Brasília
– A direção da CPI do Banestado decidiu requisitar todos os documentos relativos às apurações da remessa supostamente ilegal de dinheiro para o exterior por contas CC5, preliminarmente estimada em US$ 30 bilhões, e convocar pessoas que estão envolvidas nas apurações do suposto desvio para depor. Entre os documentos a serem requisitados estão o processo que corre em segrego de justiça, documentos em posse do Ministério Público Federal e os inquéritos da Política Federal e da força-tarefa formada pelo governo para apurar o caso.Deverão ser ouvidos, entre outros, técnicos do Banco Central, delegados da PF e procuradores. Na próxima terça-feira, a direção da CPI espera que as convocações e requisições sejam aprovadas já na terça-feira, para quando está convocada a próxima reunião da comissão. O presidente da CPI, senador Antero Paes de Barros (PSDB-MT), o vice-presidente, deputado Rodrigo Maia (PFL-RJ), e o relator, deputado José Mentor (PT-SP), chamaram esta primeira etapa dos trabalhos de “fase de conhecimento”.
O relator afirmou que, a partir do conhecimento dos fatos e de como funciona o processo, será definido o foco central das investigações. Mentor estima que esta primeira fase poderá demandar de 20 a 30 dias. O presidente da CPI ressaltou que o compromisso do órgão de preservar o sigilo dos documentos a serem requisitados. “Muitos documentos estão em outro país”, afirmou. “O vazamento (de informações) será a pior atitude possível. Seria fazer o jogo de quem não quer apurar.”
O relator disse que, ao final da CPI, a comissão poderá sugerir alterações na legislação pertinente às contas de residentes no exterior. “Situações tidas como legais podem ser danosas ao País”, afirmou. “Precisamos saber o que é conveniente ou não.”
Reportagem
O relator da Comissão Parlamentar Mista de Inquérito (CPMI) do Banestado, deputado José Mentor (PT-SP), e o vice-presidente, deputado Rodrigo Maia (PFL-RJ), afirmaram que a reportagem publicada na revista IstoÉ Dinheiro, que está nas bancas, com nomes de supostos envolvidos no esquema de remessa ilegal de recursos para o exterior, não altera o caminho dos trabalhos da comissão. Segundo Mentor, trata-se de uma matéria jornalística que não tem relação com a CPI e “não altera absolutamente nada” o roteiro prévio acertado ontem e que será submetido à comissão na próxima terça-feira.
O líder do PSDB na Câmara, Jutahy Júnior (BA), afirmou que a tentativa de associar o partido a uma suposta conta secreta de nome “conta Tucano” é uma farsa semelhante ao chamado dossiê Cayman, no qual lideranças tucanas foram acusadas de ter uma conta em paraíso fiscal. Segundo o líder, a CPI vai afastar definitivamente essas acusações. “Se existe a tal conta, obviamente não é partidária. É inverossímil que alguém abrisse uma conta secreta com o nome da legenda”, disse Jutahy.
Transferido depoimento de Setúbal
Durou pouco a última sessão pública da CPI do Banestado antes do recesso de meio de ano da Assembléia Legislativa. Convocado na última terça-feira, o presidente do Banco Itaú, Roberto Egydio Setúbal, não compareceu. Foi representado por seu advogado, Renê Dotti, portador de uma carta onde Setubal explicava que compromisso inadiável o impedia de vir a Curitiba nessa data. O presidente da comissão, deputado Neivo Beraldin, suspendeu os trabalhos para deliberar sobre a questão. Decidiu, de comum acordo com os outros membros da CPI, reconvocar o banqueiro paulista para o dia 4 de agosto.
Apesar das resistências da comissão, Dotti conseguiu, após o encerramento da audiência, apresentar uma sugestão: que a CPI recorra ao juiz da 2.ª Vara Criminal de Curitiba, onde se encontra o inquérito 207/98, para obter a documentação necessária. O Itaú estaria impedido de fornecê-la pela lei do sigilo bancário. Ofereceu-se para atuar como um canal de diálogo entre os parlamentares e o Itaú e para auxiliar em tudo o que for possível os trabalhos de investigação. Dois diretores do banco atenderam a convocação: Manoel Fernandes de Rezende Neto (Departamento Jurídico) e Ottávio Aldo Ronco (Auditoria de Aquisições). A CPI, entretanto, recusou-se a ouvi-los por considerar que a ausência de Setúbal prejudicava seu interrogatório.
Sigilo bancário
Como Dotti já havia feito com os deputados, o diretor do Departamento Juridico do Itaú, Manoel de Resende, explicou aos jornalistas que o banco não pretende, em momento algum, boicotar os trabalhos da CPI: “Como qualquer instituição bancária, o Itaú está sujeiro as severas normas do sigilo bancário e não pode entregar documentos que exporiam publicamente pessoas físicas e jurídicas, sob pena de sofrer uma enxurrada de ações indenizatórias.”
Segundo ele, vários documentos que tiveram o sigilo quebrado por decisão judicial foram encaminhados ao Ministério Público e a Polícia Federal. Grande parte deles, referentes às contas CC-5, está contida no inquérito 207/98, e para ter acesso a eles a Policia Federal brasileira obteve junto às autoridades judiciais americanas a quebra do sigilo. A medida, porém, se restringe à PF: “O Departamento Jurídico do banco não tem poderes para decidir sobre a quebra do sigilo bancário. Só a Justiça. Portanto, o caminho seguro seria mesmo recorrer á Justiça”, frisou Resende.
Ele destacou também que o Itaú não tem qualquer interesse em sonegar informações, até porque as irregularidades sob investigação se deram num período em que o Banestado não estava sob o seu comando. Renê Dotti acrescentou que o banco não deseja ter sua reputação de trabalho e eficiência ligada a qualquer tipo de eventual escândalo da gestão anterior.
Goldmann Sachs
Ottávio Aldo Ronco, da Auditoria de Aquisições, fez questão de esclarecer que a participação da Goldmann Sachs no processo de consulta às informações disponibilizadas pelo Banestado aos potenciais compradores inscritos através de Data-room nada teve de irregular, conforme questionamento da CPI, para quem uma carta trocada entre as duas instituições sugere a possibilidade que que o Itaú dispunha de informações privilegiadas.
Ronco frisou que o Itaú contratou a Goldmann Sachs para oferecer-lhe consultoria na questão específica da carteira de créditos de difícil recuperação, credenciando-a para atuar junto ao Data-room.
Collor também será rastreado
Brasília
– A Polícia Federal deverá desmembrar o inquérito do dossiê Cayman, segundo o qual lideranças tucanas foram acusadas de ter uma conta em paraíso fiscal, para prosseguir nas investigações em torno de uma empresa no Uruguai que, supostamente, pertence à família do ex-presidente Fernando Collor de Mello, e que foi usada para enviar dinheiro ao exterior ilegalmente. O relatório final sobre o dossiê foi remetido hoje à Justiça Federal, depois de passar cinco anos em investigação pela PF.Ao longo do inquérito, a PF indiciou 16 pessoas, incluindo Collor e seu irmão Leopoldo, além do ex-diretor-geral da própria Polícia Federal, Vicente Chelotti, e o ex-diretor da Polícia Criminal Internacional (Interpol) no Brasil, Washington Mélo.
O chamado dossiê Cayman continha documentos falsos mostrando contas bancárias do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso e seus ministros José Serra e Sérgio Motta, além do ex-governador de São Paulo, Mário Covas.
Fomento envia dados a Beraldin
O diretor da Agência de Fomento do Paraná, Antônio Rychetta Arten, envia até segunda-feira à Assembléia Legislativa todos os documentos solicitados à Agência de Fomento pela CPI do Banestado. A data está dentro do prazo de cinco dias úteis, previstos no pedido feito pela CPI e encaminhado pelo deputado estadual Neivo Beraldin (PDT), que foi protocolado na Agência de Fomento no último dia 24 de junho.
Rychetta informou ainda que na qualificação de Instituição Financeira e respeitando as normas da Agência, que prevêem sigilo bancário das informações e documentos, a direção teve que emitir uma carta consulta à Procuradoria Geral do Estado (PGE) pedindo autorização para o envio dos documentos à CPI. Sobre as pastas dos processos referentes às operações de crédito transferidas ao Estado do Paraná, o diretor da Agência de Fomento informou que não houve “perda ou destruição de documentos e sim um melhor arquivamento, respeitando as normas bancárias”.
Indícios apontam para outros nomes do PSDB
Dois outros registros de ordens de pagamento envolvem o nome “Tucano”. Segundo a reportagem, da mesma conta 310035 no JP Morgan Chase, saíram remessas para as contas 15.6161 e 15.616 na agência de Lugano, na Suíça, do banco Discount Bank and Trust. E cada uma das remessas foi de US$ 500 mil.
Os policiais também levantaram outros documentos que apontam para o PSDB. Há vários registros de transferências para a jornalista Valéria Monteiro, que apresentou os programas eleitorais de José Serra nas últimas eleições presidenciais.
O PSDB é citado em outros dois momentos. A reportagem conta que foi identificada uma remessa de US$ 6 mil para a conta 391-9, na agência de Nova York, do Banestado, que teria sido feita por Ricardo S. Oliveira. Ele seria o ex-tesoureiro de campanha do PSDB e ex-diretor da área internacional do Banco do Brasil, Ricardo Sérgio de Oliveira. Outro nome ligado ao tucanato é o S. Motta. O nome aparece em uma operação de uma offshore chamada New Satar Finantial no Banestado de Nova York. As autoridades estão focando esforços na tentativa de descobrir se trata-se do ex-ministro das Comunicações e ex-coordenador de campanhas do PSDB, Sérgio Motta.
Doleiro curitibano
A reportagem da IstoÉ Dinheiro afirma ainda que os policiais brasileiros tentaram identificar as pessoas que teriam intermediado as remessas feitas por Foz do Iguaçu. No caso da Conta Tucano, as suspeitas recaem sobre um doleiro de Campinas (SP) chamado Felice Aggio. Alguns dos outros doleiros investigados são Fayed Traboutsi, de Brasília, e Alberto Youssef, de Curitiba.
Celso Três
As investigações começaram, de acordo com a revista, com o promotor Celso Três, que mapeou todas as contas CC-5 do Brasil – contas que permitem remessas para o exterior, sem que se declare a finalidade. Podem ser usadas por pessoas que têm familiares, despesas ou investimentos no exterior. Mesmo podendo ser legais, as CC-5 são em sua maioria criadas em nomes de laranjas de Foz do Iguaçu – como as que abasteceram a Conta Tucano.
Gerentes de agência apoiaram irregularidades
A reportagem cita os nomes de vários “laranjas” que emprestaram os seus números de CPF aos doleiros acusados de enviar ilegalmente cerca de US$ 30 bilhões para fora do País desde 1996 e denuncia que gerentes da agência do Banestado de Foz do Iguaçu eram coniventes com as irregularidades. Isto porque as fichas cadastrais dos “laranjas” – geralmente, pessoas humildes, que desconheciam os valores movimentados nas contas – eram previamente preenchidas, com dados de renda e patrimônio totalmente falsos.
Racha
Ainda de acordo com a reportagem da IstoÉ Dinheiro, as descobertas feitas pelo delegado José Francisco Castilho Neto e pelo perito Renato Barbosa provocaram uma crise na Polícia Federal. Mesmo tendo rastreado várias pistas da lavagem de US$ 30 bilhões, após passarem algumas semanas em Nova York, a reportagem conta que os dois foram afastados do caso pelo diretor-geral da corporação, delegado Paulo Lacerda.
Mas eles, de acordo com a revista, continuaram envolvidos no caso Banestado porque se juntaram a uma força-tarefa criada pelo procurador Luiz Francisco de Souza. Os três têm sido os principais investigadores atuantes no processo e pretendem colaborar ativamente com a CPI no Congresso. Outra pessoa importante nas investigações foi a Secretária Nacional de Justiça, Cláudia Chagas, que também esteve em Nova York recolhendo informações.
Na disputa com Lacerda, a IstoÉ Dinheiro informa que o delegado Castilho ganhou o apoio de grande parte da corporação. O presidente da Federação Nacional dos Policiais Federais, Francisco Garisto, deu entrevista à reportagem condenando o afastamento e os processos disciplinares contra os investigadores. “Eles são profissionais idôneos, daqueles sem mácula no prontuário, e têm total apoio dos policiais federais”, disse.
