Altos salários de prefeitos destoam no cenário de crise

No momento em que governantes preocupados com a crise econômica mundial tentam ajustar seus orçamentos, algumas prefeituras do País ainda convivem com salários que ultrapassam até a remuneração do presidente da República. Enquanto o novo presidente dos Estados Unidos, Barack Obama, decide congelar os salários dos altos funcionários da Casa Branca para dar “o bom exemplo”, no Brasil alguns mandatários não se adaptaram à nova realidade. A Constituição Federal não impede que prefeitos ganhem mais que o presidente, mas especialistas defendem limites.

Em Angra dos Reis (RJ), cidade localizada a 150 quilômetros da capital fluminense e com 148 mil habitantes, a Câmara Municipal ignorou a crise mundial e concedeu um reajuste de 39% ao novo prefeito, Tuca Jordão (PMDB). Em dezembro, os vereadores elevaram o salário do peemedebista de R$ 16,5 mil para R$ 23 mil. Tuca Jordão ganha hoje mais do que o prefeito de São Paulo, Gilberto Kassab (DEM), que recebe R$ 12.384,06. A assessoria do prefeito de Angra dos Reis informa que ele não abre mão do aumento.

Mesmo com a redução do orçamento do Poder Executivo municipal de Angra dos Reis (de R$ 470 milhões para R$ 460 milhões), os vereadores ampliaram também os subsídios parlamentares, aumentando de R$ 36.000,00 para R$ 43.800,00 o limite de gastos com assessores. A justificativa é que a Câmara ganhou mais um parlamentar.

Em Belford Roxo, na Baixada Fluminense, a Câmara teve uma iniciativa oposta. Os parlamentares revogaram o aumento aprovado pela legislatura anterior e reduziram os próprios salários de R$ 7.430,00 para R$ 5.400,00, o que deve representar uma economia de R$ 500 mil anuais, calculam. “Nossos salários não coincidem com a realidade da cidade. Conversamos e chegamos a um entendimento de que era um absurdo”, justifica o presidente da Casa, Wagner Carneiro (PRTB). Os 19 vereadores querem agora reduzir o salário do prefeito Alcides Rolim (PT), que ganha, aproximadamente, R$ 19 mil e tem minoria no Legislativo.

Considerado um dos mais elevados salários entre os prefeitos do País, Beto Richa (PSDB), de Curitiba (PR), recebe mensalmente R$ 23.904,81, mais que o dobro do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (que ganha R$ 11.420,21). Segundo a assessoria de Beto Richa, ele já buscou meios legais para reduzir a remuneração. “Desde que assumiu (em janeiro de 2005 – ele foi reeleito para o novo mandato já no primeiro turno das eleições do ano passado), ele achava que o salário era elevado”, afirma um assessor. Como só a Câmara Municipal pode definir o ordenado do prefeito, em abril de 2007 Beto Richa passou a doar 20% do pagamento bruto à administração municipal.

Sem intervenção

A Constituição Federal, lei fundamental do País, não proíbe que prefeitos recebam mais que o presidente. O salário de um prefeito deve ser aprovado pela Câmara Municipal e não pode ultrapassar o de um ministro do Supremo Tribunal Federal (hoje R$ 24.500,00). O prefeito não pode, por iniciativa própria, aumentar ou reduzir a própria remuneração. “O Executivo não tem como intervir na questão”, afirma o procurador-geral de Angra, André Gomes. Segundo ele, é preciso levar em conta a estrutura à disposição do presidente da República e os gastos de cada prefeito para fazer tal comparação. “Tudo é pago pela Presidência da República, ao contrário do que acontece nos municípios”, justifica.

Para o advogado Antônio Sérgio Baptista, especialista em Direito Administrativo, cabe aos vereadores avaliar o custo-benefício na hora de decidir sobre o salário do prefeito, principalmente em tempos de turbulência econômica. “Não se justificam remunerações como estas”, criticou, ao comparar os ordenados dos prefeitos de Angra dos Reis e de Curitiba.

Baptista defende a criação de uma regra para o Executivo nos moldes da que limita os salários dos legisladores. A Constituição Federal prevê que os vereadores tenham como teto salarial 75% do salário de um deputado estadual, que, por sua vez, pode ganhar, no máximo, 75% do pagamento de um deputado federal.

Abuso

O advogado Adilson Dallari, professor de Direito Administrativo, também é favorável à criação de limites aos salários de prefeitos. “Há muito abuso”, afirma. Dallari culpa a relação de “compadres” entre parlamentares e prefeitos na esfera municipal e o descontrole no gasto dos recursos federais. “Quando (as prefeituras) funcionavam com receita própria, havia mais cuidado com os salários. Como boa parte dos recursos das prefeituras agora vêm do governo federal…”

O vice-prefeito de Diadema, no Grande ABC (SP), Gilson Menezes (PSC), já ganhou bem mais que os atuais R$ 8.122,09 quando foi prefeito entre 1997 e 2000. No último ano de gestão, a Justiça reduziu o salário dele de R$ 22.752,42 para R$ 8.500,00. Menezes recorreu para não devolver a diferença salarial dos três anos anteriores. O atual prefeito de Diadema, Mário Reali (PT), recebe bem menos que ele ganhava em 2000: R$ 14.472,21.

Para Menezes, que já foi do PT, o salário que recebia no último mandato como prefeito era compatível com as responsabilidades. “Eu pagava meu partido, aliás, ajudei muito meu partido. Sempre tive um coração liberal, ajudei muitas pessoas”, afirma. O vice-prefeito de Diadema considera “injusto” questionar os prefeitos sobre os salários, uma vez que as Câmaras determinam os reajustes. “O prefeito tem é de ser honesto, competente e fazer uma bela administração”, desconversa.

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