Abstenção expõe rejeição ao curso político, diz analista

O elevado índice de abstenção no segundo turno das eleições municipais pode ser visto como uma rejeição ao processo político, avaliou Marco Antônio Carvalho Teixeira, cientista político e pesquisador da Pontifícia Universidade Católica (PUC) e da Fundação Getúlio Vargas (FGV). Um dos fatores que explicam essa rejeição, no seu entender, é o próprio descrédito que vem contaminando o mundo político, em razão dos sucessivos escândalos.

Segundo o pesquisador, outros fatores também contribuem para este cenário, como a obrigatoriedade do voto, ainda mais quando o eleitor não se identifica ou não vê qualidades em nenhum dos candidatos que se colocam na disputa. “Talvez, na magnitude que se coloca, seja um problema de qualidade dos políticos”, apontou. Entretanto, os partidos não saem ilesos, já que, de acordo com Teixeira, muitas vezes as legendas não selecionam os políticos como deveriam.

Segundo informações do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), o nível de abstenção dos eleitores em São Paulo foi de 17,54%. No Brasil, esse índice chegou a 18,09%, o que representa uma ampliação do nível de abstenção no primeiro turno, que foi de 14,54%. “Um número dessa magnitude é muito alto, porque 18% pode mudar o resultado de uma eleição”, destacou.

Para o cientista político, outro fator que pode explicar essa rejeição de boa parte do eleitorado ao processo político é a “confusão” na formação das alianças. Teixeira destacou que um caso emblemático é o do Rio de Janeiro, onde a abstenção chegou a 20,25%. “Talvez haja uma certa confusão quando o eleitor vê o Gabeira (Fernando Gabeira, do PV), com uma trajetória de esquerda, sendo apoiado por um expoente da direita (o atual prefeito Cesar Maia, do DEM), e o Eduardo Paes (PMDB), que já havia chamado o Lula de hipócrita e de membro do mensalão, agora de mãos dadas com o presidente da República”, afirmou.

PT

Para o pesquisador, o desempenho do PT na eleição de ontem não foi muito além da média histórica do partido em São Paulo. Ele lembra que o único momento que o PT saiu vitorioso no segundo turno na capital foi em 2000: quando Marta Suplicy enfrentou Paulo Maluf (PP) no auge da Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) da Máfia das Propinas. “Ali, o PT teve a capacidade de galvanizar para si tudo o que representava o sentimento antimalufista”, assinalou.

Teixeira ressaltou que a apuração das urnas mostrou que o eleitorado de Marta encolheu em 287 mil votos, se compararmos o resultado de ontem com o do segundo turno das eleições de 2004. Em termos percentuais, a petista caiu de 45% dos votos em 2004, para 39% nesta eleição.

2010

Com relação ao prefeito reeleito, Gilberto Kassab (DEM), o cientista destaca que ele traduziu o sentimento antipetista ou até mesmo “antimartista” presentes na cidade. Mas, para ele, a vitória de Kassab também representa a aprovação do eleitorado ao projeto de levar o padrinho político do democrata, o governador de São Paulo, José Serra (PSDB), à Presidência em 2010. “Kassab é parte do projeto Serra”, disse Teixeira, ressaltando que o prefeito reeleito é “estratégico” neste plano.

Neste contexto, o grande vencedor indireto das eleições municipais foi Serra, destacou o cientista político. “Essa eleição tem importância para as configurações partidárias com vistas a 2010”, explicou. Segundo ele, o tucano pode ser visto como vitorioso mesmo em âmbito nacional, já que os potenciais adversários do PSDB para 2010 não apresentaram resultados tão expressivos como o governador paulista.

É o caso do governador de Minas Gerais, Aécio Neves (PSDB). Seu candidato à prefeitura de Belo Horizonte, Márcio Lacerda (PSB), venceu a eleição no segundo turno, mas com maior dificuldade do que Kassab em São Paulo. Além disso, Teixeira ressaltou que as capitais conquistadas pelo PSDB ficaram restritas a locais de pouca projeção política nacional, como São Luis (MA), Teresina, no Piauí, e Cuiabá, no Mato Grosso.

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