O que apura o recebimento de vantagens do grupo J&F e o outro, se ele editou um decretou um decreto para beneficiar empresas no setor portuário.
A PGR apresentou duas denúncias contra Temer, uma pelo episódio da mala de R$ 500 mil da JBS carregada pelo ex-assessor especial Rodrigo da Rocha Loures, e outra pela suposta participação no chamado “quadrilhão do MDB da Câmara”. Ambas as denúncias foram rejeitadas na Câmara, e as investigações sobre esses dois pontos estão suspensas até que o emedebista deixe a Presidência.