Eles não têm o tamanho do PT nem do PMDB, as duas maiores bancadas da Câmara, mas juntos têm força para pôr o governo contra a parede. Formada por um grupo de deputados descontentes de partidos aliados, principalmente do PR, PTB, PP e PSC, a “bancada gelatina” conta com a adesão de cerca de 80 parlamentares da Câmara. São deputados que estudam as conveniências do Planalto nas votações e têm como lema “vender dificuldades para colher facilidades”.
Foi assim, na semana retrasada, na aprovação do convite do policial João Dias Ferreira e do motorista Célio Soares Pereira, que denunciaram o esquema de desvio de verbas no Ministério do Esporte, pela Comissão de Fiscalização e Controle Câmara. Mesmo depois de o Planalto ter deixado claro que não queria o depoimento de nenhum dos dois no Congresso, o presidente da Comissão, deputado Sérgio Brito (PSC-BA), uniu-se à oposição e aprovou a toque de caixa o convite – na semana passada, com a queda do ministro Orlando Silva, os depoimentos na Câmara foram cancelados.
No mesmo dia da aprovação dos convites, o PSC atrapalhou novamente os planos do presidente da Câmara, deputado Marco Maia (PT-RS), de aprovar sem alterações o projeto de lei que tipifica como crime sujeito a reclusão de um a quatro anos condutas que discriminam portadores do vírus HIV. Apesar dos apelos do petista, o PSC – com a ajuda de um punhado de deputados ligados a igrejas evangélicas – mudou a proposta, que teve de voltar para nova apreciação do Senado, sem ir à sanção da presidente Dilma Rousseff.
A modificação foi apresentada pelo deputado Edmar Arruda (PSC-PR), que conseguiu retirar do texto a punição para os patrões que demitirem funcionários portadores do vírus HIV. “Esse dispositivo vai provocar uma indústria de ações trabalhistas. Não podemos imputar essa responsabilidade aos empregadores”, justificou Arruda, ao defender a retirada da penalização.
Caso Garotinho
Nas eleições de 2010, o PSC foi um dos últimos a aderir à candidatura da petista Dilma Rousseff. Inicialmente, o partido pretendia apoiar José Serra (PSDB), mas acabou mudando de lado. Ao lado de quase duas dezenas de partidos, o PSC é um dos integrantes da folgada base de apoio do governo na Câmara, que conta quase 400 dos 513 deputados federais. Por isso, mesmo impondo algumas derrotas ao Planalto, a “bancada gelatina” não chega a incomodar os aliados do governo.
“O governo tem uma base consistente na Câmara. Não são eles que dão o tom. O governo não pode reclamar de sua vida”, diz o líder do PT, deputado Paulo Teixeira (SP).
Um dos ícones desse grupo é o ex-governador Anthony Garotinho (PR-RJ). Deputado federal de primeiro mandato, ele se move na Câmara de olho na política regional e não mede esforços para atrapalhar o governo federal. Foi assim há pouco mais de um mês quando, junto com a bancada do PR, impediu que fossem votadas propostas previamente acordadas em sessões da Câmara e do Congresso.
A barganha de Garotinho foi explícita: emperrar as votações enquanto não fosse apreciado projeto que concedeu anistia para os policiais militares do Rio. A pauta só andou depois de aprovada a proposta de interesse do ex-governador fluminense.
Na semana passada, Garotinho voltou à carga. Adversário do governador carioca, Sérgio Cabral (PMDB), o deputado derrubou uma sessão do Congresso em represália à demora do envio pelo Ministério da Defesa de informações sobre voos feitos pelo seu desafeto político. Garotinho tem sucesso nas suas empreitadas porque essas sessões contam geralmente com poucos parlamentares presentes e as votações são feitas simbolicamente e por acordo. É aí que o deputado entra: pede verificação de quórum, derrubando a sessão e, concomitantemente, os planos do governo.
Com a oposição
A “bancada gelatina” acaba, muitas vezes, ajudando a oposição não só nas votações como também na obtenção de assinaturas para abertura de uma Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) ou até mesmo na apresentação de emendas para tentar alterar substancialmente propostas de interesse do governo. Foi com a ajuda desse grupo, por exemplo, que os oposicionistas conseguiram assinaturas suficientes para apresentar emendas à proposta de Desvinculação das Receitas da União (DRU).
Mesmo sabendo que tem poucas chances de ver uma de suas propostas aprovadas, a oposição aproveita a insatisfação do grupo com o governo pelo atraso no preenchimento de cargos de segundo e terceiro escalão e a não liberação de emendas de parlamentares ao Orçamento deste ano. Para os oposicionistas, o lema é tentar complicar ao máximo a vida do governo. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.