A direção do PT vai levar à pauta da reunião do diretório nacional no Rio de Janeiro, nesta sexta-feira, 26, e sábado, 27, a proposta de organizar uma conferência econômica do partido. O fórum seria um projeto paralelo ao Programa Nacional de Emergência, cujo texto foi adiantado pela reportagem.

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“O programa de emergência é para lidar com a questão imediata do problema fiscal do País. A conferência seria um encontro com espaço para um debate mais amplo sobre os rumos da economia brasileira”, afirmou Marcio Pochmann, presidente da Fundação Perseu Abramo, ao Broadcast Político.

A fundação, que é o braço intelectual da legenda, foi chamada pela direção para auxiliar no debate econômico, com propostas para curto, médio e longo prazos. “O PMDB, que tem a Vice-Presidência, fez seu projeto ‘Ponte para o Futuro’, nada mais natural que o PT também contribua com diretivas sobre a política econômica”, afirmou Pochmann.

O documento mencionado pelo presidente da Perseu Abramo foi apresentado no ano passado, em meio às crescentes especulações de impeachment de Dilma Rousseff. O programa peemedebista, patrocinado por Michel Temer, trouxe uma série de propostas liberais que confrontam diretamente as pautas da base sindical do PT. O documento fala, por exemplo, da flexibilização de leis trabalhistas.

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Mas mais que um contraponto ao PMDB, as propostas petistas para a economia têm se mostrado opostas aos direcionamentos recentes do próprio governo Dilma Rousseff. O atrito é tal que a presidente considera não participar da festa de aniversário de 36 anos do PT na noite de sábado, a reunião do diretório. A festa para 3 mil pessoas, com bateria da Portela, é anunciada há semanas pela legenda, com a divulgação da presença de Dilma e do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva.

Oficialmente, a direção partidária e interlocutores próximos a Lula dizem que o objetivo do partido é contribuir de forma propositiva com Dilma. Na prática, o governo enfrentará pressão crescente do seu próprio partido. Pochmann reforça essa linha propositiva, mas admite que há um desconforto da legenda com as medidas de ajuste do governo Dilma, como o anúncio de contingenciamento do orçamento. O corte veio com a proposta de gatilhos caso limites de gastos não sejam cumpridos. Um deles atinge diretamente uma bandeira dos governos do PT: a suspensão do reajuste do salário mínimo acima da inflação.

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“O caráter social, que é o sentido do PT, de certa maneira não tem sido parte da discussão da economia até agora”, afirma Pochmann.

Propostas à esquerda

O Programa Nacional de Emergência, que também está na pauta da reunião do diretório, traz sugestões como o uso de reservas internacionais para a criação de um fundo de desenvolvimento e emprego, além de falar da “radicalização” dos mecanismos de distribuição de renda. Outros temas polêmicos que compõem o programa são a redução de taxa de juros e a recriação da CPMF. Dilma já se posicionou de forma contrária ao uso das reservas e uma intervenção maior sobre a atuação do Banco Central deixaria o mercado ainda mais desconfiado com o governo.

Já a conferência traria outros temas com olhar desenvolvimentista, como propostas para a ‘reindustrialização’ da economia brasileira – que suscitaria o debate da volta de incentivos fiscais -, a melhoria na qualidade de postos de trabalho no setor de serviços e formas de ampliar a discussão econômica para “além do tripé macroeconômico”, como afirmou Pochmann ao argumentar que o debate precisa sair da discussão básica em torno de políticas fiscal, monetária e cambial.

“Podemos ir além, discutir como resgatar a indústria, já que o Brasil voltou a ser essencialmente uma economia de produtos primários; como aumentar a inclusão da base da pirâmide social com melhoria da qualidade dos postos de trabalho na área de serviços e também a questão da sustentabilidade ambiental”, afirmou Márcio Pochmann. “A conferência pode ter o papel de organizar melhor a complexidade da situação atual do Brasil e trazer projetos para os próximos anos.”

Oxigenada

O economista, de linha desenvolvimentista como a presidente Dilma, diz que a proposta discutida até aqui não inclui trazer debatedores de linha ortodoxa – para ele “neoliberal”. “Seria mais dentro dessa perspectiva (desenvolvimentista). Afinal, a outra (ortodoxa) já se conhece tão bem, está tão exposta. Precisamos de uma oportunidade para dar uma ‘oxigenada’.”

O presidente da fundação questiona a efetividade de perseguir um superávit primário, tão cobrado pelo mercado financeiro, e cita o caso do Canadá, como um país que já determinou que terá déficit “por vários anos”. Perguntado se a situação brasileira não é diferente por ser uma economia em desenvolvimento e menos estável que a canadense, Pochmann rebateu: “No ano passado o Brasil teve déficit nominal de 10% do PIB e ainda foi o quarto a receber investimentos estrangeiros diretos, alguma coisa aí não bate”.

A proposta de realizar a conferência ainda depende de aprovação na reunião do diretório. Idealmente, ela seria realizada no primeiro semestre, para evitar o período mais “agitado” das eleições municipais. Pochmann se disse otimista com a aprovação da ideia. “Acho que tem convergência para se aprovar uma proposta dessa natureza, não vejo grandes obstáculos, mas posso estar enganado.”