Em cerimônia na sede da Advocacia-Geral da União (AGU), o presidente Michel Temer, que vive em um embate público com o procurador-geral da República, Rodrigo Janot, lembrou seu tempo de procurador-geral do Estado, criticou o abuso de autoridade e afirmou ter satisfação em recordar sua atuação como advogado público. “Tenho a satisfação de estar aqui e, convenhamos, recordar bons tempos de 82 e 83 quando o mundo, pelo menos para mim, era mais tranquilo”, afirmou.
Ao lado da presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), ministra Cármen Lúcia, e da ministra da AGU, Grace Mendonça, Temer disse ainda que hoje se fala muito de abuso de autoridade, “quando a única coisa que tem autoridade é a lei”. “Há uma visão muito autoritária da ideia de autoridade, as pessoas acham que a autoridade é a constituída, e quando na verdade a única figura que tem autoridade no nosso sistema é a lei”, afirmou.
Temer disse ainda que ofender o presidente da República não é abuso de autoridade. “Quando se ultrapassa os limites legais é que há abuso de autoridade. As pessoas interpretam de uma maneira: se ofende o presidente ou uma autoridade constituída, isso é abuso de autoridade, e não é. Você só abusa da autoridade quando ultrapassa o limite da lei. A lei que deve imperar em todos os momentos.”
O presidente afirmou que os procuradores do Estado, “os advogados públicos, são chamados para uma causa pública”. “São obviedades que devem ser repetidas”, afirmou. Temer disse ainda que o advogado do Estado tem duas tarefas distintas. “Uma é a da defesa patrimonial do Estado, e outra é quando faz o papel de consultor do Estado, e que deve estar obediente ao princípio da legalidade”, afirmou.
Questionada se o procurador-geral da República também foi convidada ao evento, a AGU disse que o evento era sobre a advocacia pública e informou que se limitou a convidar a Presidência do Supremo “pela ligação histórica com a advocacia pública” e o Ministério das Relações Exteriores “pela natureza do acordo celebrado”.
No evento, que marcou a assinatura de dois acordos de cooperação que, segundo a Advocacia-Geral da União, pretendem fortalecer a defesa do Brasil nas cortes interamericanas de direitos humanos e diminuir os conflitos judiciais entre entes da Federação, Temer disse ainda que a atual federação “é capenga”. “Ela não é verdadeira, é artificial porque a autonomia dos Estados é muito restrita no nosso sistema.”
O presidente repetiu que seu governo busca a harmonia entre os Poderes e destacou que o Judiciário vive uma situação que a litigiosidade tem aumentado enormemente. “Você não deve litigar para litigar, mas para buscar justiça”, ponderou. “A litigância aumentou enormemente, isso cria uma instabilidade social, porque você coloca gente litigando no judiciário onerando o poder público”, completou.
Em sua fala, a ministra Grace destacou a participação de Cármen e de Temer na cerimônia na sede da AGU. “Contamos com o apoio, força e a consideração de dois chefes de poderes”, disse.
Já Cármen, que também discursou, fez uma defesa da evolução na advocacia e repetiu uma frase que o presidente tem usado em suas falas, de que o Brasil está se modernizando e chegando ao século XXI. “Nós precisamos transformar e chegar ao século XXI também na advocacia”, disse a presidente do STF.
Ofensiva
Após a derrubada da denúncia por corrupção passiva na Câmara, o presidente Temer passou a acusar mais abertamente o procurador-geral da República, Rodrigo Janot, de ter uma atuação pessoal contra ele, e concentrou esforços em conversas com membros do Judiciário.
No domingo, 6, Temer recebeu o ministro Gilmar Mendes fora da agenda oficial no Palácio do Jaburu e, terça-feira (8) à noite, também fora da agenda, esteve com a futura substituta de Janot, Raquel Dogde. Segundo a assessoria de imprensa da Presidência, Temer já tinha saído do Palácio do Planalto e finalizado sua agenda “quando recebeu o telefonema da procuradora-geral solicitando uma conversa. O presidente se prontificou a atendê-la e a recebeu no Palácio do Jaburu”.
O encontro de Temer e Raquel foi realizado no mesmo dia em que o presidente pediu ao ministro Edson Fachin, relator da Lava Jato e do caso JBS no Supremo Tribunal Federal, a suspeição – e impedimento – do atual procurador-geral, por meio de seu advogado, o criminalista Antônio Claudio Mariz de Oliveira.
Na ação, Temer alega que “já se tornou público e notório que a atuação do procurador-geral da República, em casos envolvendo o presidente da República, vem extrapolando em muito os seus limites constitucionais e legais inerentes ao cargo que ocupa”.