A Comissão Nacional da Verdade, em seu relatório final, vai recomendar ao governo mudanças na estrutura das forças policiais militares dos Estados. O objetivo é torná-las menos militarizadas e mais adaptadas ao regime democrático e ao exercício da cidadania.
O assunto já vinha sendo analisado internamente pela comissão. Mas ganhou destaque nos últimos dias, com os relatos de violência cometidos por policiais militares contra manifestantes que foram às ruas em diferentes partes do País.
“Esse tema vai aparecer, certamente, no capítulo das recomendações finais da comissão”, disse à reportagem a coordenadora da comissão, a advogada Rosa Maria Cardoso da Cunha. Segundo ela, a adaptação de forças policiais e militares tem sido um tema constante nos debates sobre a transição de regimes autoritários para a democracia. “Outras comissões já se pronunciaram sobre democratização das forças armadas e das polícias.”
De acordo com a coordenadora, o Brasil debate a questão desde o fim da ditadura militar, há quase três décadas, mas não registra avanços importantes na prática. “O debate é bom, mas as propostas não conseguem ser implementadas”, disse ela. “Os governos, em algum momento, cedem à tentação autoritária. É mais fácil mandar baixar o pau.”
Entre os Estados que já tentaram conduzir mudanças, ela lembrou o Rio de Janeiro e São Paulo. “Toda essa discussão sobre modernização das polícias começou no início da década de 1990, no Rio, quando a Secretaria de Justiça era chefiada por Nilo Batista, no governo de Leonel Brizola”, disse. “Preocupado com a formação de uma polícia cidadã, ele pôs vários cursos à disposição dos policiais na Universidade Estadual do Rio de Janeiro.”
Em São Paulo, segundo suas informações, a iniciativa mais importante ocorreu no governo de Mário Covas (1995-2000) e foi conduzida pelo então titular da Secretaria de Justiça e Cidadania, Belisário dos Santos Júnior. O governo federal também deu alguns passos nessa direção, segundo Rosa Maria.
Ao falar sobre o assunto, ela usa frequentemente expressões como modernização, educação, civilização e democratização das policias militares dos Estados. Sem essas mudanças, acredita, o País vai caminhar para um impasse, no qual os policiais militares tendem a parecer cada vez mais inadequados e despreparados frente a manifestações democráticas.
“Até aqui o direito de manifestação ainda se mostra como um direito superior. Os governantes estão fazendo críticas ao comportamento autoritário, hostil e até letal da polícia”, disse. “Mas é importante que isso seja mantido em situações mais extremas.”
O primeiro passo para a democratização das polícias militares e das Forças Armadas, segundo a advogada, é a modernização dos currículos das escolas de formação. Outra iniciativa seria ampliar o acesso dos policias a universidades públicas.
As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.