O juiz Sérgio Fernando Moro, titular da 2.ª Vara Federal Criminal de Curitiba, afirmou ontem em nota oficial que as declarações do empresário e ex-deputado Antônio Celso Garcia, o Tony Garcia, e do advogado Roberto Bertholdo em entrevistas na imprensa nacional no último fim de semana são de exclusiva responsabilidade deles, não envolvendo os processos que tramitam na Justiça Federal. Os esclarecimentos de Moro pretendem separar as acusações divulgadas na mídia, dos depoimentos dados formalmente por Garcia e Bertholdo na Justiça.
O magistrado lembrou que Garcia, que responde a ação penal na 2.ª Vara Federal Criminal acusado de crimes financeiros associados ao Consórcio Nacional Garibaldi, "celebrou com o Ministério Público Federal acordo para colaborar com a Justiça na investigação de outros crimes, como ele mesmo admitiu em entrevista". Segundo Moro, Garcia poderá obter benefícios quando a sentença for proferida, mas não é possível adiantar quais serão eles. "De todo modo, adianta-se que o acordo envolveu o compromisso de indenização, em montante a ser definido, dos danos causados aos consorciados prejudicados", disse.
Esse tipo de colaboração é conhecida como delação premiada, em que as pessoas acusadas de crimes podem obter benefícios legais como redução de pena, ao colaborar com a Justiça. "Encontra previsão na lei brasileira e é um instrumento consagrado internacionalmente na investigação de crimes complexos, como crimes de corrupção. Evidentemente, os benefícios valem para o passado, não imunizando quem quer que seja em relação ao seu comportamento futuro", explica Moro.
Segundo o juiz, é importante ressaltar que, no tratamento da delação premiada, seguem-se os padrões internacionais no sentido de que o depoimento do delator, para obter valor probatório, necessita de corroboração por provas independentes, não sendo possível condenação criminal ou mesmo acusação formal apenas com base no depoimento do delator.
Tanto Bertholdo quanto Garcia concederam entrevistas em que fazem acusações contra parlamentares e políticos. Na sexta-feira à noite, Bertholdo acusou o deputado federal licenciado José Janene de ser o organizador do maior esquema de corrupção do País. Disse também que o suposto recebimento de dinheiro envolvendo o apresentador Carlos Massa, o Ratinho, se referia de fato à parte do caixa dois de R$ 1,8 milhão da campanha ao Senado de Garcia, que foi derrotado, em 2002.
Garcia, por sua vez, acusou o deputado José Borba de comprar a liderança do PMDB na Câmara por R$ 8 milhões, que teria sido distribuída entre os deputados da base governista. Ele disse também que se Bertholdo decidir falar, não iria sobrar ninguém da República. Segundo ele, Bertholdo, que é seu ex-advogado, substituiu Waldomiro Diniz na operação do mensalão e que as propinas eram distribuídas aos deputados na sala ao lado do gabinete de José Borba.
Da delação premiada de Garcia, afirma Moro, várias investigações estão em curso. "Algumas resultaram em ações penais, podendo ser citadas aquelas já divulgadas pela imprensa contra Roberto Bertholdo por crimes de lavagem de dinheiro, de interceptação telefônica ilegal, de ameaça e crimes de tráfico de influência, envolvendo a obtenção de decisões judiciais favoráveis em processos relacionados à ação penal proposta contra Antônio Celso Garcia no caso do Consórcio Nacional Garibaldi e envolvendo a obtenção de favores junto à CPMI do Banestado", diz o juiz.
Essas ações ainda tramitam e encontram-se sob responsabilidade de outro juiz federal, após Moro ter se afastado do caso assim que foram obtidas provas de que teria sido vítima de escuta telefônica, da qual Bertholdo é acusado.