As panelas silenciaram. A temperatura das ruas baixou. Tudo parece ter voltado à velha normalidade. Mas, alto lá, não era contra a corrupção? Não haveria resistência contra aquilo que foi chamado de golpe? Onde estão “coxinhas” e “mortadelas”? Para onde foi todo mundo?

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No dia 13 março deste ano, a imprensa trombeteava “a maior manifestação da história do País”. Segundo estimativa da Polícia Militar, mais de 3 milhões de brasileiros foram às ruas para pedir a saída de Dilma Rousseff da Presidência da República. Dias depois, apoiadores de Dilma também tomaram as ruas e arregimentaram milhares de manifestantes Brasil afora, conforme a PM e organizadores.

Atos de abrangência nacional ocorreram até que o afastamento provisório de Dilma fosse votado, em 12 maio. Depois disso, um protesto contra o governo interino contou com atos em quase todas as capitais e levou muita gente à Avenida Paulista, mas a PM não divulgou o público presente. Desde então, só manifestações pontuais, aqui e acolá, nada muito retumbante. A promessa de incendiar o País acabou por não se concretizar. E, ao menos por enquanto, a luta contra a corrupção também se acanhou.

A jornalista Carla Louise, que esteve em diversas manifestações a favor do impeachment, confessa que o seu afã já não mais é o mesmo. “Eu sou uma que diminuí o ativismo depois que a Dilma foi afastada. Mesmo não confiando no Michel Temer, acho que ele tem feito algo pela economia. É ‘marotagem’ dizer que a corrupção acaba com a saída dela (Dilma), mas também é cedo demais para sair às ruas e derrubar ele (Temer).”

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Novos casos. Se Carla faz uma ponderação política do esvaziamento das ruas, outra manifestante aponta um certo desânimo do cidadão comum. “Acredito que as manifestações diminuíram porque todos os dias novos casos (de corrupção) são descobertos, apesar de a indignação continuar, a sensação é de que as manifestações foram em vão e que não mudou nada”, diz a administradora de empresa Cristine Andrade. Na mesma linha vai o empresário Carlos Eduardo Ado. “As manifestações perderam a força pela falta de esperança.”

A empresária e socialite Rosângela Lyra, presidente da Associação de Lojistas dos Jardins e ex-sogra do jogador de futebol Kaká, se destacou durante o período de maior efervescência política porque esteve dos dois lados do embate (contra e pró-governo). “Eu pulei fora das manifestações porque percebi que não era algo contra a corrupção, mas algo contra um partido específico. Agora, acho, a coisa perdeu força porque as pessoas estão tentando retomar suas vidas, estão preocupadas com os seus negócios e empregos.”

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Quando o afastamento temporário de Dilma foi confirmado pelo Senado, imaginava-se uma grande reação das forças que até então apoiavam a petista. As manifestações até foram realizadas, mas não conseguiram mobilizar tanta gente.

Erick Vinicius Borges, estudante de Ciência Sociais na Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP), foi a praticamente todas as manifestações. Se diz entristecido com o esfriamento da resistência. “Ver as pessoas estáticas me incomoda. Penso que os movimentos sociais tenham perdido fôlego e estão em uma fase de reavaliar posições. É muito difícil ser coeso, ter uma boa estratégia e saber o que é possível combater.”

Crítica. Com mestrado em Sociologia, Dimitri Pinheiro foi outro que esteve nas ruas em protestos contra o afastamento de Dilma. Ele considera o esvaziamento das manifestações de esquerda consequência da própria postura do PT. “Quando vou a uma manifestação e ouço Lula discursar, tenho a sensação de que existe um bode na sala e ninguém quer falar sobre ele”, diz. “Acho que o PT está pagando o preço por ter desmobilizado os movimentos sociais em seu governo.”

Grupos veem ‘rucuo estratégico’. Os movimentos de “Fica Temer” e “Fora Temer” escolheram o mesmo dia para voltar às ruas: 31 de julho. Os atos simultâneos servirão de termômetro para medir o humor do brasileiro em relação ao governo interino de Michel Temer. Para os grupos, a data é importante para mostrar “quem está do lado de quem”. Sobre a diminuição na participação popular nos últimos meses, líderes dos dois grupos consideraram um “movimento natural e estratégico”.

O coordenador do Movimento Brasil Livre (MBL), Fernando Holiday, disse que a queda do “calor” das ruas era esperado. “As pessoas tinham uma pauta que era o impeachment da Dilma, e consideram que isso já é fato consumado”, afirmou. “As pessoas precisam de mais tempo para assimilar as pautas propositivas, como o combate à corrupção e a privatização.”

Para a coordenadora da frente Povo Sem Medo, Janislei Albuquerque, a falta de fôlego dos movimentos “Fora Temer” foi um recuo estratégico. “Agora é o momento de visitar escola por escola, sindicato por sindicato e explicar para o cidadão o que está acontecendo.” Para Guilherme Boulos, coordenador do Movimento dos Trabalhadores Sem Teto (MTST), o grupo passou por uma reflexão e deve voltar com mais força. “As pessoas estão entendendo que o governo interino está atacando direitos básicos. Vamos intensificar os atos a partir de agora.”

Mobilização é contínua, diz especialista. A professora de Sociologia da Pontifícia Universidade Católica de Minas (PUC-MG) Isabelle de Melo Anchieta disse não acreditar no “esvaziamento dos movimentos de combate à corrupção”. Para ela, o brasileiro construiu a maior manifestação popular de sua história e está vivenciando um período de cidadania. “Desde 2013, as pessoas têm se manifestado contra a corrupção. É algo contínuo e sólido.”

Para o professor da Fundação Escola de Sociologia e Política de São Paulo (FESPSP) e cientista político Jairo Pimentel, o “Fora Dilma” tinha um apelo concreto e, depois do objetivo conquistado, houve “um esfriamento natural”. “Já o grupo pró-Dilma tem se concentrado em ações menos conectadas às ruas”, afirmou. As informações são do jornal O Estado de S.Paulo