Cerca de 70% das ações que abarrotam o Judiciário brasileiro são de autoria do poder público – governo federal e suas estatais, principalmente – ou de um seleto grupo de grandes conglomerados empresariais privados, empenhados muito mais em impedir o cumprimento de sentenças a que são condenados. Para a maioria da população, a justiça brasileira continua cara, lenta, ineficiente e inacessível, conforme constatação da Secretaria Especial para Reforma do Poder Judiciário, vinculada ao Ministério da Justiça.
Segundo o secretário Sérgio Renault, há casos em que uma sentença leva mais de dez anos para ser cumprida, sem contar o elevado número de processos que resultam em impunidade. "Esses fatores elevam o custo Brasil e afetam a confiança na justiça brasileira como elemento de solução de controvérsias", disse. Nos últimos anos, empresas estrangeiras têm deixado o País por insatisfação com o aparelho judiciário, conforme apuraram os Ministérios da Justiça e da Fazenda.
Para medir o impacto do funcionamento do Judiciário no custo Brasil, o Ministério da Justiça e o Banco Mundial firmaram uma parceria que prevê a produção de três estudos técnicos. Serão também identificadas as causas da morosidade do Judiciário apontada como fator do risco Brasil que afugenta os investidores estrangeiros. Os estudos vão também dimensionar os problemas com estatísticas e análises e propor soluções para racionalizar o processo e dar mais agilidade ao aparelho judicial.
O Brasil tem uma das mais altas taxas de demandas judiciais do mundo, com a proporção de uma ação para cada 10,2 habitantes, semelhante à média dos Estados Unidos e acima das de países europeus. "Esse número, à primeira vista, mostra um exercício de cidadania. No entanto, os processos estão concentrados nas mãos de grandes empresas e da administração pública", explicou Renault.
Ele desconfia que o objetivo de tamanho apetite processual não seja propriamente sede de justiça, mas o contrário: fazer a justiça não funcionar, por meio de recursos, ações e medidas protelatórias da decisão, mesmo quando se trata de questões com jurisprudência formada.
O congestionamento do Judiciário, a seu ver, decorre muitas vezes de falta de racionalidade da administração pública. "O objetivo é, a partir dos resultados desse estudo, criar um modelo, com sugestões que ajudem as empresas públicas e privadas a racionalizar a relação com o Judiciário", disse.
O Banco Mundial destinou R$ 200 mil para custear o projeto, que terá um ano de duração. O primeiro estudo é um diagnóstico sobre a atuação do poder público em juízo – quanto gasta e quanto ganha a União quanto participa de processos judiciais na condição de ré.
Nesse mesmo contexto, serão avaliadas também 20 grandes empresas que mais são alvos de processos judiciais. Outro avaliará o rito e o trâmite de execuções fiscais, nos casos em que a União, Estados e municípios participam como autores dos processos de cobrança de tributos.
No ano passado, a justiça brasileira recebeu mais de 17 milhões de processos e só deu conta de julgar ou dar andamento a dois terços. Mais de 5 milhões de ações foram se juntar ao estoque de aproximadamente 30 milhões de ações que tramitam nas diversas instâncias do Judiciário.
São Paulo tem o Judiciário mais abarrotado do País e as ações fiscais representam 50% dos processos que tramitam na primeira instância. A análise do perfil, valor e tempo de tramitação das execuções fiscais, tanto para a União quanto para estados e municípios, permitirá ao governo pensar em políticas mais adequadas para a cobrança de tributos. As ações coletivas e do código de proteção do consumidor também serão estudadas.