BC foi informado de fraudes logo após desvios

Uma liminar concedida pela ministra Ellen Gracie Northfleet, do STF (Supremo Tribunal Federal), anteontem, em pedido formulado pelos advogados de Afonso Celso Braga e Afonso Celso Braga Filho, restabeleceu que os convocados pela Comissão Parlamentar Mista de Inquérito do Banestado, seja na condição de testemunha, seja na condição de indiciado, têm direito a serem orientados por seus advogados durante o depoimento.

Também não são mais obrigados a assinar termo de compromisso, podendo se recusar a responder às indagações sempre que isso puder, de alguma forma, incriminá-los. Segundo o advogado Renato Andrade, que moveu a ação, os advogados voltam a ter participação ativa no processo, conforme estabelece preceito constitucional brasileiro.

O relator da CPMI, deputado José Mentor (PT-SP), reconheceu que se trata do exercício de um direito constitucional e afirmou que isso não irá prejudicar os trabalhos da Comissão. Segundo ele, o direito invocado pelo habeas corpus terá que ser reclamado por cada um dos convocados.

Dos convocados para depor ontem, no plenarinho da Assembléia Legislativa, em Curitiba, não compareceram um dos sócios da off-shore Magna, Carlos Alberto Klein, dado como foragido pela Polícia Federal, e os empresários Afonso Celso Braga e Afonso Celso Braga Filho. O primeiro, segundo o advogado Daniel Godoy, por motivo de saúde, conforme atestado fornecido pelo Hospital Santa Cruz, e o segundo, porque estava viajando e alega que só recebeu a intimação na véspera. A CPI concordou com o adiamento da convocação, mas advertiu que já é a terceira. Se deixarem de comparecer na próxima, a comissão vai requerer que sejam conduzidos sob vara, como aconteceu com os dois primeiros depoentes de ontem, o ex-gerente da casa de câmbio Elcatur, Valdir Werle, e o ex-funcionário do Banco Central, George Panteliades.

O depoimento de Werle foi à portas fechadas. O de Panteliades foi aberto e ele foi confrontado com gravação de conversa telefônica, com autorização judicial, onde os supostos interlocutores são ele e a diretora de câmbio do banco Araucária, Ruth Whately Bandeira. Acompanhado pelo advogado, Panteliades primeiro afirmou não reconher as vozes na gravação; quando o relator insistiu, recorreu ao direito de se manter em silêncio. Além do deputado José Mentor, participaram da audiência pública em Curitiba os deputados Paulo Bernardo (PT), Irini Lopes (PT-ES), Eduardo Sciarra (PFL) e Clair Martins (PT).

Banco percebeu irregularidades em 97

George Panteliades chefiou a área internacional do Banco Central em Curitiba no período de 15 de março de 1995 a 15 de setembro de 1997, quando se licenciou para tratar de assuntos pessoais. Retornou em outro posto, mas voltou a afastar-se através de licença sem remuneração. Ele relatou aos deputados que a regional do BC começou a perceber irregularidades nas autorizações especiais três meses depois que a circular 2677 entrou em vigor, em abril de 1996. Uma equipe, composta por ele, Anelore Virva, Inez Zavatski e Antonio Jorge Mello Viana, todos funcionários do banco, se deslocou para Foz do Iguaçu, para verificar in loco como as operações estavam sendo realizadas.

Detectaram na tesouraria do Banco do Brasil vultosos saques feitos pela manhã, em espécie e contas de correntistas, e o processo inverso no período da tarde. Também verificaram operações de empréstimos entre o Banco do Brasil e seu braço internacional – Bamb – nas Ilhas Caimã, sem o recolhimento do IOF. Segundo ele, na Ponte da Amizade de oito a dez caminhões fortes passavam diariamente, transportando moeda do Paraguai para o Brasil. Conforme as normas vigentes então, esses caminhões não poderiam transportar mais do que R$ 1 milhão, por questão de segurança. Os documentos de porte de moeda não eram entregues no posto da Receita Federal na Ponte, e sim posteriormente, no escritõrio do órgão, em Foz do Iguaçu. A alegação para o procedimento era sempre segurança. Seria inviável fazer a contagem dos valores no posto de fronteira.

Tudo isso, segundo Panteliádes, foi relatado à direção do Banco Central, em Brasília, através de sucessivos memorandos trocados entre as duas instâncias do banco. Relatórios apontando inclusive o uso de “laranjas” foram feitos, o primeiro deles em agosto de 1996, e entregues à Diretoria de Câmbio do Bacen. Geraram reuniões entre o Bacen e o Banco do Brasil e algumas providências, como a determinação de que os procedimentos sob suspeita passassem por investigações mais aprofundadas.

Governo conhecia operações

O atual presidente do banco paraguaio Integracion, Elias Lipatin Furmam, também depôs ontem à CPI do Banestado. Representante da off-shore Fidelity, controladora do banco, ele destacou que o transporte de moeda na fronteira era obrigatoriamente comunicado ao banco central paraguaio, que não conferia os valores, e gerava uma guia de controle. O banco central brasileiro também tinha total conhecimento das operações.

Os valores movimentados na época, embora muito altos, eram, segundo Lipatin, compatíveis com o intenso comércio da fronteira, um dos três mais importantes do mundo. Seu auge aconteceu no período da paridade dólar-real, quando chegou a registrar até US$ 50 milhões diários. Ele explicou que as operações de câmbio tinham nota fiscal e que as relações do Integración com o banco Araucária eram de correspondência, referendadas pelo Banco Central. Em menor escala, o banco paraguaio operava também com o Bemge.

Confirmou que a controladora do Integración é a off-shore Abbaco, e que o representante da Magna, uma das off-shore que integram a Abbaco, é Plutarco Cohen. A outra é a Fidelity. As empresas têm suas sedes nas Ilhas Cook e Virgem.

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