Acuado pela Operação Lava Jato, que o mantém preso desde 24 de novembro de 2015, e enfrentando há meses um câncer na bexiga e problemas cardíacos, o pecuarista José Carlos Bumlai, de 71 anos, amigo do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, requereu habeas corpus ao Supremo Tribunal Federal.

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O pedido está nas mãos de Teori Zavascki, ministro relator da Lava Jato na Corte máxima. É uma cartada decisiva para Bumlai.

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Seus advogados são incisivos. “Em virtude de seu caráter de antecipação dos efeitos condenatórios, a prisão provisória é medida excepcional e, portanto, há de ser decretada e mantida somente em casos de indiscutível e comprovada necessidade.”

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O habeas busca derrubar decisões sucessivas desde a primeira instância – da lavra do juiz Sérgio Moro, símbolo da Lava Jato -, passando pelo Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF4) e pelo Superior Tribunal de Justiça.

O argumento central dos criminalistas que defendem Bumlai é que seus antecedentes são bons, ele não representa risco de fuga e, ainda mais, desde que foi capturado tem colaborado com a Justiça esclarecendo todos os fatos.

O pecuarista é protagonista do emblemático empréstimo de R$ 12 milhões tomado junto ao Banco Shahin, em outubro de 2004, dinheiro destinado ao PT. Em troca da liberação do dinheiro, que nunca recebeu de volta, o Grupo Schahin obteve contrato bilionário sem licitação para operar navio sonda da Petrobras, em 2009.

Na semana passada, em alegações finais no processo em que Bumlai é formalmente réu por corrupção, lavagem de dinheiro e gestão fraudulenta de instituição financeira, a defesa argumentou que ele foi o ‘trouxa perfeito’ do PT e do Grupo Schahin.

Bumlai também é alvo da investigação da Polícia Federal sobre o sítio de Atibaia (SP), cuja propriedade os investigadores atribuem a Lula. O pecuarista teria ligação com obras de melhorias da área.

No habeas ao Supremo, os advogados de Bumlai – uma equipe de quatro criminalistas prestigiados: Jacinto Nelson de Miranda Coutinho, Daniella Meggiolaro, Edward Rocha de Carvalho e Conrado de Almeida Prado – buscam descolar o amigo de Lula da imagem dos alvos da maior investigação já deflagrada no País contra a corrupção, entre eles dezenas de políticos, empreiteiros e ex-dirigentes da estatal petrolífera.

“Ao contrário do que muito se tem lido nos jornais sobre réus na Operação Lava Jato, Bumlai não tem passaporte estrangeiro, não movimenta contas em paraísos fiscais, não destruiu provas, não tentou fugir, não coagiu testemunhas e não deu nenhum indicativo de que poderia obstruir as investigações ou a instrução criminal. Aliás, de 2009 para cá – data do último fato supostamente criminoso a ele imputado – não praticou nenhuma conduta que pudesse ser classificada de delituosa.”

“Ninguém nega a importância da Operação Lava Jato nem tampouco que o esquema criminoso instalado na Petrobras não deva ser devidamente apurado com a responsabilização de todos os envolvidos”, pondera a defesa.

“Contudo, a punição destes não pode ser realizada sem observância aos princípios da presunção de inocência e do devido processo legal e muito menos antecipada por meio da prisão preventiva!”

Bumlai, atualmente, está em regime de prisão domiciliar, após permanecer internado em um hospital para uma série de delicados procedimentos médicos. Na semana passada, o juiz Moro determinou o retorno do pecuarista à prisão da Lava Jato nos arredores de Curitiba.

A defesa protesta contra o regime da prisão preventiva, ‘a mais violenta medida assecuratória processual penal, não podendo ser justificada pelas condutas de terceiros desvendadas dentro de um esquema de corrupção sistêmica ou pela suposta conduta do paciente (Bumlai) em relação a fatos que, além de não serem ilícitos, sequer investigados foram’.

Os advogados anotam que ‘não há menção no acórdão coator de quais seriam os ‘vultosos prejuízos’ aos cofres públicos causados pela conduta de Bumlai, mas sim uma estimativa do dano de 20 bilhões de reais, provocado por todos os crimes da Lava Jato, o qual, obviamente, não pode ser base para sua segregação’.

“A Bumlai não há de recair a responsabilidade, consubstanciada em sua prisão cautelar, por todos os prejuízos causados pelos delitos desvendados na operação!”, dizem os advogados.

A defesa pede a Teori. “Diante do entendimento desse Supremo Tribunal Federal, fica ainda mais evidente que o magistrado que continuar a raciocinar a partir da prisão preventiva, como primeira, principal e preferencial medida, eventualmente, podendo ser ‘substituída’ por ‘outra medida cautelar’, tal qual um ‘favor judicial’ ou um ‘benefício’ generosamente concedido ao acusado, estará violando o caráter subsidiário da prisão e o reconhecimento da liberdade do acusado como regra no processo.”

“Infelizmente é esse o caso do presente feito: a exceção da prisão virou a regra, quando, pela letra da lei, deveria ser justamente o inverso”, sustentam os advogados.

Os advogados seguem no pedido alegando que, a fundamentação do decreto prisional “não pode ser fruto de desprezo pelos direitos fundamentais de um idoso primário e de bons antecedentes, acometido por uma série de enfermidades que, em momento algum, deu mostras a afrontar a garantia da ordem pública e a aplicação da Lei Penal, tampouco reiterou as condutas a ele atribuídas, cessadas no ano de 2009”.

Os advogados de Bumlai abordam outro pilar do decreto de prisão preventiva, o risco à ordem pública que o pecuarista em liberdade poderia representar.

“Longe de servir como vala comum a fundamentar prisões sem justa causa, o conceito de ordem pública pressupõe a finalidade de prevenção social, baseada na aferição da periculosidade real daquele que está sendo incriminado, que deve ser demonstrada e diretamente relacionada ao caso concreto, o que não ocorreu no presente. Bem por isso, esse Supremo Tribunal Federal tem decidido que ‘para que o decreto de prisão cautelar (assim como sua manutenção) seja idôneo, é necessário que o ato judicial constritivo da liberdade traga, fundamentadamente, elementos concretos aptos a justificar tal medida’ e que a garantia da ordem pública ‘baseada tão somente na gravidade em abstrato do delito e na comoção social da ação’ são fundamentos ‘insuficientes para se manter o paciente no cárcere’.”