O fogo cruzado nas redes sociais no segundo turno da eleição deixou evidente o poder do ativismo político digital neste momento do País. Jair Bolsonaro (PSL) foi o representante mais bem-sucedido deste tipo de engajamento. Bolsonaro chega à Presidência da República após quebrar tabus e romper paradigmas consagrados pelo marketing eleitoral das últimas disputas.
Superou o pouco tempo de TV no primeiro turno (apenas oito segundos), a união com um só partido (PRTB, do vice, general Hamilton Mourão) e uma campanha com poucos recursos financeiros. Após o atentado sofrido em Juiz de Fora (MG), fez a campanha de dentro de casa.
“Bolsonaro se tornou nas redes um produto discursivo. Um case interessante justamente pela sequência de fatores que foram dando certo sem parecer planejada. Ele ocupou o vácuo de representação deixado pelo PT, aproveitou a onda de conservadorismo, foi impulsionado pela tecnologia e se consolidou como um personagem sem ser um objeto de uma construção política, mas sim de um discurso”, avalia o cientista político Kleber Carrilho, da Universidade Metodista de São Paulo.
Para Carrilho, a ascensão de Bolsonaro põe em xeque a efetividade da propaganda eleitoral. “Os adversários achavam que quando começasse o horário eleitoral na TV, no primeiro turno ainda, o cenário mudaria. Mas as redes sociais deram conta de um eleitorado que descobria seu poder de participação. Mesmo sem experiência, sem formação política e às vezes sem leitura crítica das coisas, esses eleitores quiseram interagir e Bolsonaro foi quem conseguiu o maior sucesso com isso.”
A facada que impossibilitou a campanha nas ruas não foi a razão pela qual Bolsonaro investiu em sua presença nas redes. À semelhança do que Donald Trump fez nos EUA antes de se oficializar presidenciável, Bolsonaro e seus apoiadores adotaram as redes como ferramenta para a construção de sua imagem e expansão de suas ideias.
Discursos acalorados e o tom por vezes irônico atraíram adeptos que, munidos de aplicativos como o WhatsApp, passaram a replicar com rapidez as ideias do candidato – sob suspeita de disseminação paga de conteúdo atacando adversários e da possível disseminação de notícias falsas.
“No caso do Brasil, estão usando redes privadas, como o WhatsApp. É uma rede que apresenta muitas complexidades para que as autoridades possam acessar e realizar investigações”, disse a chefe da missão de observação eleitoral da Organização dos Estados Americanos (OEA) no Brasil, Laura Chinchilla.
Questão de timing. Para chegar ao poder, o novo presidente do Brasil surfou na onda contra a corrupção, na onda de um governo de “autoridade” (que privilegie a ordem e garanta a segurança pública), mas nenhuma tão fundamental quanto a onda antipetista, de acordo com a coordenadora do curso de extensão em Marketing Político da PUC-SP, Vera Chaia.
“O que mais pesou foi ser contrário ao PT. Ele adotou o discurso de colocar Fernando Haddad como “poste” de Lula e se fortaleceu com isso”, analisa a cientista política. “Mas a campanha dele também soube aproveitar o momento do pensamento conservador, como ocorreu na Hungria, França, Itália e Estados Unidos. E as pessoas estão legitimando esse discurso.”
Apesar de ser deputado federal há 27 anos e de colocar três filhos na política, o novo presidente conseguiu vender a ideia de que é uma “novidade” em Brasília. “Ele só apareceu quando se envolveu em polêmicas, como aquelas com Maria do Rosário (PT-RS) e Jean Wyllys (PSOL-RJ), por exemplo. Pois fora isso, ele teve atuação pífia como deputado, sem significado nenhum. Por isso, não tinha visibilidade. Bolsonaro pôde vender a ideia de que era novidade porque a maior parte do eleitorado realmente não o conhecia.”
Anticorrupção. Carrilho diz que Bolsonaro adotou o discurso da negação da política e de ser contra a corrupção, mas não em atos. “Ele se mostrou viável do ponto de vista antipetista e honesto do ponto de vista anticorrupção. Mas não fez nada disso atendo-se a fatos, mas a palavras, discursos. Ganhou a confiança de parte da população por falar de formar diferente, como as coisas vêm à cabeça, e numa campanha pouco propositiva, mas efetiva de negação.”