O anúncio do reajuste do salário mínimo regional, feito pelo governador Roberto Requião (PMDB) no último dia 5 desagradou os líderes empresariais, que alegaram não terem sido consultados e previram impacto negativo à economia do Paraná por conta do aumento do custo da produção.
A oposição ao governo também critica o que chama de “cortesia com chapéu alheio” por parte do governador, uma vez que tais reajustes serão pagos apenas pela iniciativa privada, enquanto os servidores estaduais tiveram, no ano passado, apenas a correção da inflação.
Em entrevista a O Estado do Paraná, Carlos Manuel dos Santos, presidente do Instituto Paranaense de Desenvolvimento Econômico e Social (Ipardes), órgão responsável pelos cálculos do novo mínimo, explica como o Estado pode dar reajuste de até 21,5% no piso regional mas não pode fazer o mesmo para o funcionalismo.
O Estado – Num ano em que a inflação foi inferior a 5% e o salário mínimo nacional acabou de ser reajustado em 9,6%, como o Ipardes conseguiu chegar a um aumento de até 21,5% no piso regional
Carlos Manuel dos Santos – A proposta de reajuste que estamos fazendo para vigir a partir de maio, pelo menos essa é a intenção, reajusta nossos pisos de 9,5% a 21,5%.
Então, a primeira faixa, primeiro grupo que são os trabalhadores da agropecuária, o piso está sendo reajustado em 9,5%, mantendo uma certa paridade com o reajuste do salário mínimo nacional. Os outros, que tiveram uma variação maior, entre 11 e 21,5%, é porque estamos buscando uma aproximação deste piso com os preços praticados no mercado.
Hoje, o salário médio de entrada do terceiro grupo, por exemplo, que é o dos trabalhadores na indústria, ele já é praticado, na média de 2009, R$ 684,00 e nós estamos propondo R$ 714,00, o que significa um reajuste real de 4,29%. Portanto, uma adequação aos salários que já estão sendo pagos, muito próximos à inflação.
Claro que se pegarmos os valores do piso R$ 625,00, para R$ 714,00, o reajuste é de 14,2%. Mas o próprio mercado não está pagando R$ 625,00, está pagando R$ 684,00. Uma coisa é o reajuste como base, outra coisa é um reajuste, como estamos propondo, visando os salários já recebidos por esse grupo, garantindo um reajuste efetivo.
No entanto, a média de salário inicial de técnicos em 2009 é de R$ 922,00. Então, mesmo dando um reajuste de 21%, esse piso é 17% menor do que o que já se pratica no Estado. E esse piso é para trabalhadores que não estão resguardados por estrutura sindical ou por acordos coletivos.
Quem tem um sindicato pode até ter um valor de salário até um pouco menor que esse que estamos propondo, mas essas negociações coletivas acabam incorporando aos salários benefícios complementares, como alimentação, auxílio creche e plano de saúde.
Esse trabalhador, como não tem essa defesa, é isso que o Estado faz, assume esse poder de defesa. O quarto grupo, do nível técnico, a proposta que estamos fazendo é de R$ 765,00.
OE Que características tem a economia do Paraná que possibilita ao Estado ter o maior piso do país, maior que estado com PIB superior ao nosso?
CMS – Não é uma característica especificamente econômica, é uma leitura de função de governo, que busca ter uma representação de populações que precisam de ação governamental. Foi no que se pensou quando se pensou na aplicação desta lei do piso no Paraná (e somente quatro estados adotam a lei).
A outra coisa, como é destinado a trabalhadores que não estão resguardados por acordos coletivos, a nossa estimativa é que estaríamos abrangendo entre 300 e 350 mil trabalhadores e que esse reajuste tem um impacto sobre o PIB de apenas 0,2%, é um impacto muito pequeno no âmbito do PIB, mas, 50 reais a mais no bolso de um trabalhador que ganha, R$ 600,00, é um impacto importante.
OE – Vários emp,resários criticaram que esses índices são irreais e que colocam em risco a competitividade da indústria paranaense.
CMS – Há 20, 25 anos, o salário mínimo era regionalizado, tinha um para São Paulo, um para o nordeste, um para o Paraná. E no Paraná ainda era dividido: um para a Região Metropolitana de Curitiba e um para o interior.
Quando se unificou o salário mínimo nacional houve essa história de que estados onde o impacto do salário fosse maior iriam quebrar. E a realidade mostrou o contrário. Outra resposta para essa pergunta é a comparação dos salários médios.
Apesar do piso menor, você acha que os salários praticados em São Paulo são menores que no Paraná? E a indústria de São Paulo não está exposta a mais riscos de competitividade que a paranaense. Hoje a indústria do Paraná está inserida na dinâmica global. Se nós aproximarmos os pisos aos salários já praticados, como podemos estar comprometendo a competitividade?
OE – A oposição ao governo na Assembleia Legislativa também criticou o reajuste, como já tinha feito no ano passado e diz que o Estado faz cortesia com o chapéu alheio, pois dá esses reajustes a trabalhadores que são pagos pela iniciativa privada e não concede os mesmos índices e nem pratica os mesmos pisos aos servidores públicos.
CMS – Esta é uma argumentação completamente política e mostra, talvez, um desconhecimento da oposição em relação aos salários pagos pelo Poder Executivo para seu quadro próprio.
O salário pago para agente de apoio (nível fundamental) é de R$ 667,00, já é um valor superior ao que estamos propondo para o grupo 1 (R$ 663,00) e imagino que o governo ainda dará alguma revisão dos salários aos servidores neste ano.
Mas hoje, com os salários que estão vigindo, o menor salário do quadro do Estado já é R$ 4,00 superior ao que estamos propondo com piso mínimo. Para o cargo de agende de execução (nível médio ou técnico), o Estado já paga R$ 1.000,65, portanto, bem acima daquilo que está se propondo para o piso.
E há um procedimento de que para os rendimentos brutos iguais ou menores do que dois salários mínimos é dado um adicional de R$ 50,00 a título de auxílio alimentação. Então hoje o menor salário do Estado é R$ 667,00 mais R$ 50,00
OE – A oposição costuma usar o exemplo do policial militar, que tem um salário base inferior a R$ 400,00.
CMS – Porque o salário do policial é uma composição que resulta numa composição bruta de cerca de R$ 1.000,00. Pois, além do salário base, tem o adicional de periculosidade e vários outros componentes. Mas eu não sei exatamente quanto ganha um policial militar.
Eu tenho as informações do quadro do Executivo. Um cargo em comissão no Estado, o salário base pode ser de R$ 230,00. Mas a remuneração final dele é R$ 1.641,00.
OE – Mas todos esses benefícios são considerados na aposentadoria ou em eventuais indenizações em caso de exoneração?
CMS – Em relação aos comissionados, se ele não for servidor de carreira, ele não está abrangido pela Paranaprevidência. Está abrangido pelo INSS e o recolhimento é pela remuneração total dele, não pelo salário básico. Estou falando do funcionário do Executivo, do policial militar, desconheço a legislação.
OE – Outra crítica é que se a economia está crescendo a ponto de termos esse reajuste no piso, a arrecadação do Estado cresce junto. Por que os servidores não têm o mesmo reajuste, então?
CMS – Porque o reajuste do piso tem um impacto de 0,2% sobre o PIB. Não é porque deu-se um reajuste de 14,9% em maio do ano passado, que a arrecadação cresceu 15%. É uma leitura maniqueísta, até, como se existisse uma correlação direta.
Um reajuste de 15% para o servidor seria impraticável para o Estado, porque a receita, com certeza, não cresceu 15%. Quando est,amos tendo esse cuidado de aproximarmos os pisos aos salários de mercado é para buscar essa equidade e aproximar quem não tem este resguardo, essa cobertura sindical, pelo poder do Estado.
OE A oposição também reclamou da antecipação do anuncio do reajuste, já que a data de reajuste do mínimo sempre foi maio. Insinuou-se que o governador queria fazer uso político do novo mínimo e por isso antecipou o anúncio, já que deve deixar o governo em abril para disputar as próximas eleições. Por que, neste ano, o reajuste foi definido em janeiro?
CMS – O Ipardes é um órgão técnico e recebeu essa demanda do governador. A oportunidade política não é nossa, é do governador. Recebemos a demanda e fizemos uma propostas de reajuste. Também houve uma decisão política de antecipação do salário mínimo nacional, que, antes reajustava em maio e agora foi para janeiro.
Nós tomamos o mês de maio como referência para esses cálculos. O governador já anunciou que vai enviar esse projeto à Assembleia em fevereiro e, no projeto ele pode dizer se a lei vai vigir a partir de primeiro de maio ou a partir da aprovação da lei. É uma dimensão política que não cabe ao Ipardes fazer essa consideração.
OE – O reajuste do ano passado também foi calculado pelo Ipardes? E quando o governador demandou o instituto?
CMS – Também foi calculado pelo Ipardes. Fomos demandados em março. Indiferente se a antecipação da proposta é ou não oportuna politicamente, o mais importante é que os trabalhadores serão os maiores beneficiados e é para eles que esta lei de destina.