A guerra atinge a todos os homens e mulheres. Mas a nós, operadores do Direito, ela atinge em nosso núcleo principal de vida, que é a busca incansável pela justiça e a igualdade. Vivemos, profissionalmente, no centro dos conflitos sociais e temos a missão ajudar as partes a resolvê-los, ou pelo consenso, ou pela imposição da lei. O momento da guerra nos leva a refletir sobre o sentido de nossa ação. Neste rumo cito Norberto Bobbio e Eros Roberto Grau, noticio um debate sobre o tema do império e da paz e concluo com uma breve lição do poeta.
“O reconhecimento e a proteção dos direitos do homem estão na base das constituições democráticas modernas. A paz é, por sua vez, o pressuposto necessário para o reconhecimento e para a efetiva proteção dos direitos fundamentais no interior de cada um dos estados e no sistema internacional. Ao mesmo tempo, o processo de democratização do sistema internacional, que é o caminho obrigatório para a busca por um ideal de “paz perpétua”, no sentido kantiano do termo, não pode avançar sem uma gradual ampliação do reconhecimento da proteção dos direitos do homem acima dos estados. Direitos do homem, democracia e paz são portanto, três momentos necessários do mesmo processo histórico: sem direitos do homem reconhecidos e garantidos não há democracia; sem democracia não há condições mínimas para a solução pacífica dos conflitos sociais”. Estas as palavras contidas em “O tempo da memória”, do jurista Norberto Bobbio (Editora Campus, 1997, pág. 164.), assinalando a necessidade do reconhecimento dos Direitos do Homem acima dos Estados.
Por sua vez, o jurista Eros Roberto Grau no seu “Discurso pela Paz” (in “Do ofício de orador”, Editora Revan, 2002 ) pronunciado em 17.10.2001 no Instituto dos Advogados Brasileiros sobre a guerra dos EUA contra o Afeganistão, não titubeia em dizer, e é, infelizmente, profético, que “o que me parece é estarmos diante de um caso de Direito Penal, não de Direito Internacional. Isto poderia/deveria ser dito, já que o nosso ofício é jurídico. Mas o que vem (isto é, o que deve ser dito) depois disso? As nações deveriam de estar sendo convocadas não para uma guerra, no sentido atribuído ao termo no plano do Direito Internacional, mas para o combate a um tipo de crime. Qual será a próxima? Será declarada guerra à Colômbia, por conta do narcotráfico? O que caberia às ONUs da vida. (…) O que caberia às ONUs da vida seria uma firme e incisiva decisão de integração ao combate ao crime de terrorismo internacional”.
Várias entidades promovem, de amanhã, 14, a quarta, 16, no Teatro da Reitoria da Universidade Federal do Paraná, das 19 às 22h, a Semana de Debates denominada “O Império e a Paz”. Unem-se o Jornal Brasil de Fato, Escola Milton Santos, CPT, Via Campesina, MST, Terra de Direitos, Cepat, Cefuria e UFPR para convocar estudantes, professores, profissionais liberais, sindicalistas e a população em geral para analisar os fatos, as lições e os efeitos da guerra. Os temas a serem debatidos são: “O império precisa da guerra”, dia 14, segunda, com o jurista Plínio da Arruda Sampaio e o senador Flávio Arns; no dia 25, terça, pretende-se responder à questão “o império e a paz, para onde caminha a globalização?”, com os professores Inácio Neutzling e Márcia Kersten; finalmente, na quarta, dia 16, o ponto será “o movimento social e a luta contra a Alca e o latifúndio”, com o economista e integrante do MST João Pedro Stedile e o bispo D. Ladislau Biernaski. O debate é aberto a todos. O enfrentamento das questões também é para todos.
Termino lembrando a lição do poeta Thiago de Mello: “Faz escuro mas eu canto”.
Edésio Passos
é advogado, ex-deputado federal e membro do Instituto dos Advogados Brasileiros. E.mail: edesiopassos@terra.com.br