A defesa do presidente eleito, Jair Bolsonaro (PSL-RJ), entregou na tarde desta sexta-feira, 16, ao ministro Luís Roberto Barroso, do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), um documento com esclarecimentos a respeito de 23 falhas levantadas pela Assessoria de Exame de Contas Eleitorais e Partidárias (Asepa) da Corte sobre uma série de irregularidades e indícios de omissão de gastos eleitorais na prestação de contas da campanha.
Entre as falhas na documentação entregue pela campanha de Bolsonaro estavam indícios de recebimento indireto de doações de fontes vedadas, ausência de detalhamento na contratação de empresas e comprovação de serviços efetuados e até mesmo informações divergentes entre os dados de doadores constantes na prestação de contas e aquelas que constam do banco de dados da Receita Federal.
Karina de Paula Kufa, advogada que assina o documento de 50 páginas, requer que seja emitido parecer técnico pela aprovação das contas e que, ao final, sejam julgadas como aprovadas pelo tribunal.
Karina inicia o documento afirmando que a campanha do presidente eleito e de seu vice, Hamilton Mourão, começou “sem muitos recursos”, que dispensou os recursos do Fundo Especial de Financiamento de Campanha por discordar de sua criação e que a observou os gastos dentro de suas realidades. “A utilização de recursos públicos de tal monta apresenta caráter temeroso, considerando a crise econômica instalada e os altos índices de desemprego instalados no país.”
Segundo a defesa, Fernando Haddad (PT) e Manuela DÁvila (PCdoB) gastaram, nos dois turnos, R$ 36,3 milhões, enquanto Bolsonaro e Mourão, apenas R$ 2,45 milhões.
O uso das redes sociais e busca por fornecedores fora do mercado político tradicional, “com preços compatíveis ao do mercado privado”, segundo a defesa, reduziu “drasticamente” o custo da campanha.
Esclarecimentos
Entre as falhas na documentação entregue pela campanha de Bolsonaro estava a falta de um cadastro prévio da empresa AM4, que não estaria habilitada para atuar na arrecadação de recursos via financiamento coletivo. Um dos contratos analisados pelo TSE diz respeito à instalação de uma plataforma desenvolvida pela AM4 para recebimento de doações via internet, que totalizou R$ 3,5 milhões.
A defesa informa ao ministro Barroso, relator da prestação de contas do presidente eleito, que a AM4, maior fornecedora da campanha de Bolsonaro, e a Ingresso Total são integrantes do mesmo grupo econômico, o Grupo AM4, e que desenvolveram juntamente a plataforma “Mais Que Voto” para gestão partidária e de candidaturas eleitorais, inclusive para gestão de arrecadação de doações.
De acordo com a advogada, todas as doações foram arrecadadas pela Aixmobil, responsável pelo arranjo de pagamento da plataforma, e não pela AM4, e o detalhamento dessas doações apresentado no SPCE.
Todas as notas fiscais relativas à taxa administrativa foram expedidas pela Aixmobil e também foram apresentadas, complementa a defesa.
“A AM4 e a Ingresso Total firmaram parceria para que a plataforma Mais Que Voto, que fornece toda a interface de comunicação e gestão para candidatos e partidos, pudesse ser integrada à plataforma de arranjo de pagamento da Aixmobil, para que fossem oferecidos os serviços de financiamento coletivo pela internet”, diz a defesa. “Desse modo, os créditos na conta bancária da campanha foram realizados pela Aixmobil, uma vez que ela era a arrecadadora responsável pelo arranjo de pagamento da plataforma Mais Que Voto. O contrato com a Aixmobil foi firmado diretamente pela AM4, que desenvolveu a plataforma Mais Que Voto em parceria com a Ingresso Total, conforme instrumento apresentado nesta manifestação.”
O relatório da área técnica do TSE pede que a defesa explique os motivos da recusa de Bolsonaro em relação ao recebimento de doações que somam R$ 95 mil.
A advogada responde que o candidato eleito decidiu aceitar apenas doações realizadas pelo sistema de financiamento coletivo e que não se mostra razoável exigir que o candidato aceite toda e qualquer doação que seja realizada em sua conta bancária. “As doações mencionadas foram realizadas na conta de campanha do candidato, sem que ele tivesse plena ciência da regularidade de sua origem. Assim, a campanha optou por não utilizar os recursos em referência, optou por proceder à devolução dos valores aos respectivos doadores, tendo em vista que não há, na legislação, vedação à devolução de receitas que ingressaram na conta de campanha à revelia do candidato.”
O parecer do TSE também mostra que a campanha descumpriu o prazo para a entrega do relatório financeiro de uma doação cuja receita totalizava R$ 1,56 milhão. A defesa justifica o atraso devido à demora de processamento dos dados por parte do Sistema de Prestação de Contas Eleitorais (SPCE), “razão pela qual não houve sonegação de informação financeira, inexistindo irregularidade”. “O atraso verificado decorreu da lentidão no processamento da importação das doações pelo SPCE, não tendo decorrido de culpa do candidato, em razão da quantidade significativa de dados a serem carregados pelo sistema, o que, de forma alguma, comprometeu a regularidade da informação, que foi prestada devidamente.”
De acordo com a área técnica do TSE, a prestação de contas de Bolsonaro informa doações às campanhas de Flávio Bolsonaro (PSL-RJ) e Eduardo Bolsonaro (PSL-SP), filhos do presidente eleito, que totalizam R$ 345 mil, mas não informou os doadores originários dos recursos.
A defesa pede o afastamento da impropriedade apontada pelo parecer afirmando que não se trata de uma obrigatoriedade legal e que a consideração das informações já estão prestadas no SPCE. “Salienta-se que além da juntada das informações relativas aos doadores originários – enviadas aos candidatos beneficiados por este prestador de contas – aos lançamentos, na aba correspondente a ‘doação a terceiros’, anexo ao comprovante de repasse, o que se faz, novamente, nesta oportunidade, cabendo ao beneficiário a obrigação e responsabilização da informação no SPCE, também foi realizado os lançamentos detalhados no SPCE diretamente por ocasião da apresentação da presente retificadora.”
A respeito de indícios de omissão de gastos eleitorais no valor de R$ 147,9 mil a partir do confronto com notas fiscais eletrônicas de fornecedores emitidas para o candidato, a campanha informa que notas fiscais foram devidamente canceladas pelos fornecedores, por não se tratar de despesas contratadas pelo prestador de contas.
O Corte Eleitoral aponta ainda a divergência na identificação dos doadores de R$ 5.030,00. A defesa informa que as irregularidades decorreram de “equívoco do doador na hora do cadastro na plataforma”. “O doador informou um nome e um CPF no cadastro e indicou outro nome e outro CPF como titular do cartão de crédito usado. Apesar de o sistema de arrecadação ter trava antifraude, que detectava esse tipo de divergência, esses 22 registros foram processados como válidos.”
“A fim de regularizar as contas, será providenciado o recolhimento da diferença não identificada ao erário público”, afirma a advogada. “Ademais, a devolução espontânea saneia a pendência e não compromete a regularidade da prestação de contas do candidato, razão pela qual este tópico deve ser afastado.”