Nomeada nesta segunda-feira, 13, como secretária especial de Igualdade Racial, a desembargadora aposentada Luislinda Valois é uma crítica da “cota de um”, expressão que usa para definir a presença de apenas um negro em cada espaço de poder. Porém, a baiana, primeira mulher negra a se tornar juíza no Brasil, é justamente a única representante negra no escalão do presidente em exercício, Michel Temer.
Luislinda é natural de Salvador, tem 74 anos e foi a primeira magistrada do País a proferir uma sentença com base na lei do crime racial, quatro anos depois de ela entrar em vigor, em 1989. Em 1993, ela condenou uma rede de supermercados a indenizar uma empregada doméstica acusada injustamente de ter roubado um frango e um sabonete das prateleiras. Há quatro anos, recebeu o título de embaixadora da paz da Organização das Nações Unidas (ONU).
“É só um negro desembargador na Bahia, é só um negro no Ministério Público do Sergipe, é só um negro no Supremo Tribunal Federal, é só um no Superior Tribunal de Justiça, é só um no Tribunal Superior do Trabalho. Mas somos 52% da população brasileira”, reclama.
Antes de ser juíza e, depois, desembargadora, Luislinda foi procuradora federal. Neta de escravos e filha de uma lavadeira e de um motorneiro de bonde, teve uma infância pobre e só se formou em Direito aos 39 anos. Desde 2013 é filiada ao PSDB, mesmo partido do titular do Ministério da Justiça, Alexandre de Moraes, ao qual a secretaria está atualmente subordinada (no governo de Dilma Rousseff, a Igualdade Racial tinha status de ministério, mas foi rebaixada na reforma administrativa de Temer).
Ela é a favor do sistema de cotas e já participou de um debate sobre o assunto em um programa de televisão, mas sua fala não foi ao ar porque era ano eleitoral – e Luislinda se candidatava a uma vaga na Câmara dos Deputados. Conquistou pouco mais de 9,5 mil eleitores, o que não foi suficiente para se eleger.
No mesmo dia em que o Senado decidiu pelo afastamento de Dilma, o Instituto Teotônio Vilela – ligado ao PSDB – publicou um vídeo em que a desembargadora repreende o fato de negros e pobres estudarem em escolas públicas, enquanto brancos e ricos estão nas instituições particulares, com muito mais acesso à educação de qualidade e tecnologias. Ela defende, ainda, que é preciso criar cotas nas comissões de concursos públicos e no Quinto Constitucional, dispositivo que prevê que 20% dos membros de determinados tribunais brasileiros sejam advogados e membros do Ministério Público.
Racismo
No vídeo, Luislinda afirma que o Brasil “não evoluiu” e que “não há vontade política de realmente exterminar o racismo”. “O povo está acostumado a vislumbrar o negro com uma vassoura e um pano de chão. Onde está a participação do povo negro na evolução socioeconômica deste País?”, questiona-se. “Se não tomarmos providências drásticas urgentemente, o racismo vai permanecer por muitos anos.”
Ela afirma, ainda, que a prática da corrupção “destrói principalmente o povo preto, pobre e da periferia”, porque lhes tira a oportunidade de saúde, segurança e educação. Fazendo referência à Dilma, diz que “o governo deixou roubar”, fazendo “os pretos pagarem mais caro”