O processo de escolha da empresa que fará o projeto de engenharia da nova sede do Tribunal de Justiça de São Paulo (TJ-SP) está em sigilo, e nem desembargadores do próprio órgão podem ter acesso aos documentos da licitação, destaca o jornal O Estado de S. Paulo. A licitação está estimada em R$ 25,3 milhões e é uma das etapas para a construção da nova sede, orçada em R$ 1,2 bilhão.
O sigilo é decisão do relator do processo, desembargador Ferraz de Arruda. Segundo a assessoria de imprensa do TJ-SP, ele determinou o segredo depois de o presidente do tribunal, desembargador Manoel Pereira Calças, decidir suspender a licitação, no mês passado.
Nota enviada pelo desembargador Ferraz de Arruda afirma que o sigilo foi determinado “considerando que a sua publicidade poderia comprometer o andamento procedimental”, mas que deve retirá-lo na próxima sessão do Órgão Especial, na semana que vem.
A determinação pelo sigilo foi tomada quando a licitação estava na etapa de recebimento dos envelopes, com as propostas comerciais das empresas interessadas. A suspensão do processo tinha prazo de 30 dias, que venceu na quarta-feira, 2. Essa paralisação se deu após questionamentos feitos por uma das desembargadoras do tribunal, Maria Lúcia Pizzotti, sobre aspectos administrativos da obra e sobre o orçamento proposto.
Sem acesso às informações, até aspectos do trâmite do processo não estavam disponíveis. A desembargadora Maria Lúcia afirmou que não tinha confirmação nem se o decreto havia partido do relator Arruda ou do presidente Calças – o Estado obteve a informação por meio da assessoria de imprensa do órgão. “É um absurdo, é um assunto de interesse público, envolvendo essa vultosa quantia. Não pode ter segredo de Justiça”, disse a desembargadora. “Segredo de justiça é para casos personalíssimos, ofensa pessoal, casos envolvendo criança, a honra subjetiva. Em casos que envolvem erário, o segredo de justiça é totalmente incompatível”, completou Maria Lúcia.
‘Justificativa’
Segundo o professor de Direito Administrativo Floriano Peixoto de Azevedo Marques, diretor da Faculdade de Direito do Largo São Francisco, da USP, uma licitação pode ser colocada em sigilo ou ter partes sigilosas caso haja justificativa. “A questão é saber se há justificativa para o sigilo”, disse o professor, que avaliou o argumento do desembargador como “aberto”. Azevedo Marques lembrou, porém, que existem algumas modalidades de licitação em que o orçamento estimado feito pelo ente público é uma das partes sigilosas.
Obra
Como mostrou o Estado na terça-feira passada, o terreno apontado pelo TJ-SP como endereço da nova sede é uma Zona Especial de Interesse Social (Zeis), uma área que, de acordo com as leis de urbanismo de São Paulo, deveria ser reservada para a construção de moradias populares.
A Prefeitura, por sua vez, emitiu um alvará autorizando a construção, ao entender que a nova sede poderia ser enquadrada como um equipamento de “infraestrutura urbana”, o que é permitido por um decreto de 2016. O alvará foi obtido por um escritório de arquitetura contratado pelo TJ-SP por R$ 1,5 milhão, em um contrato assinado com dispensa de licitação. A inexigibilidade do processo licitatório se deu com base no argumento de que o mesmo escritório havia sido contratado em 2005 para fazer o anteprojeto (que antecede o projeto final) da obra, e que detinha os direitos autorais do documento.
Até agora, entre projetos, obtenção de licenças e pagamento de outorgas à cidade, já foram gastos cerca de R$ 141 milhões, segundo o Tribunal de Justiça. O plano do TJ-SP, que tem a posse do terreno desde 1983, é construir um complexo que inclui duas torres, heliponto e 584 gabinetes.
‘Prejulgamentos’
O desembargador Ferraz de Arruda afirmou, por meio de nota, que a publicidade do processo poderia “comprometer o andamento procedimental” e, eventualmente, dar motivo para “a interpretações e eventuais prejulgamentos que não serão apropriados para se alcançar uma decisão serena e equilibrada”. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.