O Tribunal de Justiça do Paraná condenou, na tarde desta segunda-feira (3), a seis anos e oito meses de prisão de Ezequias Moreira Rodrigues, atual secretário especial de Cerimonial do governo Beto Richa (PSDB), pelo caso que ficou conhecido como “sogra fantasma”.
Contudo, a decisão dos desembargadores do Órgão Especial não terá nenhum efeito prático porque, em função da pena aplicada, o crime prescreveu – ou seja, passou o prazo em que era possível punir. Sendo assim, ele não sofre qualquer sanção, nem mesmo deixa de ser réu primário.
A decisão ainda não é definitiva, pois cabe recurso tanto por parte da defesa como por parte do Ministério Público. Ambos os lados informaram que pretendem recorrer. Procurada pela reportagem, a defesa informou que não irá se pronunciar sobre o caso. Questionado se a condenação, ainda que com a prescrição, mudaria algo na situação de Ezequias, o governo estadual informou que vai esperar a publicação do acórdão, o que não deve levar cerca de um mês, para ter acesso ao teor da decisão e então se pronunciar.
Entenda o caso
O caso conhecido como “sogra fantasma” veio a público em 2007, quando ao jornal Gazeta do Povo publicou que Verônica Durau, mãe da esposa de Ezequias, reconheceu ao ser procurada pela reportagem que não trabalhava na Assembleia – ao contrário do que constava na folha de pagamento do Legislativo. Procurado à época, já então chefe de gabinete da prefeitura de Curitiba, Ezequias disse que se tratava de “mentiras”, fruto de perseguições políticas, que seriam em breve esclarecidas. Mas houve a comprovação de que os salários caiam em uma conta aberta por Ezequias e ele reconheceu a irregularidade e assumiu toda a culpa, se comprometendo a devolver os salários recebidos indevidamente.
A investigação mostrou que Veronica Durau foi contratada em 1996, como funcionária do gabinete do então deputado estadual Beto Richa. Quando Richa foi eleito vice-prefeito e deixou a Assembleia em 2001, Ezequias teria negociado com o entãodiretor-adjunto Luiz Carlos Molinari (morto em 2005) para que a contratação da sogra fosse transferida para a área administrativa do Legislativo. E assim teria permanecido, mesmo depois de dois anos da morte de Molinari, até que o caso foi descoberto em 2007.
Segundo o MP, o secretário usava a sogra como “laranja”, com salário de R$ 3,4 mil mensais em seu nome, somando R$ 539 mil ao longo de 11 anos. Ele confessou a ilegalidade e se dispôs a ressarcir os cofres públicos, com quatro cheques posteriormente depositados. A devolução não encerrou os inquéritos, que geram duas ações – uma cível, em que foi condenado por improbidade administrativa, e outra criminal, acusado de peculato (desvio de dinheiro público). O Ministério Público não encontrou evidências de que Richa ou Verônica tivessem tido benefícios com o caso ou mesmo conhecimento da ilegalidade.
O caso tramitava a passos lentos em primeira instância até julho de 2013 e quando estava prestes a ser concluído, Ezequias foi nomeado secretário especial, ganhando o direito de foro privilegiado, passando a ter o caso analisado diretamente pelo Tribunal de Justiça.
Debate jurídico
A discussão no tribunal se arrasta há anos e, depois de dois meses parado nas mãos do desembargador Carvílio da Silveira Filho, nesta segunda-feira (3) o processo retornou à pauta, em debate que levou duas horas. Houve pontos de divergência. Enquanto alguns magistrados defenderam a redução da pena, outros acataram o argumento do Ministério Público e queriam aumentar o tempo de condenação – o que evitaria a prescrição do caso – mas foram vencidos. Foi o caso dos desembargadores Fernando Prazeres e Ruy Cunha Sobrinho, que falaram sobre os efeitos morais da prescrição. Destacaram que o caso é “gravíssimo”, com consequências que afetam a imagem dos órgãos públicos e que a falta de uma punição efetiva depois de 11 anos praticando o crime era inapropriada.
Já Carvilio destacou que Ezequias mudou, que é um novo homem, que mais nada pesa contra ele e que, assim, a dose da pena seria desproporcional. “Houve um arrependimento real”, considerou. O fato de ele ter devolvido o dinheiro foi considerado um atenuante. Ao citar o risco de Ezequias perder o cargo como funcionário celetista na Sanepar, Miguel Kfouri Neto citou que “justiça criminal sem misericórdia não é justiça, é crueldade”. O desembargador Telmo Cherem, por exemplo, apesar de repreender a atitude de Ezequias, destacou que o sistema demorou tanto para analisar o caso que o Ministério Público e a Justiça deviam assumir a culpa pela condenação sem efeito. “O caso é emblemático, muito feio. Eu não o teria como meu secretário”, comentou.
Por 11 votos, venceu a tese do relator do caso, Luis Carlos Xavier, que considerou Ezequias culpado por peculato, com pedido de pena de seis anos e oito meses de prisão, a ser cumprida em regime semiaberto, com pagamento de 173 dias de multa e a perda de cargo público. Contudo, a pena-base ficou em quatro anos e como se passaram oito anos desde o recebimento da denúncia pelo Judiciário, a condenação passa a não ter efeito. Não haveria prescrição caso a pena-base fosse superior a quatro anos. Pela lei, os crimes de peculato são punidos com penas entre dois e 12 anos de prisão.