Pisando em ovos

Ocupados com a campanha eleitoral para escolha dos prefeitos em todo o País, em especial na cidade de São Paulo e outras capitais de grande importância política, os meios de comunicação, os políticos e mesmo os analistas não se preocuparam com graves fatos que vinham acontecendo no âmbito do Ministério da Defesa. Falaram, à exaustão, das fotos que seriam do jornalista Herzog na prisão, e que depois foi encontrado morto, enforcado e, muito provavelmente, assassinado. Isso ocorreu durante a ditadura militar. Também da manifestação pública do porta-voz do Exército, de certa forma sustentando o terrível tratamento dado pelos governos militares aos líderes da esquerda, posição incompreensível dentro de um regime democrático.

Esqueceram-se de levar em consideração, com o peso que efetivamente teve, a quebra de hierarquia, pois em nome das Forças Armadas deveria falar o agora ex-ministro da Defesa, embaixador José Viegas, ou alguém por ele autorizado.

O presidente Lula aceitou o pedido de demissão do ministro Viegas, que tinha guardado há dias na gaveta, esperando baixar a poeira, e nomeou para o seu posto, o vice-presidente da República, José Alencar, empossado ontem durante cerimônia concorridíssima, presidida pelo próprio chefe da nação.

Uma saída inteligente, pois Alencar, apesar de discordar da política econômica do governo do qual é vice-presidente e não ter papas na língua para criticá-lo, é um experiente empresário e político simpático, pertencente ao PL, agremiação que melhor se situa no centro ou mesmo na direita, que na esquerda à qual se aliou para a eleição do então socialista Lula.

Nas Forças Armadas existem ainda focos de resistência ideológica a um governo de esquerda. Esses militares não se esquecem que foi contra o grupo que hoje está no poder e ao qual são subordinados que aconteceu o golpe de 1964 e ao qual subjugaram por duas décadas. São militares anticomunistas, como a sua grande maioria, a quase totalidade.

Estes e os demais militares têm ainda com o governo a não resolvida questão do reequipamento das Forças Armadas. Elas estão sem o armamento desejado, sucateado e indubitavelmente incapaz de dar resposta às obrigações de defesa nacional. Descontentes estão também com seus soldos, sem dúvida baixos, se cotejados com o poder aquisitivo que os militares já tiveram no passado e com os salários de mercado.

Mas Lula e seu governo estão pisando em ovos e sabem que têm de respeitar as Forças Armadas, pelo papel que lhes é reservado, inclusive e principalmente numa verdadeira democracia. Sentem ainda mágoas pela violência ocorrida durante o período ditatorial. Mágoa que ambos os lados não conseguiram apagar. E, apesar da anistia, que é lei e lei sábia, não são poucos os que ainda alimentam sentimentos de vendeta, o que em nada ajuda o Brasil. Antes, o coloca sob riscos absolutamente desnecessários.

Assim sendo, fica parecendo que José Alencar é um nome bem escolhido para o Ministério da Defesa. Não é de esquerda. Mas o que entende ele de atividades militares? Não é ele vice-presidente, portanto indescartável no governo, porque como substituto de Lula tem mandato concedido pelo povo? Não ocorreria uma crise se fosse demitido do ministério, caso necessário?

Na verdade, a nomeação de José Alencar é uma saída provisória e que poucos acreditam venha a dar certo.

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