O Sindicato Nacional dos Auditores Fiscais da Receita Federal (Sindifisco) reagiu às acusações do ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Gilmar Mendes, que foi investigado preliminarmente numa operação do órgão por suspeita de irregularidades.
Numa dura nota de repúdio, o Sindifisco diz que os auditores têm assistido atônitos “a um magistrado da mais alta corte do País” proferir impropérios e acusações da maior gravidade”, classificando os servidores do órgão por termos como “milícias”, “bando”, e jogando ao vento especulações vazias acerca da existência de “achaques” e de um suposto “mercado de dossiês”.
“Esse espetáculo deprimente contrasta com o papel e as responsabilidades de quem está investido do nobre encargo de zelar pelo respeito à Constituição Federal”, critica o Sindifisco.
“Ao contrário do que insinuou Gilmar Mendes – sem apresentar, aliás, a mais ínfima prova – não se trata de um ‘bando’ ou ‘milícia institucional’ destinada a perseguir e ‘achacar’ alvos selecionados por suas predileções ideológicas ou por seu posicionamento crítico à Lava Jato”, defende-se o sindicato.
Em 2018, como revelou o Broadcast, sistema de notícias em tempo real do Grupo Estado, a Receita criou a Equipe Especial de Programação de Combate a Fraudes Tributárias (EEP Fraude) com o objetivo de fazer uma devassa nos dados fiscais, tributários e bancários de agentes públicos ou relacionados a eles. A partir de critérios predefinidos, o grupo chegou a 134 nomes. Da relação, constam ainda Blairo Maggi, ex-senador e ex-ministro da Agricultura no governo Michel Temer, o desembargador Luiz Zveiter e o ex-ministro do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) Marcelo Ribeiro.
Os auditores acusam Gilmar Mendes de, sem nenhum lastro fático, criar uma temerária narrativa de que a Receita Federal teria se transformado num órgão de “pistolagem” a serviço de juízes e promotores, referindo-se de maneira inusitadamente ofensiva ao Ministério Público Federal e aos magistrados responsáveis pelos julgamentos atinentes às operações Lava Jato e Calicute.
Segundo o ministro, teria havido uma “encomenda” desses órgãos junto aos auditores fiscais, que estariam atuando à margem da lei e à revelia do órgão.
Para o sindicato, o pano de fundo para esses ataques é a adoção pelo Fisco da metodologia específica para detecção de ilícitos tributários de pessoas politicamente expostas – agentes públicos que desempenham cargos e funções públicas relevantes, assim como seus familiares e pessoas do seu entorno. Para e entidade, não raras vezes essa metodologia acaba levando os auditores a se depararem com delitos relacionados, destacadamente a lavagem de dinheiro e a corrupção.
“Não interessa à sociedade uma Receita Federal que, enquanto demonstra rigor com as declarações de imposto de renda de pequenos contribuintes, passa ao largo dos radares das grandes movimentações financeiras”, argumenta a entidade sindical na nota.
O Sindifisco afirma que é incompreensível que Gilmar Mendes não se veja como um contribuinte comum, como qualquer outro brasileiro, suscetível de ter seu patrimônio e rendas verificados pela Receita. E vai além: “Afinal, qual o contribuinte que, ao receber uma intimação, convoca diretamente o secretário da Receita Federal para lhe dar explicações?”, questiona o sindicato na nota.
O Sindicato conta que o próprio ministro informou que, quando o IDP (empresa da qual é sócio) foi intimado, chamou Jorge Rachid ao seu gabinete. “Este lhe teria dito que o auditor fiscal responsável pelo procedimento era ligado à operação Calicute, e que isso já o deixara ‘advertido’. Seria isso normal?”, ataca o sindicato.
Para os auditores, Gilmar Mendes segue um rito nada convencional e se vale da condição de ministro da mais alta corte do País e já, avisou, sem papas na língua, que pretende extinguir a área da Receita que ousou lhe investigar.
A nota cita reportagem do último domingo do jornal O Estado de S. Paulo que revelou uma articulação de Mendes junto a um grupo de parlamentares, na tentativa de convencê-los a apresentar um projeto de lei para limitar a atuação da Receita, um dos alicerces da Operação Lava Jato e de outras operações.
“Ora, se há necessidade de alterar a lei para amordaçar a Receita Federal, é porque sua atuação hoje está plenamente dentro da lei”, diz a nota, destacando que são graves as acusações de Gilmar Mendes quando afirma ter “certeza de que há muitos empresários sendo achacados por fiscais”.