Outro pedágio não falado até aqui arrisca engrossar o debate nacional. E poderá vir travestido do pomposo status de reforma do ensino. Não bem uma reforma “ampla e abrangente”, mas a meia-sola que falta para acabar, de forma atabalhoada, com a gratuidade do ensino nas universidades públicas brasileiras. A tese tem o aval aprioristicamente explicitado do ministro Cristovam Buarque, da Educação. E não se diga aqui que o ministro não representa, na matéria, o pensamento do governo Lula. Em declarações recentes, ele disse não se opor ao conteúdo do Projeto de Emenda Constitucional – PEC apresentado ano passado pelo então deputado padre Roque, do PT do Paraná.
A proposta, que aumenta os gastos do governo com educação de 18% para 25% da receita, prevê a criação de um fundo destinado às universidades públicas, formado, entre outras fontes, com a contribuição de ex-alunos: 2% da renda bruta de quem, após formado, ganhar a partir de R$ 30.000 por ano, e 3% da renda dos que ganharem acima de R$ 50.000 por ano. Segundo cálculos, só essa fonte asseguraria um montante superior a R$ 2 bilhões anuais a reforçar o orçamento da pasta da Educação.
Entidades estudantis representantes de alunos matriculados em escolas públicas, como seria natural, já se manifestaram contrariamente ao projeto. Mas também as associações de dirigentes das universidades federais torceram o nariz. Talvez por isso o ministro Cristovam Buarque, ao dizer-se simpático à cobrança do pedágio estudantil, faça logo a ressalva que ninguém está pensando, no governo, em acabar com a gratuidade do ensino superior…
Em que pesem as boas intenções do autor, o projeto de padre Roque deixa muitas questões sem resposta. A primeira e mais importante delas seria com relação ao período de vigência desse pedágio. Em tese, pela vida inteira. Outra: valeria apenas para quem acabasse concluindo o curso numa universidade pública, ou também para quem a freqüentasse por um determinado período? Mas o fato mais grave é o precedente que abriria, ao estabelecer, na prática, um outro “imposto do cheque” (este para a Educação), com o agravante de, não sendo nem amplo, nem geral, nem irrestrito, beneficiar exatamente camadas mais ricas da população, que sabidamente formam o público discente das universidades públicas.
A indústria do ensino é, hoje, uma das mais promissoras no Brasil. Se no lado privado, que representava há dois anos 85% do total de escolas do ensino superior brasileiro, é um bom negócio, isso se deve ao fato de que, no lado oficial ou público, há problemas sérios e antigos para serem resolvidos que vão muito além da sempre alegada falta de recursos. As distorções existentes apenas seriam acentuadas com o aporte de mais recursos, sejam eles provenientes dessa imaginada “taxa de ex-alunos”, sejam originários de verbas orçamentárias normais.
Que o ministro da Educação, de festejada capacidade intelectual, coloque seus neurônios a funcionar, e aqueles de toda a sua equipe, para encontrar caminhos mais consentâneos com as expectativas da nação. Essa de arrancar do bolso dos contribuintes, sejam ex-alunos ou não, uns trocados a mais, é discurso velho e conhecido. Não melhora em nada os serviços prestados pelo Estado. Foi assim com as estradas e com a saúde, para citar apenas dois.