O presidente da Comissão Especial de Mortos e Desaparecidos Políticos da Presidência da República, João Luiz Duboc Pinaud, que assumiu o cargo em 29 de junho deste ano, anunciou hoje que vai pedir demissão por não concordar com os rumos da política de direitos humanos no País e diante da resistência que enfrenta no governo ao tentar abrir os arquivos sobre as mortes e desaparecimentos durante a ditadura. "A questão é complexa e não vejo condições de continuar operando. Se é para viver uma farsa, só para representar, chamem um ator", disse ele na sede da Ordem dos Advogados do Brasil do Rio (OAB-RJ). "Durante todo o tempo que estive na presidência da Comissão, não recebi qualquer apoio, só bloqueios nunca dirigidos diretamente a mim, mas à equipe com a qual trabalhei."
Para ele, o governo, que deveria ser o maior interessado em ouvir as pessoas que têm informações sobre mortos e desaparecidos da ditadura, não demonstra intenção de conhecer e divulgar esses fatos. "Enquanto estive na presidência da Comissão, não recebi qualquer apoio tático ou técnico para ouvir as pessoas que sabem do que aconteceu", continuou. "O conhecimento desses fatos não tem qualquer cunho punitivo, mas corresponde ao direito que o povo tem de conhecer seu passado, preservar sua memória."
Pinaud negou que a reação dos meios militares à divulgação de fotos de um homem torturado nos anos 70, que inicialmente pensou-se ser o jornalista Vladimir Herzog, e a posterior demissão do ministro da Defesa, José Viegas, não influíram em sua decisão, que já vinha sendo amadurecida. No entanto, ele só vai apresentar a sua a carta de demissão ao presidente da República na próxima reunião da Comissão, que acontece no dia 12 de dezembro. "Até lá, vou submeter o texto às instituições às quais pertenço, como a OAB (Ordem dos Advogados do Brasil) e a Igreja Brasileira de Confissão Luterana, ou que me apoiam, como a Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB).
O presidente da OAB, Roberto Busato, confirmou que já conhece os termos da carta de demissão de Pinaud e foi mais enfático em suas críticas ao governo quanto à questão da abertura dos arquivos da ditadura. "Não há uma unidade de pensamento e discurso. O Nilmário (Miranda, secretário Especial de Direitos Humanos) fala uma coisa, o ministro da Justiça (Márcio Thomaz Bastos) diz outra e o presidente Lula vem com uma terceira", comentou Busato. "Se o Pinaud se sente incomodado porque o caminho não anda bem o jeito é sair, mas a demissão de um advogado com sua experiência é lamentável."