O governo deverá encerrar o ano em curso podendo computar um déficit primário superior a 1% do Produto Interno Bruto (PIB) mesmo que o Congresso Nacional aprove o corte de R$ 23,408 bilhões dos gastos públicos proposto pelo Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão. A previsão é do mestre em finanças públicas pela Fundação Getúlio Vargas (FGV) e ex-secretário de finanças do município de São Paulo Amir Khair.
O especialista ressalta, no entanto, que o déficit previsto, se for confirmado, será em decorrência mais da queda da arrecadação do que pelo aumento das despesas do governo. Neste aspecto, o próprio Khair ressalta que sua visão sobre o fiscal no Brasil difere muito da discussão em curso. “Do déficit primário em 2015, 76% foi em decorrência da redução da arrecadação e apenas 24% por conta de aumento das despesas públicas”, disse em entrevista ao Broadcast, serviço de notícias em tempo real da Agência Estado.
Khair lembra que Estados e municípios respondem por dois terços do déficit primário e que o governo central por apenas um terço. Para ele, o grande problema do fiscal no País não são das despesas públicas, mas o que se gasta com pagamento de juro da dívida pública. No ano passado, lembra o especialista, do déficit de 10,4% das contas públicas, na proporção do PIB, o juro respondeu por 8,5% e o chamado déficit primário por apenas 1,9%.
“A discussão no Brasil se concentra em cima desses 1,9%. Não se discute política fiscal de maneira séria aqui”, criticou Khair. De acordo com ele, a projeção de gastos com pagamento de juros da dívida neste ano (a dívida pública é corrigida pela Selic, que se encontra em 14,25% ao ano) será de R$ 600 bilhões. “Ou seja, mesmo que fizéssemos um superávit de R$ 50 bilhões, o que é completamente impossível, ainda teríamos um déficit de R$ 550 bilhões nas contas públicas”, calculou.
Sobre a proposta de se criar uma meta fiscal flexível, Khair disse que será positiva, uma vez que dará maior flexibilidade ao governo na hora de ele fazer suas reprogramações orçamentárias todos os anos. “Com uma banda, o governo não precisará de prestar informações todas as vezes que a meta mudar para cima ou para baixo”, explicou, acrescentando que o que comanda as contas públicas no Brasil são, pela ordem de grandeza, os juros, a arrecadação e as despesas do governo.
Cofecon
O ex-presidente do Conselho Federal de Economia (Cofecon) Paulo Dantas da Costa disse que a proposta do governo de uma banda para cumprimento da meta fiscal (meta flexível) é um indicador da “falência do Estado brasileiro”. “É um recado à sociedade de que não dá mais para gerenciar a receita pública e que o governo não está conseguindo mais administrar direito suas contas”, afirmou.
Hoje, o ministro da Fazenda, Nelson Barbosa,anunciou que vai propor ao Congresso nos próximos dias uma flexibilização da meta fiscal deste ano em uma banda de um superávit de R$ 24 bilhões a um déficit de R$ 60,2 bilhões, o que equivale a 0,97% do PIB. Um pouco antes, o ministro do Planejamento, Orçamento e Gestão, Valdir Simão, divulgou a proposta de contingenciamento de R$ 23,408 bilhões do Orçamento de 2016, incluindo R$ 4,2 bilhões do PAC e R$ 8,1 bilhões de emendas parlamentares.
“Precisamos ver direito de onde virá esse contingenciamento. Porque reduzir gastos de investimentos é terrível, é suicídio”, disse Costa. Para ele, o relevante seria reduzir o serviço da dívida. “Nesse caso, diminuir taxa de juros seria razoável”, declarou.