Para endossar os ataques feitos pelo presidente Jair Bolsonaro à ex-presidente do Chile e alta comissária da ONU para Direitos Humanos, Michelle Bachelet, e ao pai dela, Alberto, torturado e morto pela ditadura de Augusto Pinochet, o ministro das Relações Exteriores, Ernesto Araújo, foi obrigado a mudar de postura em relação à chilena.
Hoje, em sua conta no Twitter, Araújo disse que Bachelet está “muito mal informada” sobre o Brasil e insinuou que as constatações da ex-presidente chilena sobre a redução do espaço democrático no Brasil têm motivação ideológica.
“O que está encolhendo é o espaço da esquerda. Talvez seja isso o que no fundo a preocupa”, tuitou o chanceler brasileiro.
Até pouco tempo atrás, no entanto, Araújo usava o relatório de Bachelet sobre violações aos direitos humanos na Venezuela como base para seu discurso de oposição ao governo Nicolás Maduro.
No dia 24 de julho, durante entrevista coletiva em Buenos Aires, o chanceler brasileiro citou a chilena nominalmente para argumentar que o Brasil e não a Venezuela deveria ocupar a vaga sulamericana no Conselho de Direitos Humanos da Organização das Nações Unidas (ONU).
“A Venezuela de Maduro é uma Venezuela que atenta claramente contra os direitos humanos como aponta o relatório da Bachelet”, disse o ministro. Na véspera, Araújo havia assinado uma declaração conjunta dos chanceleres do Grupo de Lima dando respaldo ao “governo” do “presidente encarregado” da Venezuela, Juan Guaidó, que tem como base o relatório de Bachelet sobre o país vizinho.
No documento de uma página assinado por Araújo o relatório da chilena é citado quatro vezes explicitamente como base para uma denúncia contra o governo Maduro na Corte Penal Internacional.
Segundo fontes do Itamaraty, o “relatório da Bachelet” era motivo de entusiasmo do chanceler que, em reuniões internas costumava citar o documento em tom triunfalista como prova cabal de que o Brasil está certo ao apontar violações aos direitos humanos na Venezuela.
O relatório elaborado pela chilena, apresentado no dia 5 de julho na 41ª reunião do Conselho de Direitos Humanos da ONU, apontava entre outras coisas a criação de uma milícia por parte do governo Maduro que teria assassinado 1,5 mil pessoas este ano e 5,7 mil no ano passado.
Antes da divulgação, líderes de direita do continente chegaram a colocar em dúvida a isenção de Bachelet por razões ideológicas. Ela é filiada ao Partido Socialista chileno.
A reação do governo venezuelano ao documento também foi hostil acusando a chilena de fazer um trabalho “seletivo e parcial”. Sites e publicações de esquerda de todo o continente, inclusive do Brasil, publicaram longos textos tentando desqualificar o documento.
O Itamaraty foi procurado para comentar as posições de Araújo sobre Bachelet, mas não respondeu até a publicação desta reportagem.