Uma conta no banco UBS AG, nos Estados Unidos, em nome da offshore MJP International Group, e outra em nome da offshore Farallon Investing Ltd., podem ter sido a origem de pagamentos de propina feitos pelo lobista Milton Pawscowitch – preso na quinta-feira, 21, na 13ª etapa da Operação Lava Jato – em contratos da Diretoria de Serviços da Petrobras, área que era cota do PT no esquema de cartel e corrupção na estatal.

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As pistas sobre o caminho do dinheiro foram entregues a investigações da Lava Jato, no início do ano, pelo ex-gerente de Engenharia da Petrobras Pedro Barusco. Em acordo de delação premiada – em que confessou os crimes e entregou novos fatos e provas em troca de redução de pena -, ele apresentou os nomes das empresas que abriu no exterior (offshores), as contas e os depósitos, com identificação de origem, feitos por Pascowitch e outros lobistas no esquema de corrupção na diretoria.

Braço direito e contador informal da propina paga ao ex-diretor de Serviços Renato Duque, Barusco diz que o dinheiro da propina era dividido, na maioria das vezes, em duas partes dentro da Petrobras: uma para a Casa (Duque e Barusco) e outra para o PT. O ex-tesoureiro João Vaccari Neto, segundo o ex-gerente e delator, era operado pela arrecadação em nome do partido.

“Barusco revelou que Milton Pascowitch, para operacionalizar o fluxo das vantagens indevidas, efetuou transferências a partir da offshore MJP Internacional Group, no Banco UBS AG, no Estados Unidos para a conta da offshore Aquarius Partners Inc, mantida por Barusco no Banco Pictet & Cie”, informa a força-tarefa da Lava Jato. “Igualmente, efetuou depósitos por intermédio de contas da offshore Farallon Investing Ltd. para a offshore Natiras Investiments Inc., de Barusco.”

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No dia 31 de janeiro de 2014, por exemplo, há um depósito identificado da MJP International (de Pascowitch) na conta da Aquarius (de Barusco), no valor de US$ 260 mil. No dia 18 de julho de 2013, outro pagamento foi identificado da offshore Farallon, de US$ 250 mil, para a Natiras. Barusco diz que os dois pagamentos são de Pascowitch para contas controladas por ele no exterior, por onde movimentava o dinheiro recebido da corrupção na Petrobras.

A Lava Jato desbaratou, a partir de março de 2014, o maior escândalo de corrupção na Petrobras. Por meio de diretores indicados politicamente pelo PT, PMDB e PP, era adotada uma regra sistemática de cobranças de propina em contratos bilionários, que variavam de 1% a 5% do valor total. Em conluio com pelo menos 16 empresas que teriam se organizado em cartel, as obras e serviços da estatal passaram a ser fatiadas a partir de 2004, afastando concorrência. O valor de propina até agora descoberto é de R$ 6 bilhões.

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Em decisão que determinou a prisão preventiva de Pascowitch, nesta quinta-feira, 21, o juiz federal Sérgio Moro – que conduz os processos da Lava Jato em primeira instância – registrou a descoberta das contas a partir dos dados e documentos fornecidos por Barusco.

“Pedro Barusco ainda revelou que, para o pagamento de propina, Milton Pascowitch teria utilizado contas offshore no exterior, especificamente a conta da offshore MJP International Group e a conta da offshore Farallon Investing Ltd., para, respectivamente, promover transferências para a conta offshore Aquarius Partners Inc, mantida no Banco Pictet, em Genebra/Suíça, e para a conta offshore Natiras Investments Inc, mantida no Banco Cramer, em Lugano/Suíça, ambas controladas por Pedro Barusco.”

Barusco foi o ponto de partida da descoberta de Pascowitch, como operador de propinas em nome da Engevix, com ligações diretas com figurões do PT, como o ex-ministro da Casa Civil José Dirceu (ex-presidente do partido, condenado no mensalão).

Elos do PT

A força-tarefa da Lava Jato vai triar o caminho desse dinheiro para buscar no detalhamento dessas operações bancárias em contas no exterior e em paraísos fiscais para tentar chegar a mais documentos do possível envolvimento de medalhões do PT, como Dirceu, no esquema de corrupção da Petrobras.

Dirceu recebeu ao todo R$ 2,6 milhões, diretamente da Engevix e por intermédio da Jamp Engenheiros Associados (empresa de Pascowitch que seria usada para intermediar propinas), entre 2008 e 2012. Os pagamentos foram feitos para a JD Assessoria e Consultoria, que ele abriu e passou a atuar após deixar o cargo de ministro, em 2005.

Só a Jamp pagou R$ 1,45 milhão para a assessoria de Dirceu, entre 2011 e 2012. A maior parte foi no segundo ano, quando estava sendo julgado pelo Supremo Tribunal Federal (STF), como um dos mentores do mensalão. Para o juiz da Lava Jato, o fato coloca os serviços prestados sob suspeita. Dirceu e a JD são alvos de inquérito. A suspeita é que as consultorias foram forma de ocultar recebimento de propina.

“A empresa Jamp tem envolvimento com pagamentos com lobby segundo o próprio Gerson Almada (ex-vice-presidente da Engevix) junto ao Partido dos Trabalhadores e junto a Diretoria de Serviços da Petrobras”, afirmou o procurador Carlos Fernando Lima, um dos integrantes da força-tarefa da Lava Jato.

“A única ligação que encontramos entre Pascowitch e o Partido dos Trabalhadores, nesse momento, é a pessoa de José Dirceu através da JD. Mas não excluímos outras investigações”, acrescentou o procurador.

A força-tarefa da Lava Jato tem os elementos, mas busca mais provas, de quem eram os beneficiários nesses pagamentos que Almada ligou ao PT. A Jamp era uma empresa de fachada de Pascowitch usada para esquentar o dinheiro da propina, sustentam os investigadores. Para os procuradores, não há aparente relação justificável para a relação comercial formal entre a empresa e a JD, de Dirceu.

No depoimento que prestou no dia 18 de março à Justiça Federa, Gérson de Mello Almada (sócio da Engevix) confessou ter pago por serviços de “lobby” o operador de propina, como forma de garantir seus contratos na Petrobras. Pascowitch seria um abridor de portas na estatal, graças aos seus contatos com membros do PT. A empreiteira pagou ainda, diretamente à JD, R$ 1,2 milhão.

O que chamou a atenção dos investigadores foi que Almada admitiu ter contrato as consultorias internacionais da JD, para abrir mercado em Cuba e no Peru, mas diz desconhecer a relação comercial entre Jamp e a empresa do ex-ministro – conforme justificou Dirceu em nota oficial à imprensa, um dia depois. Foram encontradas incompatibilidades entre valores declarados pelos serviços diretos à Engevix e documentos encontrados.

Defesa

O advogado criminal Theo Dias, que defende Milton Pascowitch disse que não vê a presença dos requisitos necessários para o decreto de prisão preventiva de seu cliente.

“Ele (Pascowitch) já prestou depoimento recentemente, houve busca e apreensão na residência dele, houve até sua condução coercitiva, em fevereiro. Desde então, o cenário não mudou. Ele continua no mesmo endereço, suas atividades todas estão paradas.”

Dias ressalta que, há cerca de três meses, o juiz federal Sérgio Moro indeferiu um primeiro pedido de prisão preventiva de seu cliente. “Não vejo nenhuma mudança de fevereiro para cá que justifique agora a ordem de prisão.”

O advogado assinala: “Ainda que o Ministério Público Federal entenda que tenha provas de envolvimento de Pascowitch em atividades ilícitas isso não é suficiente para a prisão preventiva. Não havia risco de fuga, ameaça à testemunha. O que me surpreende é um decreto de prisão sem nada que autorize tal medida, a não ser a metodologia de prender para forçar as pessoas a falarem.”

Theo Dias reitera que estava cumprindo os pedidos de informação da Procuradoria da República. “A instrução estava correndo sem nenhum tipo de obstrução, uma atitude cooperativa que não condiz com a ideia de uma prisão preventiva.”

A defesa de Renato Duque – preso preventivamente desde março, em Curitiba – também alega a inocência do cliente e aponta a falta de necessidade de manutenção da detenção.

Nos pedidos feitos até agora, pela revogação da prisão, foram negados pelas cortes superiores.

José Dirceu informou que o contrato com a Jamp “teve o objetivo de prospecção de negócios para a Engevix no exterior, sobretudo no mercado peruano”.

Em nota divulgada por sua assessoria de imprensa, o ex-ministro destaca que o contrato com a Jamp foi assinado em março de 2011 e não tem qualquer vínculo com o universo de negócios da Petrobras. “O ex-ministro refuta qualquer relação do seu trabalho de consultoria com contratos da construtora (Engevix) com a Petrobras”, diz o texto.

Dirceu rechaça as suspeitas de propina e serviços não prestados. Segundo sua assessoria, no período da prestação de serviços da JD Assessoria e Consultoria à Engevix e à Jamp “a construtora atuou em estudos para construção de hidrelétrica, projetos de irrigação e linhas ferroviárias no Peru”.

O ex-ministro ressalta que durante a vigência do contrato com a Jamp chegou a viajar a Lima para tratar de interesses da Engevix, “fato também confirmado pelo ex-vice-presidente da construtora Gerson Almada”. A assessoria do ex-ministro anota, ainda, que em seu depoimento à Justiça, Almada afirmou que nunca falou com Dirceu sobre a Petrobras.