Brasília (AE) – Depois de dois anos do lançamento do Bolsa Família, o governo fechou o primeiro perfil das famílias beneficiadas pelo principal programa social de caráter federal. Os números confirmam que o projeto chega aos pobres, mas também mostram que não é apenas dinheiro que essas famílias precisam.

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O perfil, feito no primeiro semestre deste ano com dados do cadastro único das famílias, levantou dados do tipo de habitação, acesso à rede de esgoto e de água tratada, de luz elétrica, escolaridade e emprego. Descobriu que 93% dos cidadãos com mais de 15 anos que estão no plano têm menos de quatro anos de estudo.

São 5,93 milhões que não conseguiram nem mesmo terminar a quarta série primária. O resultado mais evidente disso: 54% deles estão desempregados e apenas 2,6% têm empregos com carteira assinada. Hoje, com dois anos da proposta, o perfil mostra uma população pobre, sem muita perspectiva e com poucas possibilidades de passar a caminhar com as próprias pernas por falta de emprego, educação, saúde.

"O Bolsa Família é bem focalizado e a maioria dos benefícios vai para os extremamente pobres", disse a vice-presidente do Banco Mundial (Bird) para a América Latina, Pámela Cox. "Mas apenas o Bolsa Família não é suficiente. É preciso programas complementares." Pámela afirma que, se a idéia incentiva as famílias a levarem os filhos para a escola, precisa existir colégios e de qualidade: "O governo precisa também melhorar a qualidade da educação, os serviços de saúde e, claro, a infra-estrutura, como saneamento."

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Até hoje, 96 mil famílias foram excluídas do empreendimento. Mas, por enquanto, nem o Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome sabe quantas delas saíram porque não precisam mais. O certo é que a maioria foi excluída por erros do cadastro, como estar registrada duas vezes.

As dificuldades principais são estruturais. Falta acesso ao ensino, empregos, luz e água tratada. Na época em que a pesquisa foi feita, o número de famílias que estavam no programa ainda era de 6,45 milhões. Hoje, são 7,5 milhões. A maioria, 58 8%, afirmava ter casa própria. Mais de 60% tinham habitações de tijolo, apesar de o levantamento não especificar a qualidade dessas moradias. Mas 2,2 milhões dessas residências não têm acesso a qualquer rede pública de abastecimento de água, 1,5 milhão de famílias não tem nenhum tipo de tratamento da água e a maioria, quando o tem, o é inadequado.

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Num país onde 80% da população vivem em zonas urbanas, a luz elétrica ainda parece ser um artigo não tão comum. Boa parte das famílias tem acesso a sistemas de iluminação, mas mais de 400 mil ainda sobrevivem à luz de lampiões e velas, e 380 mil estão ligadas a redes clandestinas de eletricidade – os chamados gatos.

"O resultado desse perfil aponta uma situação das famílias muito parecida com a Pnad (Pesquisa Nacional de Amostra por Domicílio), mas ainda mais difícil. Isso nos mostra que o programa é, realmente, muito focalizado nas famílias mais pobres", diz a secretária de Renda e Cidadania do Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome, Rosani Cunha, responsável pelo Bolsa Família.

Em média, as famílias beneficiadas hoje pelo programa recebem 72 reais por mês. Em troca, precisam manter os filhos na escola, sem trabalhar e ainda conservar em dia os exames e as carteiras de vacinação de gestantes e crianças até 6 anos. Desde que foi criado, a idéia é que essas famílias, um dia, possam caminhar com as próprias pernas e não precisem mais da bolsa. Cabe à administração federal, prefeituras e governos de Estados terem projetos auxiliares ao pagamento da bolsa.

"Primeiro, tínhamos de resolver os problemas nos cadastros das famílias. Agora, podemos trabalhar para estimular ações paralelas", afirmou Rosani. A primeira ação para tentar melhorar a situação das famílias foi enviar ao Ministério da Educação a lista das pessoas com baixa escolaridade para que o ensino possa concentrar nelas os programas de alfabetização e educação de adultos. A mesma coisa foi feita com o Ministério das Minas e Energia sobre a situação da luz. Já o saneamento deve continuar um obstáculo. "A política final é de responsabilidade dos municípios, mas sabemos que eles têm dificuldade de implementá-las", disse a secretária. O Poder Executivo tem dinheiro para emprestar, mas as administrações municipais não podem pegar porque a maioria está acima do limite de endividamento.