A Comissão Nacional da Verdade, que investiga crimes da repressão política durante a ditadura militar (1964-1985), montará uma equipe de peritos internacionais antes de pedir a exumação do corpo do ex-presidente João Goulart, que morreu em 1976 em episódio cercado de suspeitas de assassinato. A estratégia foi acertada nesta quarta-feira pela ministra dos Direitos Humanos, Maria do Rosário, e pela advogada Rosa Cardoso, em reunião na Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) – seccional Rio, com participação do presidente da Comissão dos Mortos e Desaparecidos Políticos, Marco Barbosa. O encontro ocorreu antes da posse dos membros da Comissão Estadual da Verdade do Rio.

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“Fizemos uma reunião hoje (nesta quarta-feira) para definir uma série de contatos que temos de fazer com esses peritos, que são de países diferentes. São da Argentina, do Uruguai. ..Há previsão até de um perito russo porque a Rússia é um país que tem perícias muito desenvolvidas. Então, vamos ter de nos organizar para um encontro para depois poder definir uma data para a perícia”, afirmou Rosa.

“Só quem não veio hoje, porque houve um problema, foi a família Goulart. Ainda precisamos conversar porque eles têm a legitimidade, como família, para pedir ao Estado brasileiro essa diligência.” Quem representa a família nas conversas é João Vicente, filho do ex-presidente. A exumação terá de ser requerida à Justiça em São Borja (RS), onde o ex-presidente foi sepultado.

Jango, como o ex-presidente (1961-1964) era conhecido, era do PTB e foi deposto pelo golpe militar de 31 de março de 1964. Morreu em 6 de setembro de 1976, oficialmente de um ataque cardíaco. Mais recentemente, porém, foram levantadas suspeitas de envenenamento, supostamente numa ação da Operação Condor, colaboração entre órgãos de repressão das ditaduras sul-americanas nos anos 70 e 80.

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Um ex-agente da polícia política uruguaia, Mario Neira Barreiro, afirmou que o ex-presidente brasileiro teve envenenada sua caixa de remédios para problemas do coração, o que o teria matado. Em 2010, o historiador Luiz Alberto Moniz Bandeira, porém, depois de investigar o caso por dois anos, descartou o assassinato como hipótese para a morte de Jango.

Rio

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Na posse da Comissão da Verdade do Rio, seu presidente, Wadih Damous, anunciou que os primeiros casos a ser investigados serão os das bombas na OAB, em 1976, e do Riocentro, em 1981, episódios que, segundo ele, são ligados. “Os perpetradores serão ouvidos. Serão chamados, de acordo com os casos, a prestar depoimento”, declarou. Na solenidade, alguns se comoveram com o depoimento de Ana Lucia Paiva, filha do ex-deputado e desaparecido Rubens Paiva. Ela contou que, após a prisão do pai, sofreu isolamento na escola.

“A senhora que foi presa trazendo cartas do Chile para meu pai era minha professora. A filha dela era minha colega de classe. Durante seis meses, depois da prisão, sentamos uma do lado da outra, mas não podíamos falar daquilo. Os outros pais proibiram que as outras crianças se aproximassem de mim porque tinha medo de serem presos”, contou. Ela também relatou que, estudante na USP, em 1977, foi presa com colegas e passou uma noite inteira sendo interrogada com arma na cabeça, no Deops. “Queriam que eu dissesse onde estava minha irmã Veroca, que era líder estudantil. Diziam: já não basta o que aconteceu com seu pai?”