Pizza com cerveja

A cerveja é um ingrediente novo na rodada de pizza em que até aqui se transformou o caso Renan Calheiros. Mesmo que se admita a hipótese de que, ao final de tudo, fique inequivocamente provada a inocência do presidente do Senado da acusação que lhe fazem e que o levou à Comissão de Ética daquela Casa, as prestidigitações que até agora fizeram seus aliados – dizem que sob seu próprio comando – levam a crer que dessa cartola não sai coelho. O processo já logrou, até agora, renúncias de relatores, passagens sucessivas por várias gavetas e investigações iniciadas, porém contestadas, não porque não estivessem no caminho da verdade, mas porque uma maioria ocasional desejava a manutenção, a qualquer custo, de Renan Calheiros no seu trono, lá em cima e acima de qualquer suspeita.

Das idas e vindas resultou a anulação de tudo. A Comissão de Ética começará o processo de novo, a partir do zero, ou seja, não muito longe de onde já estava. Já se prevê que nada será examinado antes das calendas de agosto. Mas nesta rodada de pizza acaba de entrar a cerveja. Denuncia-se que o deputado Olavo Calheiros, do PMDB de Alagoas, irmão de Renan, vendeu uma fábrica de cerveja a uma das empresas do ramo que brigam no mercado por espaços nas mesas dos bares. A venda da fábrica, localizada em Murici, Alagoas, teve o valor de R$ 27 milhões. Especialistas, não em tomar cerveja, mas em calcular valores de grandes negócios, acham que houve superfaturamento. Esperteza do vendedor ou maracutaia? Há dados que acionam os ?desconfiômetros?. A empresa compradora teria se livrado de uma dívida de R$ 100 milhões que tinha com o INSS e outra, também muito elevada, com a Receita Federal. A revista Veja, sempre de olho nessas mazelas, acusa o presidente do Senado, Renan Calheiros, irmão do deputado vendedor da fábrica, de ter interferido junto aos órgãos governamentais credores para que essas dívidas milionárias fossem perdoadas. Daí a conclusão de que não houve esperteza. Mais provavelmente, safadeza.

Renan Calheiros tem nos seus calcanhares, além do DEM e do PSDB, o pequeno PSOL. Só que o minúsculo partido é presidido pela ex-senadora Heloísa Helena, que foi candidata a presidente da República. Ela, além de ser conhecida por sua intrépida combatividade, é também alagoana, como os Calheiros. E não costuma tratar com luvas de pelica os que considera negocistas. O Conselho de Ética do Senado, quando tomou conhecimento de que o PSOL iria pôr cerveja na mesa do processo contra Renan Calheiros, logo foi anunciando que não iria entrar nessa. Afinal de contas, a acusação contra o presidente do Senado, quando formulada, se referia apenas à suspeita de que teria pago pensão alimentícia a uma jornalista, com a qual teve uma filha, com dinheiro de uma empreiteira. Nem o adultério foi considerado como problema ético. Como misturar cerveja nessa rodada? Não aceitaria uma nova denúncia no mesmo processo.

Como Olavo Calheiros é deputado federal, o PSOL volta-se para a Câmara. É nela que pretende denunciar o novo escândalo da cervejaria. Lá a cerveja desce redondo. O presidente do Conselho de Ética da Câmara, Ricardo Izar (PTB-SP), já declarou que vai dar prosseguimento às investigações assim que a representação chegue ao órgão. ?Eu examino imediatamente e indico o relator logo em seguida?, disse.

O Congresso passa agora a viver uma situação inusitada. No Senado, espera-se uma rodada de saborosa pizza. E na Câmara, a cerveja. Difícil de acreditar, pois na grande maioria dos casos antes examinados pelo Conselho de Ética da Câmara, rolou pizza, mesmo sem cerveja. Mas, como Câmara é a outra metade da laranja que forma o Congresso, é possível que no final façam a festa completa, com pizza e cerveja.

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