Dos 22 ministros que farão parte do governo Jair Bolsonaro, 18 participaram ontem de cerimônias de transmissão de cargos e listaram suas prioridades. Contudo, a maior parte das medidas anunciadas ainda esbarra em condições como vontade política do Congresso Nacional, recursos do Orçamento ou articulação com Estados para serem colocadas em prática. Para especialistas, o ideal é que estas propostas sejam apresentadas logo no início do governo para aproveitar o período de “lua de mel” com a sociedade e o Legislativo.
Entre as cerimônias mais concorridas do dia, a posse de Sérgio Moro no Ministério da Justiça foi marcada pelo seu discurso de combate à corrupção. Ele listou uma série de medidas que irá incluir em projeto que enviará em fevereiro aos parlamentares, como a previsão de início da execução da pena após condenação em segunda instância. A medida depende de alteração na Constituição.
“No caso da execução criminal após julgamento em segunda instância, acredito que esse novo governo irá tentar uma mudança por meio de emenda constitucional, que precisa de maiorias qualificadas na Câmara e no Senado. As demais propostas irão demandar mudanças em leis ordinárias (em que é preciso maioria simples). Se Moro e o governo souberem trabalhar com a força desse início de mandato poderão, sim, fazer com que essas propostas se tornem realidade”, afirmou a advogada Vera Chemim, mestre em direito público pela FGV.
O maior desafio do governo, porém, deverá ser na economia. Ao tomar posse no novo Ministério da Economia, Paulo Guedes reafirmou o compromisso de apresentar uma reforma da Previdência ao Congresso. Em seu discurso, o mais longo do dia – 50 minutos -, deu o direcionamento do que será prioridade e disse contar com os Três Poderes para levar seu plano de recuperação fiscal adiante. “Não existe superministro, não existe alguém que vai consertar os problemas do País sozinho, os Três Poderes terão de se envolver”, disse.
Continuidade
Nem todas as medidas anunciadas pelo primeiro escalão de Bolsonaro representam mudanças significativas, mas ampliação de iniciativas que já vinham sendo implementadas pelo governo. Um dos exemplos é o pagamento de décimo terceiro para beneficiários do Bolsa Família, promessa de campanha do presidente, reafirmada ontem por Osmar Terra ao assumir o Ministério da Cidadania. Neste caso, o governo precisará incrementar a verba destinada ao programa.
Para Marilda Silveira, advogada e doutora em Direito Público do IDP-SP, qualquer alteração no programa também irá implicar em uma alteração na lei. “O mesmo raciocínio vale para um eventual ‘pente-fino’ no programa. Além do trabalho para evitar fraudes, o governo pode querer criar novas regras para o recebimento do benefício. Nesse caso, de novo, será preciso mudar a lei e levar as propostas para o Congresso”, afirmou a advogada.
Para analistas e estudiosos ouvidos pelo jornal O Estado de S. Paulo, o foco na educação básica e em melhorias de gestão anunciadas ontem como prioridades pelo novo ministro da Educação, Ricardo Vélez Rodriguez, também traz pouca novidade em relação ao que o governo federal já vinha fazendo.
“A prioridade dada às diversas manifestações de analfabetismo é correta, mas não consigo ver ainda em que sentido isto será diferente da política do ministério que está saindo agora”, disse Simon Schwartzman, membro da Academia Brasileira de Ciências.
Para Leandro Tessler, especialista em educação superior da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), as intenções de fomentar modelos de gestão mais eficientes, além da qualidade na pesquisa acadêmica, é positiva. “Todos queremos”, disse Tessler, que prevê dificuldades, porém, caso o ministério insista em regular o perfil ideológico de instituições. “O novo ministro passa a impressão de querer intervir sobre os rumos do ensino superior brasileiro através de ações do ministério. Acho que isso será uma tarefa muito mais difícil do que o ministro pode supor.” As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.