Veterano da Segunda Guerra Mundial, considerado herói da Força Aérea Brasileira, símbolo de resistência nas Forças Armadas durante a ditadura militar, o major-brigadeiro do ar Rui Moreira Lima morreu na madrugada desta terça-feira, aos 94 anos, em consequência de um derrame. Ele estava internado no Hospital da Aeronáutica havia 47 dias.
O corpo foi enterrado nesta terça no cemitério São João Batista, no Rio. O velório foi no auditório do Instituto Histórico – Cultural da Aeronáutica (Incaer), cercado de admiradores de várias gerações. A FAB soltou nota que coloca Moreira Lima na condição de “mito grandioso, magnânimo, extraordinário”, um “guerreiro da nação” que será lembrado “indefinidamente”.
Moreira Lima conservou a lucidez e a boa memória até o fim da vida. Relatava fatos ocorridos há 60 anos com precisão. Em outubro do ano passado, deu depoimento à Comissão Nacional da Verdade. O relato foi o primeiro do grupo dedicado a ouvir militares perseguidos por seu posicionamento contra a ditadura e violações de direitos humanos sofridas.
Na ocasião, ele disse que os que tomaram o poder no País representavam uma minoria dentro das Forças Armadas. “Vários colegas foram presos, acusados de serem comunistas. Eu sempre fui um homem de pensamento livre”, afirmou.
Ele nasceu a 12 de junho de 1919 na pequena cidade de Colinas, no Maranhão. Entrou nas Forças Armadas aos 20 anos. Ingressou na FAB assim que a instituição foi criada, em 1941. Foi piloto de combate da esquadrilha verde no 1º Grupo de Aviação de Caça. Esteve em 94 missões na Itália entre novembro de 1944 e maio de 1945.
Na volta ao Brasil, tornou-se comandante da Base Aérea de Santa Cruz. Legalista, negou apoio ao golpe militar em 64 e foi retirado do posto. Acabou cassado e proibido de voar por 17 anos. Foi preso três vezes e aposentado compulsoriamente. A família também seria perseguida.
Em 1970, foi sequestrado pelo regime. Chegando à prisão, encontrou o filho, Pedro Luiz Moreira Lima, hoje guardião da memória do pai. Ele também havia sido levado pelos militares. “Quando eu precisava fazer necessidades, era vigiado por um soldado o tempo todo, apontando uma metralhadora”, relembrou o brigadeiro.
Em 1979, Moreira Lima fundou a Associação Democrática e Nacionalista dos Militares (Adnam), que briga pelos direitos de militares cassados durante a ditadura e pede a revisão da anistia para os que cometeram crimes. “No mundo inteiro, ninguém atura a covardia do torturador. É um bandido, um desgraçado, um covarde”, declarou numa entrevista. “A verdade tem que ser dita. Ela é feito a rolha, você pode botar ela no fundo do tanque, mas ela salta.”
O brigadeiro escreveu o livro “Senta a Pua!”, no qual contou bastidores das operações na Itália. Modesto, ele não costumava se colocar como protagonista das histórias que narrava, e sim como integrante de um grupo. “Nem deveria, mas sou tido na FAB como um sujeito fora de série”.