Em meio à crise na votação do salário mínimo, o primeiro embate enfrentado pela presidente Dilma Rousseff com o Congresso Nacional, nos 100 primeiros dias de sua gestão, a petista teve a oportunidade de escalar a tropa de choque governista e cobrar das siglas aliadas fidelidade à posição do governo federal. O esforço e a firmeza demonstrados por ela nesta primeira grande batalha com o parlamento, na avaliação de cientistas políticos ouvidos pela Agência Estado, deu mostras de como será a relação da presidente com o Congresso Nacional daqui para frente. Ela deve manter diálogo permanente com o Senado Federal e com a Câmara dos Deputados e deve condicionar espaço em sua administração ao apoio das siglas às propostas do governo federal.
Na avaliação dos especialistas, a presidente foi bem-sucedida em sua primeira celeuma com o Congresso. De acordo com eles, ela conseguiu pacificar as bancadas aliadas e foi habilidosa ao esperar a votação de projetos de interesse do governo federal para iniciar a indicação do segundo escalação. “Ela fechou a porteira até que os projetos fossem votados”, ressaltou o professor de Ciência Política da Fundação Getúlio Vargas (FGV), Marco Antonio Carvalho Teixeira, segundo quem, neste ponto, a atuação da presidente se diferenciou da observada no governo do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva. “Até o presente momento, ela foi bastante habilidosa, não negociou espaço antes que a base governista votasse os presidentes da Câmara dos Deputados e do Senado Federal e conseguiu manter uma coesão.”
O especialista da FGV lembrou ainda que a presidente conseguiu contornar a crise deflagrada entre o Palácio do Planalto e o PDT, por conta de dissidências na votação da proposta de R$ 545 para o salário mínimo. “A sensação que ficou é de que ou faz parte da base ou não faz parte da base.” No episódio, o PDT não foi convidado a participar da reunião com líderes da base aliada, o que deu margem a especulações sobre a permanência no cargo do ministro do Trabalho, Carlos Lupi. O professor ressaltou que divergências desse tipo acontecem quando não se tem uma base de sustentação coesa. “Por maior que ela seja, é uma base de sustentação muito calcada nos espaços que cada partido tem.”
A avaliação é semelhante à feita pelo cientista político Humberto Dantas, consultor da ONG Voto Consciente. Desde o governo do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, de acordo com Dantas, a base governista é pautada por aspectos que não necessariamente condizem com princípios programáticos, criando uma espécie de governabilidade pragmática. “É o apoio pela possibilidade de governar, desde que sejam oferecidas vantagens.” A manutenção de um diálogo permanente com o Congresso Nacional, à que a presidente vem dedicando atenção especial, é, na avaliação do analista, recorrente desde o impeachment de Fernando Collor de Mello. O ex-presidente não manteve um grande canal de diálogo com os parlamentares. “As negociações com o Congresso Nacional seguem parecidas, com a necessidade de negociações permanentes.”
O consultor da ONG Voto Consciente destacou ainda que, na relação com o Senado Federal, a presidente leva vantagem em relação ao seu antecessor. A atual configuração da Casa, segundo Dantas, é “mais dócil” com o governo federal do que a da legislatura passada. “O ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva se empenhou muito na campanha ao Senado Federal e conseguiu um apoio maior”, disse. Na atual legislatura, o número de senadores do PT quase dobrou, de 8 para 14 parlamentares, e o total de senadores do PSDB, principal sigla da oposição, caiu de 16 para 10 parlamentares. “Ela não deve encontrar tanta resistência no Senado Federal, onde o ex-presidente teve de dialogar mais.”