No Brasil todo mundo tem foro privilegiado, de vereadores ao presidente da República. É o país em que isso mais acontece, tornando difícil a punição dos responsáveis pelos crimes conhecidos como ?do colarinho branco?. Assim afirma o procurador da República Celso Antônio Três, que está lançando amanhã o livro ?Teoria Geral do Delito Pelo Colarinho Branco?, na Assembléia Legislativa do Paraná.
Para ele, a prova mais definitiva de que há dificuldades em punir os responsáveis reside no fato de que em toda a história do Supremo Tribunal Federal, (STF), não existe um único caso denunciado em que Supremo tenha condenado um político com foro privilegiado e ele tenha cumprido a pena. ?Na alta cúpula dos políticos, você não acha nenhum?, afirma Três, que lembra também que o STF tem pouca estrutura para julgar crimes do colarinho branco no País. Segundo o procurador, o Ministério Público precisa, muitas vezes, driblar o foro privilegiado, como no episódio das ?Ambulâncias?, em que parlamentares supostamente envolvidos não foram investigados, sendo as investigações feitas em cima dos assessores.
Na primeira parte de seu livro, o procurador explica o delito, os casos de foro privilegiado, seqüestro de bens ou de quebra de sigilo, entre outros tópicos. E na segunda, mostra as mais diversas modalidades em que pode ocorrer o crime. O livro pode ser acessado ou baixado no site www.crimesdocolarinhobranco.adv.br. Três, atualmente, é procurador da República em Tubarão e seu nome ficou conhecido da imprensa quando ele quebrou o sigilo bancário de todas as Contas CC-5 do País, o que possibilitou uma ampla investigação de um esquema de evasão de divisas e sonegação, envolvendo vários bancos, entre eles o Banestado.
Corrupção
A expressão ?colarinho branco? foi criada, lembra o procurador, pelos americanos e está relacionada à delitos perpetrados por indivíduos de alto escalão social. São delitos inteligentes que buscam grandes ganhos econômicos, através de lavagem e desvio de dinheiro, sonegação fiscal, crimes contra a ordem econômica e contra a previdência. Segundo ele, o mais em voga é a corrupção: ?Um sistema que enriquece gerações que se beneficiam do poder público?.
Três, busca em sua obra, formatar uma teoria sobre crimes do colarinho branco, trazendo o modus operandi dos criminosos, descrevendo os artifícios utilizados para livrar os sonegadores e para se tentar uma anistia. ?Esses delitos praticamente não deixam rastros. E quando deixam, são rastros facilmente destrutíveis?.
Três, afirma também que é uma característica da advocacia do colarinho branco exercer pressão sobre todos os órgãos do Estado brasileiro, a fim de se conseguir a absolvição dos acusados. ?Eles fazem muito lobby no Congresso Nacional, no Poder Executivo e também dentro do próprio Judiciário e do Ministério Público?, afirma.
O procurador aponta também o problema da anistia dos sonegadores fiscais, realizadas pela União. ?Governo após governo faz anistia. Lula concedeu a maior anistia de todos os tempos. Bastava que sonegadores parcelassem seus débitos que se salvavam dos processos?, diz.
Segundo Três, se a Convenção da ONU contra a Corrupção for checada item por item, irá se perceber que o Brasil já possui todas as leis previstas pela convenção. ?Nosso problema não é falta de lei. É falta de uma cultura de seriedade na administração pública. O caso das Ambulâncias e dos Sanguessugas é bem claro. A corrupção é generalizada?, afirma. Para ele, uma medida simples que permite perceber indícios de irregularidades é a análise do patrimônio de políticos. ?É uma medida mortal. Não há como enriquecer somente ocupando um cargo na política?.
O procurador afirma que é preciso que haja uma contracultura em prol da probidade no País, o que começa pela formação escolar. Para ele, a corrupção é uma questão conjuntural difícil de extirpar. E a impunidade dos ?crimes do colarinho branco? frente ao poder público, afirma Três, instala o descrédito e estimula o destemor aos criminosos. ?É o caso das ações do PCC em São Paulo, numa postura de enfrentamento ao poder do Estado?, diz.