Peça de turbina de avião cai e atinge casa em Guarulhos

Um Boeing da Varig teve de interromper um vôo de São Paulo para Minas Gerais ontem (13) à noite depois que a peça de uma turbina se desprendeu – ela caiu numa casa do Jardim Presidente Dutra, em Guarulhos, e furou o telhado. Ninguém se feriu, mas os passageiros viveram momentos de pânico a bordo, depois de ter ouvido um barulho semelhante a uma explosão e visto chamas saindo da turbina.

"Eu assistia à TV quando o avião ia levantando vôo. Aí foi aquele barulho: plaft! teim! pam!", disse o aposentado Justino Ferreira da Silva, de 76 anos. O fragmento de uma das palhetas da turbina, de 15 centímetros de diâmetro, perfurou o telhado. "Minha mulher estava jantando. A peça abriu um buraco no teto de brasilit e entrou na sala. Veio que nem bumerangue. Rodopiou: zum-zum! E parou na cozinha. Não sei como não pegou nela."

O incidente aconteceu por volta das 23 horas de segunda-feira, quando o Boeing 737 da Varig, com 77 passageiros, decolava do Aeroporto Internacional Franco Montoro, em Cumbica, vôo 2038, com destino ao Aeroporto da Pampulha, em Belo Horizonte. Quando o problema foi detectado, o comandante retornou a Cumbica. O vôo durou apenas 18 minutos, contando os 5 minutos em que o avião ficou taxiando na pista.

Segundo o Departamento de Aviação Civil (DAC), um engenheiro-investigador foi enviado ao local para examinar o Boeing e determinar o que aconteceu. Não há previsão para a divulgação do laudo oficial. "É bem provável que algum detrito da pista, um pedaço de madeira, borracha de pneu ou pedra possa ter sido sugado pelo motor da turbina. Um material assim, no interior da turbina, poderia romper uma das palhetas", disse Edevaldo Chechetto, gerente da Varig no Aeroporto de Congonhas, zona sul da capital.

Os 77 passageiros passaram a noite em hotéis. Eles embarcaram para Minas em três vôos hoje. Um deles saiu de Cumbica às 10h20, os demais de Congonhas, às 6h44 e 13h23. A maioria desceu no Aeroporto Internacional de Confins, Grande Belo Horizonte. "Todo mundo entrou em desespero", contou a empresária Anunciata Alvarenga, de 54 anos.

Cinco minutos após a decolagem, quando o avião estabilizou e logo depois do anúncio do início do serviço de bordo, os passageiros ouviram um forte estrondo vindo do lado esquerdo do Boeing. Em seguida, muitos deles viram uma bola de fogo saindo da turbina. "O avião teve uma baixa de energia e caiu talvez uns 10, 15 metros. O pessoal lá dentro ficou muito tenso", disse o advogado André Luiz Martins, de 26 anos. Ele contou que um senhor do Recife pegou o celular e, desesperado, ligou para um parente, piloto de avião. "Ele gritava: ?O avião vai cair, o avião vai cair.? Realmente todo mundo pensou nessa hipótese."

Martins, que retornava com os pais e a irmã de Natal (RN) e fez uma conexão em São Paulo, estava sentado na janela, na poltrona 17 A, bem próximo da turbina danificada. A noite nublada e o cheiro de queimado dentro do avião deixaram ainda mais apreensivos os passageiros. Segundo eles, a turbina fazia barulho e soltava faíscas.

Nos minutos após o estrondo, muitos não perceberam que o Boeing estava retornando para Cumbica e pensaram que o piloto seguiria a viagem até a capital mineira. "Começamos a rezar como loucos, ninguém sabia o que estava acontecendo e eu fiquei com muito medo porque apagou a luz. Achei que estava tudo apagado e os pilotos não estavam vendo nada", contou a estudante de Direito Simone Lascasas, de 21 anos.

O alívio só veio quando o comandante anunciou que pousaria novamente em Cumbica. "O avião retornou bem lentamente, um pouco instável", disse Martins. Seu pai, Dionaldo Martins, de 61 anos, disse que na hora em que o avião pousou, todos os passageiros aplaudiram. "O piloto foi muito habilidoso."

Prancha de surfe no meio da bagagem, Simone desembarcou em Confins depois de uma temporada de quase três meses na Austrália e Nova Zelândia. A viagem, com escala no Chile, já durava 24 horas. "Estava na frente, na segunda poltrona. Nunca tive medo de avião, vou voltar a voar com certeza, só que agora peguei um trauma danado. Achei que ia morrer."

Emocionada, a mãe de Simone, Márcia Duarte Lascasas, de 46 anos, deu um abraço forte na filha ao reencontrá-la no aeroporto. Há seis anos, Márcia viveu uma experiência parecida ao viajar num avião de pequeno porte. "Só fiquei tranqüila depois que soube que minha filha chegou. Até tomei um remédio para poder dormir."

Susto no céu, bom humor na terra. Na hora do acidente, só Justino e a mulher, Valdelice Pereira da Silva, estavam em casa. Na madrugada de hoje, Valdelice, sete anos mais nova que o marido, ouviu Justino contar várias vezes a estranha história da peça de turbina que se desprendeu lá no céu e deixou um buraco no telhado de sua casa. Sempre que o aposentado imitava o barulho da peça, Valdelice caía na risada.

Embora esteja vivendo há menos de uma semana na casa atingida pela palheta da turbina, o aposentado mora há mais de 30 anos no Jardim Presidente Dutra, a 2 quilômetros da pista do aeroporto. Justino viu Cumbica nascer e disse estar acostumado com a barulheira dos aviões. "Só pelo ronco dá para saber se o avião está decolando ou pousando", afirmou. "Este aí, que perdeu a turbina, eu sabia que estava decolando. Quando ouvi o barulho falei para minha mulher: ?Acho que este avião está se espatifando no céu.? Não é que eu tinha razão?"

Depois do acidente, Justino ainda tentou pegar a peça, que pesa cerca de 1 quilo. Mas quase queimou a mão. "Estava quente, pegando fogo." Horas mais tarde, foi à delegacia registrar a queda. Ficou com uma cópia do boletim de ocorrência para poder cobrar a Varig pelo prejuízo – a empresa informou que concordou com o pedido do aposentado e, além de consertar o telhado, vai pintar sua casa.

A peça do avião foi recolhida pela Empresa Brasileira de Infra-Estrutura Aeroportuária (Infraero). Em 2005, o Centro de Investigação e Prevenção de Acidentes Aeronáuticos (Cenipa) registrou 39 acidentes em vôos domésticos no País, o menor número em 12 anos.

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