Apesar das manifestações de junho de 2013 – carregadas com o simbolismo de um movimento popular por renovação política e avanço nos direitos sociais – o resultado das urnas revelou uma guinada em outra direção. Parlamentares conservadores se consolidaram como maioria na eleição da Câmara, de acordo com levantamento do Departamento Intersindical de Assessoria Parlamentar (Diap).
O aumento de militares, religiosos, ruralistas e outros segmentos mais identificados com o conservadorismo refletem, segundo o diretor do Diap, Antônio Augusto Queiroz, esse novo status. “O novo Congresso é, seguramente, o mais conservador do período pós-1964”, afirma. “As pessoas não sabem o que fazem as instituições e se você não tem esse domínio, é trágico”, avalia.
Ele acredita que a tensão criada pelo debate de pautas como a legalização do casamento gay e a descriminalização do aborto deve se acirrar no Congresso, agora com menos influência de mediadores tradicionais, que não conseguiram de reeleger. “No caso da Câmara, muitos dos parlamentares que cuidavam da articulação (para evitar tensões) não estarão na próxima legislatura. Algo como 40% da ‘elite’ do Congresso não estará na próxima legislatura, seja porque não conseguiu se reeleger ou disputou outros cargos. Houve uma guinada muito grande na direção do conservadorismo”, diz.
O levantamento do Diap mostra que o número de deputados ligados a causas sociais caiu, drasticamente, embora os números totais ainda estejam sendo calculados. A proporção da frente sindical também foi reduzida quase à metade: de 83 para 46 parlamentares. Junto com a redução desses grupos, o aborto, o casamento entre pessoas do mesmo sexo e a descriminalização das drogas – temas que permearam os debates no primeiro turno da disputa presidencial – têm poucas chances de serem abordados pelo Congresso eleito, que tomará posse em fevereiro de 2015. “Posso afirmar com segurança que houve retrocesso em relação a essas pautas. Se no atual Congresso houve dificuldade para que elas prosperassem, no próximo isso será muito mais ampliado. Houve uma redução de quem defendia essa pauta no Parlamento e praticamente dobrou (o número de) quem é contra”, diz.
Parte consistente do conservadorismo, segundo Queiroz, virá da bancada evangélica. Ele estima que o número de religiosos desta corrente deve crescer em relação aos 70 deputados eleitos em 2010. “A bancada evangélica vai ficar um pouquinho maior, mas com uma diferença: nomes de maior peso dentro das igrejas para melhor coordenar e articular os interesses desse segmento junto ao Congresso Nacional”, diz. Entre essas lideranças, o Diap já identificou 40 bispos e pastores.
Militares
O Diap também estima um aumento consistente de policiais e militares eleitos. Queiroz prevê que o aumento de parlamentares com este perfil deve chegar a 30%. “Esse grupo, necessariamente, vai fazer parte da ‘bancada da bala’, porque defende a defesa individual”, diz, referindo-se ao lobby da indústria armamentista.
A ampliação desse grupo é uma onda que veio na contramão das manifestações populares de 2013. “Isso é produto da alienação. Quem foi para rua, em grande medida, foi pedindo mudanças. Mas sem ter uma liderança capaz direcionar e coordenar (o movimento). Era ‘contra tudo o que está aí'”, observa. Queiroz considera que, caso o candidato do PSDB, Aécio Neves, seja eleito, temas como a redução da maioridade penal, considerada uma proposta conservadora, avancem facilmente no Congresso. “O PSDB perdeu em quantidade (reduziu de 12 para dez o número de senadores), mas é uma bancada que se renova do ponto de vista qualitativo. Só que com viés conservador”, diz.