O Parlamento de Portugal aprovou, por ampla maioria, a legalização do aborto até a 10ª semana de gravidez, colocando a pequena nação fervorosamente católica ao lado de seus vizinhos europeus. A votação foi realizada ontem, Dia Internacional da Mulher, menos de um mês depois de um referendo ter indicado que a maioria dos eleitores era a favor da legalização do aborto – apesar de a consulta não ter conseguido o quórum necessário para ratificação.
"Essa votação é um momento de virada na história de Portugal. Trata-se de uma lei que defende a dignidade das mulheres", considerou Ricardo Rodriguez, um legislador do governista Partido Socialista. Ele acrescentou que o governo espera que a descriminalização do aborto porá fim aos perigosos abortos clandestinos. Grupos defensores dos direitos das mulheres afirmam que dez mil mulheres são hospitalizadas todos os anos em Portugal com complicações decorrentes de abortos ilegais.
Portugal, uma ditadura até 1974, veio se abrindo e liberalizando nos últimos 20 anos com sua entrada na União Européia (UE), aproximando suas leis das democracias mais antigas do continente. O primeiro-ministro José Sócrates, cujo partido assumiu o poder numa acachapante vitória sobre os conservadores quase dois anos atrás prometendo amplas reformas e a modernização da nação, fez da aprovação da nova lei do aborto uma prioridade. Ele prometeu, depois do fracassado referendo, aprovar com rapidez a legislação no Parlamento, definindo a antiga lei de aborto como "retrógrada".
A antiga lei era uma das mais restritivas da Europa, permitindo a prática nas primeiras 12 semanas de gravidez apenas se a saúde da mãe estivesse em risco. Em caso de estupro, o aborto era autorizado nas primeiras 16 semanas. Não havia restrição de tempo apenas quando o aborto era a única forma de salvar a vida da grávida. A nova lei não faz restrições às mulheres que querem pôr fim à gravidez até a 10ª semana, apesar de exigir um período obrigatório de reflexão de três dias antes da prática.
Pelos padrões europeus, a nova lei ainda é restritiva. As mulheres podem optar pelo aborto até a 24ª semana de gravidez na Grã-Bretanha e até a 12ª na Alemanha, França e Itália. Mas Portugal agora se distancia de três países da União Européia com as mais restritivas leis de aborto: Polônia, Irlanda e Malta. O projeto de lei tem de ser sancionado pelo presidente e ser publicado no Diário Oficial para entrar em vigor. O trâmite deve levar ainda alguns meses.
