A agricultura representa, hoje, 34% do PIB – Produto Interno Bruto brasileiro. Gera 37% dos empregos e responde por 42% das exportações. Na dianteira mundial de vendas de café, suco de laranja, açúcar, tabaco, complexo de soja, carne bovina e de franco, o setor agropecuário deve gerar este ano, se São Pedro ajudar e o governo não atrapalhar, 1,3 milhão de empregos, sendo 400 mil diretos, 340 mil na cadeia produtiva e outros 580 mil por conta do aumento de renda no setor. Os dados são do Ministério da Agricultura e, a serem verdadeiros, representam os únicos verdadeiramente positivos que o governo do insatisfeito PT pode ostentar até aqui, embora o trabalho pertença aos que aram, semeiam e colhem na terra generosa.

Esse positivo prognóstico não foi o suficiente, entretanto, para impedir um “chá de cadeira” que o ministro Roberto Rodrigues, da Agricultura, estava levando do ministro do Planejamento, Guido Mantega. Segundo consta, em vão o companheiro da Agricultura vinha tentando, há seis meses, um encontro com o companheiro do Planejamento para afinar a viola. Além disso, recursos que seriam vitais para o setor agrícola teriam sido vetados por Mantega que, duro na queda, insistia em manter os vetos sem dar a mínima explicação.

Foi o que bastou. Irritado com tudo isso que aí está, Rodrigues se disse disposto a abandonar o barco, e informou a parlamentares ruralistas do Nordeste que mandara “o vagabundo do Mantega à PQP”. “Minha cota com esse governo se esgotou”, disse o ministro.

Além da linguagem chula, um ministro chamar outro de vagabundo não significa muita coisa. Pelo menos para a turma do Planalto, já acostumada ao bate-boca dialético, pouco ético e, em especial, para os “bombeiros” que, logo a seguir, entraram em cena para apagar o incêndio iminente. De um lado, o Planalto recomendou que ninguém saísse em defesa de Mantega, de outro, trataram de fazer com que Rodrigues se acalmasse. De fato, o ministro da Agricultura “contextualizou” sua ira em nota oficial para dizer que fez apenas um “desabafo” e que nunca teve a intenção de ofender o colega. Quis apenas dar idéia de sua “extrema preocupação” com a causa a que serve, isto é, com a solução dos problemas da agricultura, entre eles a greve dos fiscais do ministério.

O adjetivo vagabundo, segundo o Aurélio, denota alguém que leva uma vida errante, que vagueia, um vagamundo. Na primeira fila do significado aparecem ainda os vocábulos vadio, erradio, errante, nômade, andejo, mundeiro. Tomado no sentido figurativo, significa inconstante, volúvel e leviano, alguém que tem ânimo vagabundo. No sentido mais brasileiro da palavra, significa velhaco, pilantra, canalha e biltre. Mas também pode denotar algo de má qualidade, reles ou ordinário. Um indivíduo vagabundo troca-pernas.

Ninguém conhece suficientemente o ministro Mantega para saber se ele é tudo quanto o termo encerra. Mas, tirando-se à parte o denotativo de viajante contumaz, coisa que o ministro não parece ser, qualquer outro dos significados enumerados pelo dicionário já seria forte o suficiente para demonstrar o clima de desrespeito que grassa na mais alta corte formada pelo primeiro time do PT e seus aliados. Que o presidente Lula faça um muxoxo e engula mais essa, é dar outro passo na consolidação de um conceito que já se firma ao redor de seu governo: falta de autoridade. Excetue-se o episódio dos radicais expulsos do partido e, mesmo assim, esse bate-boca em público aconteceu diversas vezes na questão dos juros, na questão da condução da política econômica, nas viagens de oração da ex-ministra Benedita da Silva, na ofensa do ministro Berzoini aos velhinhos aposentados e floresceu com vigor no episódio que ainda envolve o ministro-chefe da Casa Civil, José Dirceu, no Waldogate. Depois já pediram a cabeça do ministro Antônio Palocci, da Fazenda. Agora, dentre os que restavam incólumes, surgem vagabundos…

Isso já está passando dos limites. Ou o presidente Lula coloca ordem na própria casa, ou a desordem reinante acabará por roubar-lhe os créditos que ainda restam à conta de seu sempre cantado carisma pessoal.

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