Enquanto os Poderes Executivo e Legislativo discutem quem deve ter a prerrogativa de nomear dirigentes de estatais, especialistas no assunto ouvidos pelo Estado chamam a atenção para a necessidade de inclusão de um item, fundamental na opinião deles, no debate em torno da melhoria da governança das empresas públicas: o fortalecimento das agências reguladoras. O assunto nem sequer é citado no anteprojeto de Lei de Responsabilidade das Estatais, apresentado conjuntamente no início do mês pelos presidentes Renan Calheiros, do Senado, e Eduardo Cunha, da Câmara, ambos do PMDB.

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“Este é um assunto que deveria estar numa discussão pública. É mais importante, por exemplo, que a necessidade de haver sabatina no Senado para aprovação do nome de diretores de estatais”, afirma Sérgio Lazzarini, diretor de Pesquisa e Pós-Graduação do Insper (Instituto de Ensino e Pesquisa), Ele liderou a elaboração do estudo Empresas Estatais no Brasil: Uma Proposta de Reforma Institucional, uma parceria entre professores do Insper e da Faculdade de Direito da Fundação Getúlio Vargas (FGV).

Elaborado há cerca de 30 dias, o documento serviu de base de discussão em diversas estatais e também chegou ao PMDB antes da apresentação do anteprojeto. Lazzarini vê na proposta de Cunha e Renan o mérito de promover a discussão sobre o tema, mas observa que há várias incongruências entre o estudo e o anteprojeto.

Não consta no estudo, por exemplo, a necessidade da aprovação, no Senado, da nomeação de presidentes das sociedades de economia mista de capital aberto. A mais polêmica das propostas do anteprojeto foi interpretada politicamente como uma tentativa de reduzir o poder da presidente da República. Após reação negativa da presidente Dilma Rousseff, tanto Renan quanto Cunha admitiram recuar na proposta antes mesmo do início da tramitação da matéria.

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Por outro lado, a sugestão de reforçar o perfil técnico dos dirigentes das agências reguladoras não foi aproveitada por Renan e Cunha. “Eles não estão interessados em diminuir o poder político nas agências, onde controlam cargos”, disse Lazzarini. Segundo ele, a força da agência reguladora está diretamente relacionada à previsibilidade do seu setor de atuação. “Se tivéssemos agências mais fortes, nunca seria possível a intervenção no preço do petróleo, como o primeiro governo Dilma fez”, disse.

Marco legal

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Lazzarini também defende que a melhoria da governança nas estatais passa pelo aprimoramento maior do marco legal, com vista a diminuir a influência do poder político sobre elas. “É preciso ficar atento à tramitação do projeto para evitar que se crie uma lei monstruosa, que concorra com a Lei das Sociedades Anônimas, que é muito boa”, disse.

O estudo sugere ainda que a discussão passe pela proposta de proibição de doações de campanha por grupos econômicos que têm contratos com empresas estatais, a promoção da transparência na divulgação de dados e políticas relativas à atuação da estatal e o reforço do papel fiscalizador de órgãos como Tribunal de Contas, Ministério Público e Polícia Federal.

As sugestões foram catalogadas depois que os estudiosos identificaram como principais problemas nas estatais o excessivo uso delas para atender interesses políticos, a corrupção como fonte de renda de partidos e a falta de transparência – mesmo com a Lei de Acesso à Informação – e de controle sobre o desempenho dessas empresas. “As estatais têm objetivos diferentes das empresas privadas. É preciso discutir quais são esses objetivos para entendermos por que, por exemplo, a estatal abre mão de certas coisas para atender ao interesse da sociedade”, afirma Marcos Lisboa, diretor-presidente do Insper.