Nos domínios da política – estamos fartos de saber – os fatos ocorrem na maioria das vezes sem quaisquer conotações com a plausibilidade. Daí resulta a série infindável de definições produzidas pela sabedoria popular sobre essa arte milenar de aproximar os contrários ou engolir sapos, como rezam tanto as filigranas acadêmicas como o linguajar tosco dos botequins.
Contudo, é oportuno lembrar a profunda lição prática a extrair de uma frase sempre citada pelo então governador das Minas Gerais, Magalhães Pinto, não por acaso dono do poderoso Banco Nacional, quando se valia da esperteza de seus conterrâneos para transmitir a idéia mais precisa sobre o fenômeno psicossocial. Assim se dizia nas Alterosas: ?Política é como nuvem: quando se olha está de um jeito, mas instantes depois já está completamente diferente?.
É dessa forma simplória e, ao mesmo tempo objetiva, que o presidente Luiz Inácio Lula da Silva deve estar procurando absorver a dura realidade produzida pelas urnas eletrônicas de domingo passado. O passeio prenunciado pelas pesquisas até uma semana antes, de liquidação da fatura no primeiro turno, tornou-se aborrecida e frustrante realidade a ser perseguida até o dia 29.
A reação de Geraldo Alckmin, mesmo a reboque do desmantelamento da tentativa de causar dificuldades para a tranqüila eleição de José Serra em São Paulo, mudou em poucos dias um panorama que se julgava definido. Ao contrário, as nuvens que toldaram o horizonte lulista no dia 1.º acabaram permitindo a passagem da luz sobre os eleitores do tucano, cujo número cresceu em proporção impressionante. A definição ficou para o último domingo deste mês.
A lição do velho Magalhães Pinto está em pauta. O vendaval de votos dados a Alckmin esfumou a esperança de Lula ganhar no primeiro turno, e poucas vezes na história recente do país viu-se uma epígrafe de quão sujeitas a chuvas e trovoadas são as previsões eleitorais. Nem os principais institutos de pesquisa, que insistiram em apontar a vitória de Lula no primeiro turno, sabiam ou tiveram o condão de detectar que algo estava no ar além dos urubus e aviões de carreira, como dizia o Barão de Itararé, histriônico cronista dos costumes brasileiros dos meados do século passado.
Quem parece não estar nem aí para o comportamento errático do clima político são os próceres do PMDB, o genuíno partido de resultados. Com quatro governadores já eleitos e outros tantos com chances reais de ganhar no final do mês, a maior bancada na Câmara dos Deputados e a segunda no Senado, o partido assume os ares daquela dama de folhetim cobiçada por desatinados litigantes.
Os 86 deputados eleitos pelo PMDB serão indispensáveis para que o futuro presidente tenha maioria na Câmara. O inverso é também verdadeiro, pois se a bancada marchar para a oposição, Lula ou Alckmin terão imensos problemas na aprovação de projetos de interesse do governo. Quando os senadores José Sarney e Renan Calheiros agiram abertamente para estiolar a idéia do lançamento de candidatura própria à Presidência da República, mesmo ante a aspereza das críticas de nove entre dez analistas políticos, hoje podem se vangloriar do acerto de sua jogada.