O governador Roberto Requião (PMDB) entra no seu último ano de mandato sem cumprir uma das principais promessas que contribuiu para que fosse eleito em 2002: o pedágio não abaixou e muito menos acabou no Paraná. E a opinião das próprias pedageiras mostra que a única que coisa que faltou para que se discutisse a redução da tarifa foi vontade política. Só no ano passado, as seis concessionárias do Anel de Integração devem ter arrecadado mais de R$ 1 bilhão com a cobrança do pedágio no Estado. Dados consolidados pela Associação Brasileira de Concessionárias de Rodovias (ABCR) mostram que, só no primeiro semestre de 2009, a receita foi de R$ 532,7 milhões, dos quais R$ 13 milhões foram de lucro.
O aumento do pedágio, desde que foi implantado no Paraná, em 1998, foi de 180,83%, de acordo com o Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese). Em junho de 2008, primeiro ano de cobrança do pedágio, o preço médio praticado nas praças era de R$ 3,22, passando para os atuais R$ 9,03, em média. O maior aumento foi na tarifa da concessionária Ecovia, no trecho da BR-277 que liga Curitiba a Paranaguá, na qual a tarifa saltou dos iniciais R$ 3,80 para os hoje R$ 12,70, aumento de 234,21%. Em comparação, a inflação (IPCA) acumulada no período de junho de 1998 a novembro de 2009 foi de 104,92%. Somente durante o governo Requião, o preço médio do pedágio aumentou 80%, passando de R$ 5 para R$ 9,03. Na praça da Ecovia, o preço mais que dobrou, de R$ 6,10 para os R$ 12,70 de hoje.
Extinguir a cobrança é uma tarefa praticamente impossível, já que não há como romper com os contratos feitos com as concessionárias ainda durante a gestão de Jaime Lerner, que foi quando a composição tarifa básica foi estabelecida. Mas a própria ABCR admite que a tarifa poderia ser menor, se representantes do governo estadual sentassem para renegociar os contratos. E isso nunca foi feito, nos últimos sete anos, obrigando as concessionárias a apelarem para a Justiça para garantir o reajuste anual da tarifa cobrada e todas as ações, até agora, foram ganhas pelas concessionárias. Há, ainda, 56 ações em andamento questionando o preço, movidas pelo governo do Estado.
Para o diretor-regional da ABCR no Paraná, João Chiminazzo Neto, essa atitude é uma demonstração de que o pedágio sempre foi usado apenas como arma política. “Em nenhum outro lugar do Brasil você vê o uso político do pedágio, enquanto aqui há uma verdadeira guerra contra as concessionárias, desde 2003”, compara Chiminazzo.
Caso houvesse acordo entre as partes envolvidas, a implantação de mais praças de pedágio ao longo do trecho pedagiado, realocação de algumas praças ou aumentar o tempo de contrato poderiam levar à redução do preço do pedágio. “Mas para isso é preciso disposição e boa vontade. Se o governo quiser renegociar, nós somos obrigados a fazer isso”, diz o representante da ABCR.
A falta de uma agência reguladora para o setor lei que já foi sancionada no governo anterior, em 2002, mas que nunca chegou a ser constituída, por falta de interesse político contribui para que haja esse desequilíbrio econômico. Isso interfere no preço pago hoje, uma vez que a cada ano o contrato deveria ser revisto, para aparar possíveis desequilíbrios financeiros, seja lucro acima do normal ou prejuízos não projetados.
A responsabilidade do Estado em não gerir o contrato como deveria também é criticado pelo presidente do Sindicato dos Engenheiros do Paraná (Senge-PR), Valter Fanini. “O processo de concessão do serviço público pressupõe uma ação muito presente do Estado para gerir os contratos. E o Estado não se aparelhou, deixando as empresas livres para exercitarem o contrato da maneira como melhor lhes conviesse”, opina.
Segundo Fanini, a inexistência de um corpo técnico por meio da agência reguladora para gerenciar o contrato, é crucial para a tarifa que hoje não é ,considerada justa pelos motoristas. “O valor, que seria o justo, sequer foi calculado pelo Departamento de Estradas de Rodagem (DER), que é o responsável por propor um reajuste anual. Como o governo não apresenta elementos técnicos na Justiça, não há contestação e todos os juízes acabam fazendo valer os contratos”, explica.
Tudo mudou. Menos os contratos
O lucro das concessionárias do Paraná está na casa dos 20%, enquanto no pedágio federal esse valor é perto de 8%, de acordo com o DER. Qualquer negociação a respeito do pedágio passa por uma profunda revisão dos contratos, inclusive com a modificação da Taxa Interna de Retorno (TIR), o que reflete o lucro das empresas, segundo o DER. “Contratos longos como esse do pedágio, de 24 anos, não podem ter elementos fixos. A conjuntura econômica muda, como na verdade, mudou. A TIR hoje deveria ser muito mais baixa e isso implica diretamente na tarifa”, informa o órgão estadual.
O DER não cogita aumentar o número de praças de pedágio ou prorrogar os contratos, sugestões das concessionárias para se estudar uma possível redução da tarifa. Em resposta por e-mail aos questionamentos da reportagem de O Estado, a assessoria de imprensa do DER informa que essas possibilidades não interessam, por irem contra o interesse público. De acordo com os números do DER, até o fim do ano passado, as concessionárias já haviam arrecadado cerca de R$ 9 bilhões para cuidar de 2,5 mil quilômetros de rodovias. Para o governo estadual, não há equação econômica que justifique os preços hoje praticados. “Está comprovado nos próprios balanços das concessionárias: cinco das seis empresas que atuam no Paraná começaram a distribuir lucro aos acionistas antes do previsto pelo contrato. Hoje, todas já estão operando no azul”, diz o DER.
Cálculos do DER mostram que apenas 30 % do que é pago no pedágio é revertido em obras e melhorias na pista. Baseando-se nesses cálculos, o governo do Paraná cobra na Justiça que as empresas devolvam os valores excedentes arrecadados desde 1998, muito acima do estabelecido nos contratos. Sobre a implantação da agência reguladora, o DER acredita que, além de burocrático, o sistema retira o papel fiscalizador do governo e do próprio DER. Há dois anos, o líder do governo na Assembleia Legislativa, Luiz Claudio Romanelli (PMDB), passou por praças de pedágio sem pagar, burlando a cobrança num ato que considerou de desobediência civil para protestar contra as altas tarifas. Na ocasião, o governo informou que a Secretaria de Direito Econômico (SDE) do Ministério da Justiça investigava a margem de lucro das empresas. O resultado, no entanto, nunca foi divulgado e a SDE informou esta semana à reportagem que a investigação não consta no órgão. (LC)